Governança Metropolitana

Governança Metropolitana

Em julho de 2016 foi criada a região metropolitana para fazer frente às demandas de 33 municípios próximos a Ribeirão Preto. Esse novo sistema de governo está sendo estruturado para demandas regionais

No Estado de São Paulo, quem coordena a criação e a estruturação das Regiões Metropolitanas (RMs) é o advogado Luis José Pedretti, formado pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em Direito Urbanístico e Planejamento Urbano (Universidade de Illinois), com especialização em Gerenciamento do Setor Público e Economia Política (The London School of Economics and Political Science). Desde janeiro de 2011, Luiz Pedretti era vice-presidente da Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano (Emplasa) e, em janeiro de 2017, assumiu o cargo de diretor-presidente. O advogado é autor do projeto de lei que originou o Estatuto da Metrópole. Também foi chefe de gabinete do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ocupa o cargo de vice-presidente do Fórum Nacional de Entidades Metropolitanas (FNEM). Na entrevista a seguir, José Pedretti explica como está o processo de implantação da Região Metropolitana de Ribeirão Preto (RMRP) e quais os benefícios que os 34 municípios que participam do projeto poderão ter nos próximos anos. 

A criação da Região Metropolitana de Ribeirão Preto (RMRP) era uma reivindicação bem antiga e consensual da comunidade regional. Por que demorou tanto para sair, uma vez que em outras regiões do Estado, como Campinas (2000) e Santos (1996), o projeto já foi implantado há muito tempo? 
Luiz Pedretti:
Diria que aconteceu no tempo certo. Desde 2011, a Emplasa vem trabalhando na institucionalização e na implantação de unidades regionais no Estado de São Paulo, em atendimento às diretrizes fixadas pelo governo Geraldo Alckmin. De lá para cá, no âmbito desse processo de planejamento, promovemos a reorganização da Região Metropolitana de São Paulo, a criação das RMs do Vale do Paraíba e Litoral Norte, de Sorocaba e de Ribeirão Preto. Somadas às regiões metropolitanas da Baixada Santista e de Campinas, que já existiam, temos, agora, seis RMs, além das Aglomerações Urbanas de Jundiaí e de Piracicaba. É um processo de planejamento que está em curso. O próximo passo, adianto, será a criação da Aglomeração Urbana de Franca, composta por 19 municípios, fazendo divisa com a RM de Ribeirão Preto. No Estado de São Paulo, o processo de criação de qualquer unidade regional — seja região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião — deve atender aos princípios estabelecidos na Constituição Estadual e nas diretrizes fixadas pela Lei Complementar nº 760/94. A Lei Complementar que cria uma região metropolitana deve amparar-se em estudos técnicos, feitos pela Emplasa, que indiquem, num determinado aglomerado de municípios, a necessidade de se promover, entre o Estado e os municípios, o planejamento e a gestão de políticas públicas integradas e compartilhadas, objetivando a solução para problemas considerados comuns. Este raciocínio aplica-se, também, à tomada de decisão sobre a criação de outras unidades regionais.

Quais os critérios que foram levados em conta para a criação da Região Metropolitana de Ribeirão Preto, a primeira região fora da macrometrópole Paulista?
A institucionalização de determinada região metropolitana parte de uma realidade fática, que apresenta elevado grau de articulação e de integração socioeconômica entre os municípios, tornando mais complexas as relações entre eles, com significativa ampliação dos fluxos de pessoas. Nas RMs da Baixada Santista e de Campinas, essas características surgiram há mais tempo, comparativamente à RMRP. Os critérios técnicos constam da legislação específica. Com base nesses critérios, foram feitos os estudos, considerando as estruturas de rede urbana e seus polos, demografia, economia e meio ambiente. No caso da RM de Ribeirão Preto, por exemplo, foram feitas análises da dinâmica demográfica, do perfil econômico, das funcionalidades urbanas e regionais, do movimento pendular (fluxos de mobilidade de pessoas entre municípios) e da integração funcional entre centros urbanos com função de polo (Ribeirão Preto). Podemos definir essa região com multipolarizada, que apresenta integração funcional entre seus municípios, de acordo com os deslocamentos por motivo de trabalho, negócios, estudo, saúde e lazer.
Trata-se de uma região de economia forte e diversificada, com empresas agrícolas, industriais, de alta tecnologia, comércio e serviços, além de ser destaque nos sistemas logísticos em transportes, em comunicação e em segurança. Também abriga grandes empresas de alta capacidade para atender o mercado interno e externo de alimentos e sedia esse importante evento no setor do agronegócio que é a Agrishow, realizada em Ribeirão Preto. Tornou-se um polo da indústria sucroalcooleira pela posição estratégica em relação aos maiores centros consumidores do etanol. Tendo em vista a complexidade dessa integração funcional entre seus 34 municípios, surgem problemas comuns que requerem solução coletiva, a exemplo da mobilidade, da saúde, da destinação de resíduos sólidos, entre outros. Daí a necessidade da implantação, nesse território, de um sistema de governo ou de gestão que chamamos de governança metropolitana, necessário para fazer frente às demandas de caráter regional. Esse sistema de gestão regional será conduzido, exclusivamente, pelo Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Ribeirão Preto, integrado pelos 34 prefeitos da região e pelos representantes do Estado nas funções públicas de interesse comum. É por meio da governança metropolitana que serão desenvolvidas ações integradas e compartilhadas, entre Estado e municípios, objetivando à promoção do planejamento regional, assim como uma melhor organização na gestão de questões ligadas às funções públicas, consideradas de interesse comum dos municípios integrantes da região. Dessa forma, são focados o desenvolvimento e o bem-estar da população, por meio de políticas públicas integradas de transporte urbano e regional, habitação, saneamento, meio ambiente, além do desenvolvimento econômico-social.

Região apresenta economia forte e diversificada com destaque para os sistemas logísticos de transporteEm que estágio se encontra a implantação dessa região metropolitana?
Estamos no processo de instalação do sistema de governança da Região Metropolitana de Ribeirão Preto, que inclui a criação do Conselho de Desenvolvimento, da Agência e do Fundo Metropolitano. Tudo isso demanda tempo e envolve ações da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Demos início ao funcionamento do Conselho e, enquanto a Agência não é instalada, a Emplasa desempenhará, temporariamente, esse papel. Nessa etapa, a Empresa de Planejamento e a Subsecretaria de Assuntos Metropolitanos já promoveram a realização de três reuniões ordinárias do Conselho de Desenvolvimento, com a escolha de seu presidente e vice. A Emplasa também elaborou e submeteu à apreciação do governo as minutas do projeto de lei complementar que cria a Agência Metropolitana e do decreto que regulamenta o Fundo Metropolitano. Na segunda reunião, foi assinada a resolução conjunta entre a Secretaria da Segurança Pública e a Subsecretaria de Assuntos Metropolitanos, já publicada no Diário Oficial, instalando o Gabinete Metropolitano Estratégico de Segurança Pública (Gamesp). O próximo passo, dependendo ainda de decisão do Conselho de Desenvolvimento, será a instalação dos conselhos consultivos das quatro sub-regiões (Ribeirão Preto, Jaboticabal, Batatais e Mococa), com a eleição dos respectivos presidentes e vices. Importante destacar que, na última reunião do Conselho de Desenvolvimento, com a participação do secretário estadual de Energia e Mineração, João Carlos de Souza Meirelles, foi criada a Câmara Temática Especial de Iluminação Pública. Esta Câmara realizará estudos e pesquisas objetivando a criação de um sistema de governança entre os municípios da RMRP, notadamente os menores, para, de forma integrada e compartilhada, capacitá-los a realizar a gestão da operação, manutenção, expansão e inovação de seus sistemas de iluminação pública — diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão.

Quais as principais barreiras que ainda precisam ser superadas?
Instalada a RM, esta passa a contar com um sistema constitucional de governança metropolitana entre o Estado e seus municípios, mediante a integração de políticas públicas e o compartilhamento de ações e tomadas de decisão. Trata-se de um sistema novo no Direito brasileiro, em que Estado e municípios, no âmbito do colegiado, têm conhecimento de um problema e tomam decisão coletiva para tentar solucionar.  Nesse contexto, o que ainda falta, e é absolutamente normal, é a consolidação de uma consciência metropolitana, ou identidade metropolitana, o que, a meu ver, só ocorrerá na prática, à medida que os projetos coletivos comecem a ser implantados. Isso demanda tempo.

O benefício mais conhecido é a extinção do DDD entre cidades que fazem parte do projeto das RMs, substituindo as tarifas interurbanas por tarifas locais. Quais são os demais benefícios que a população de aproximadamente 1,6 milhão de pessoas da região terá quando o projeto estiver consolidado?
Além do planejamento integrado em questões de saúde, educação, segurança, transporte metropolitano, entre outros, e do fim da cobrança das ligações interurbanas, os municípios que integram regiões metropolitanas são beneficiados, por exemplo, com valores diferenciados para o financiamento de habitação de interesse social (HIS). Também recebem mais recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). Aproveito para destacar que partiu da Emplasa, na condição de secretaria-executiva das RMs do Vale do Paraíba e Litoral Norte e de Sorocaba, a iniciativa de solicitar à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) a unificação dos DDDs das duas regiões. Esse é um exemplo do exercício de governança metropolitana, com ações conjuntas entre o Estado e os municípios. 

Os municípios do entorno de Ribeirão Preto possuem economia diversificada e localização estratégica com rodovias e ferrovias que dão acesso a importantes regiões econômicas do país. Quais as principais áreas que podem ser melhoradas a partir da região metropolitana?
Compete ao Conselho de Desenvolvimento, integrado por representantes do Estado nas funções públicas de interesse comum (FPICs) e pelos 34 prefeitos da RM, além de contar com o apoio técnico da Emplasa, priorizar os projetos regionais que podem melhorar as condições de vida da população. Caberá a este Conselho promover ações junto aos governos estadual e federal para melhorar a infraestrutura da região, o que, consequentemente, vai gerar mais desenvolvimento, ampliar as exportações, trazer riquezas e reduzir as desigualdades regionais.

A região metropolitana contará com um sistema de informação e de dados capaz de otimizar os projetos para as cidades da região?
A Emplasa, no papel de Agência, desenvolveu o Sistema de Informações Metropolitanas (SIM|Emplasa) para apoiar o planejamento territorial, de forma integrada, dando mais agilidade e eficiência à implementação de políticas públicas regionais. É um instrumento de uso fácil, que já está sendo utilizado por vários organismos do Governo do Estado e por municípios da RM de São Paulo e da Baixada Santista, possibilitando a gestão de informações geoespaciais de fontes oficiais municipais, estaduais e federais. Com o uso do SIM|Emplasa é possível realizar o planejamento municipal com base na realidade regional metropolitana, com informações locais e de municípios vizinhos.

Quais os critérios que são usados para os que os benefícios sejam distribuídos de forma equânime para que nenhuma cidade se sinta preterida?
A organização regional tem por objetivo, entre outras metas, promover a integração do planejamento e da execução de funções públicas de interesse comum, bem como a redução das desigualdades sociais e regionais. Conhecendo a realidade regional e as demandas comuns, caberá ao Conselho priorizar as ações e os projetos capazes de solucionar os problemas de forma compartilhada.

A partir do planejamento, a região metropolitana pode propor e encaminhar soluções conjuntas para problemas que sejam comuns a várias cidades, como depósito de lixo urbano, rede hospitalar, segurança, moradia e outros?
Podemos citar dois exemplos de ações já iniciadas: iluminação pública e Gabinete Metropolitano Estratégico de Segurança Pública (Gamesp). Além do mais, a Emplasa elaborou uma minuta de decreto, que a exemplo do ocorrido em outras regiões metropolitanas, transfere os serviços de transportes intermunicipais de passageiros da Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo (Artesp) para a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU).

A partir da consolidação do projeto será possível criar uma empresa metropolitana de transporte regional de passageiros?
A Emplasa, juntamente com a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos (EMTU), está adotando medidas jurídicas e administrativas objetivando a integração do sistema de transporte de passageiros na região. Não é preciso criar, pois essa empresa é a EMTU. A Emplasa elaborou minuta de decreto transferindo os serviços de transportes intermunicipais de passageiros da Artesp para a EMTU. Essa minuta já foi encaminhada para aprovação do governador. Ao assumir os serviços de transporte intermunicipal, a EMTU deverá instalar um escritório e toda a infraestrutura necessária em Ribeirão Preto. Até já existe uma área prevista para isso. O primeiro trabalho a ser realizado pela EMTU na região é uma pesquisa de Origem-Destino (OD), para mapear como as pessoas se locomovem. Esses dados nortearão o planejamento, juntamente com os municípios, de novas linhas intermunicipais. Projeto semelhante já está sendo desenvolvido na Região Metropolitana de Sorocaba (RMS) com os serviços técnicos da Emplasa.

Como funcionará o Fundo de Desenvolvimento? Quais os recursos previstos e de onde serão provenientes?
Para fazer frente às despesas com a execução de projetos, a RMRP contará com recursos do Fundo de Desenvolvimento. A atribuição do Fundo é promover o financiamento e o investimento em projetos, estudos e ações de interesse regional devidamente aprovados pelo Conselho. Os recursos são provenientes do Governo do Estado de São Paulo, dos municípios e de empréstimos a organismos nacionais e internacionais. Em relação à participação dos municípios, caberá ao Conselho de Desenvolvimento deliberar sobre o montante de recursos financeiros que deverá ser aportado por cada uma das 34 municipalidades.

Qual avaliação atual que o senhor faz do trabalho desenvolvido até aqui pela Emplasa?
A Emplasa vem cumprindo com suas obrigações de empresa de planejamento do Estado de São Paulo. Elaborou os estudos técnicos e jurídicos que permitiram a criação e implantação das unidades regionais do Estado, apoiando o funcionamento dos conselhos de desenvolvimento e tomando a iniciativa de viabilizar projetos e ações, como a unificação dos DDDs, a questão da iluminação pública e também dos transportes intermunicipais.

A proposta do governo é instalar esse projeto em todas as regiões do Estado? Em quanto tempo isso deve ocorrer?
A criação e a instalação de unidades regionais — regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões — só serão efetivadas mediante estudos criteriosos de planejamento, desde que o conjunto dos municípios tenha necessidade de um sistema de governança metropolitana, como prevê a legislação.

Em quanto tempo, a região metropolitana terá que apresentar Lideranças regionais participam do processo de instalação do sistema de governança da Região Metropolitana de Ribeirão Preto, que inclui a criação do Conselho de Desenvolvimento, da Agência e do Fundo Metropolitanoo Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado?
A elaboração do Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) é obrigatória para todas as regiões metropolitanas e aglomerações urbanas e deverá ocorrer em três anos, a partir da data de constituição da RM. Como a RMRP foi criada em 6 de julho de 2016, ela terá que concluir o PDUI até 2019. Feito isso, o Plano será transformado em projeto de lei, incorporando diretrizes relativas às funções públicas de interesse comum. Após a aprovação da lei estadual, os municípios terão o prazo de três anos para ajustar seus planos diretores ao PDUI. Quero salientar o empenho e a dedicação de nossa equipe técnica, de nossos funcionários, no desempenho das atividades de planejamento regional. O Estado de São Paulo tem oito unidades regionais já instaladas, seis das quais são regiões metropolitanas e duas aglomerações urbanas, em véspera de ter a terceira. Isso aproxima o Estado cada vez mais dos municípios e de seus cidadãos, num exercício permanente de integração de políticas públicas que beneficiam a população, reduz as desigualdades sociais e promovem o desenvolvimento metropolitano e regional. São Paulo, hoje, funciona como uma vitrine para outras regiões metropolitanas brasileiras, exportando trabalhos e expertise em planejamento territorial e regional. 



Fotos: Wilker Maia/ACIF

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