Momento de recomeço

Momento de recomeço

Psicóloga comportamental e colunista do Portal Revide, Myrna Coelho Matos aborda os efeitos da pandemia na saúde mental e sugere alternativas para atravessar esse momento de forma mais leve

Texto: Lídia Mattos

Desde o surgimento do novo coronavírus, pessoas de todas as idades têm receio da contaminação. Com esses e outros impactos que foram causados pela pandemia da Covid-19, a busca por alternativas para manter o bem-estar psicológico foi ainda mais necessária durante o turbulento período de isolamento social.

Nesse cenário, as alterações psicológicas afloraram em algumas pessoas e aumentaram nas que possuíam algum sintoma — seja de ansiedade, depressão, estresse, inquietação, apreensão sobre o futuro, entre outros fatores desafiantes que já enfrentavam no cotidiano, e que se amplificaram durante este período. Por nos organizarmos em sociedade, por meio da interação social, o mal-estar psicológico pode fragilizar a capacidade de adaptação e reação ao estresse, produzindo respostas fisiológicas e emocionais que podem afetar o sistema imunológico e a condição de equilíbrio mental.

Segundo os dados informados pela Secretaria Municipal da Saúde de Ribeirão Preto, durante a pandemia houve um aumento de cerca de 30% na procura por atendimento psicológico nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), que realizam apoio emocional para pessoas que necessitam de acompanhamento e tratamento psicológico.

Essa reação do comportamento mental pode ser alterada de uma pessoa para a outra. Uma das situações consideradas como muito estressantes é o imprevisto, com a incerteza de quando, como e se a disseminação da doença vai ser controlada ou reduzida e a gravidade do risco de quem a contrai.

Controlar esses transtornos ou esses sintomas de desestabilidade emocional não é tarefa fácil. Na entrevista a seguir, a psicóloga comportamental e colunista do Portal Revide, Myrna Coelho Matos, aborda os efeitos da pandemia e separa algumas dicas para passar por este momento de forma mais leve.

Quais os efeitos que esse período de isolamento social pode causar na saúde mental? Ainda não temos muitos estudos publicados sobre esse tema, mas alguns deles e o dia a dia clínico apontam para manifestação de estresse, ansiedade, depressão, Transtorno do Estresse Pós Traumático (TEPT) e Transtorno de Estresse Agudo (TEA). Muitas pessoas têm manifestado características desses transtornos, em razão das pressões vivenciadas nesse período de pandemia, mas, não necessariamente, fecham diagnóstico de um transtorno psicológico. O que ocorre é que muitas pessoas se desestabilizam emocionalmente, mas de maneira muito particular.

Na sua visão, quais foram os transtornos psicológicos que mais se agravaram durante a pandemia? Para se caracterizar um transtorno psicológico, é preciso levar em conta: intensidade, frequência e somatória dos sintomas. Observamos um aumento de pessoas com estresse, ansiedade e depressão. Quando pensamos em estresse, temos que lembrar da definição, que é ser uma reação psicofisiológica de situações que geram esforço de adaptação. Então, todas as situações que levam a pessoa a se adaptar em uma contingência nova é geradora de estresse. A ansiedade é gerada pela incontingência de imprevisibilidade, em que as pessoas não podem prever tudo o que está para acontecer, com muitas surpresas, muitas perguntas sem respostas. Vivemos períodos de intensas dúvidas que aumentam o grau de ansiedade e inevitabilidade —quando não há nada que a pessoa possa fazer para evitar a condição à qual está exposta. Da mesma forma, é a ‘incontrolabilidade’, com sensação e condição de impotência diante de muitas situações, que precisa ser enfrentada.

É possível generalizar o mesmo impacto psicológico? Não temos como generalizar, pois algumas pessoas têm sido menos impactadas do que outras. Isso depende tanto das contingências externas vivenciadas por cada pessoa por causa das características pessoais quanto de repertório comportamental de enfrentamento em tempos difíceis. Uns passaram por perdas terríveis de um ou mais membros da família, de amigos queridos, outras foram hospitalizadas e sofreram tratamentos invasivos enquanto seus entes queridos aguardavam notícias. Outras pessoas tiveram suas vidas ameaçadas aguardando um leito de UTI, muitos viram suas empresas falirem, seus pequenos negócios ruírem. Não podemos generalizar os impactos dessas experiências, que são sociais, mas, também, pessoais e particulares. Quando uma pessoa enfrenta situações ameaçadoras, ela sofre alterações psicofisiológicas. Ninguém passou ileso à crise mundial do novo coronavírus, embora estejamos vivendo um momento social que atinge a todas as pessoas, a forma como reagem depende de fatores muito particulares e da história pessoal.

Quais seriam os impactos causados por essa ameaça ao emocional? Precisar se adaptar de várias formas, seja com a mudança de rotina, na forma de se relacionar com o outro, dificuldades para executar o trabalho, desenvolver novas formas para essa execução, além das relações familiares. Tudo isso foi muito modificado, e grande parte das pessoas sofreu um forte impacto nas diferentes áreas da vida. Ninguém passou ileso na pandemia, mas algumas pessoas foram mais impactadas do que outras. Então, não podemos dizer que todas as pessoas vão desenvolver dificuldades emocionais, pois isso depende do quanto essas pessoas foram expostas, e da capacidade de adaptação.

O que “perdemos” em relação ao relacionamento social durante o período de isolamento? Precisamos lembrar que o ser humano é um ser social e precisa do outro para a sobrevivência. São nas interações sociais que desenvolvemos de forma genuína e nos relacionamentos saudáveis que grande parte das nossas necessidades físicas, afetivas, sociais e espirituais são satisfeitas. O isolamento coloca a pessoa privada dessas interações que são, muitas vezes, fontes de estímulo, fortalecimento, encorajamento, afeto, motivação, alegria e satisfação. Essa privação de contato social tem um impacto negativo na saúde mental, já que muitas pessoas podem, em função do isolamento, adoecer emocionante, relatando sentimentos de solidão, tristeza, insegurança, medo, vazio e desesperança.

Quais seriam as sugestões para passar por esse período de uma forma mais leve? Alguns recursos podem ser usados para o enfrentamento mais saudável dos problemas que não podem ser controlados. Eles possuem diferentes funções e podem gerar algumas consequências, tais como: maior resistência física, maior alívio, mais satisfação com a vida, sensação de sentido e propósito na dor, alegria, entre outros.
 
Confira dicas da psicóloga neste momento:
Desabafar e conversar com uma pessoa de confiança; buscar ajuda.
- Compartilhar seus sentimentos com pessoas de confiança; aconselhar-se.
-  Aceitar ajuda.
 - Desenvolver habilidades de solução de problemas.
 - Ajudar, de forma voluntária, os mais vulneráveis.
 - Ter práticas espirituais saudáveis; desenvolvimento da fé.
 - Ter um hobby: tocar um instrumento, cantar, dançar, colecionar etc.
 - Envolver-se em novo aprendizado: esporte, culinária, costura etc.
 - Praticar atividade física e se alimentar de forma saldável.
 - Desfrutar tempo em família, promovendo momentos especiais.
 - Expor-se de forma moderada a noticiários, preferindo programações mais leves.
 - Usar moderadamente a tecnologia.

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