Saúde para todos

Saúde para todos

Professora da Escola de Enfermagem da USP, Carla Ventura integra o programa de formação de líderes em equidade em saúde, iniciativa que incentiva o fortalecimento da igualdade no mundo todo

Com formação em Relações Internacionais e em Direito, além de especialização em Direito Internacional, com foco em Direitos Humanos e Direito à Saúde, Saúde Global, Direito e Desenvolvimento, Carla Aparecida Arena Ventura está entre os 15 pesquisadores — selecionados entre 200 inscritos de várias partes do mundo — que integram o Programa Líderes em Equidade em Saúde. Iniciativa da Universidade George Washington, nos Estados Unidos, o programa incentiva a formação de líderes globais para fortalecer a igualdade na saúde nos EUA e no mundo.

Docente da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP), da Universidade de São Paulo (USP), Carla tem a responsabilidade de construir e colocar em prática conhecimentos e habilidades que possibilitem reflexões e ações sobre possíveis mudanças nos sistemas de saúde. Em um ano, os participantes terão que acompanhar um conteúdo on-line e, ainda, participar de encontros quinzenais, com a apresentação de professores e de alunos, para discutir assuntos referentes às desigualdades em saúde existentes em diferentes países. Estão programados, também, três encontros presenciais, nos Estados Unidos e em Ruanda. De acordo com a professora, equidade em saúde trata do direito à igualdade no acesso à saúde para todos, de forma mais humana — não apenas aos serviços de saúde, mas a tudo o que esse substantivo pode significar, no sentido mais abrangente do termo.

 O Programa objetiva capacitar profissionais para compreender, atuar e influir de maneira positiva sobre os fatos e as diretrizes que determinam as condições de saúde das pessoas nas diferentes localidades. Além disso, busca promover a cooperação entre os participantes e o desenvolvimento de ações intersetoriais, embasadas no princípio da equidade. Segundo Carla, a proposta é que os integrantes dessa equipe atuem como multiplicadores do conhecimento para outros líderes em equidade nessa área. 

Paralelo à área acadêmica, de 2008 a 2014, Carla atuou como coordenadora executiva da Rede Global de Centros Colaboradores da Organização Mundial de Saúde (OMS) para o Desenvolvimento da Enfermagem e Obstetrícia e, em abril de 2013, assumiu a vice-direção do Centro Colaborador da OMS para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem, sediado na EERP-USP. Desde o dia 1º de junho, acumula, também, a direção geral dessa unidade.
 
Em 2014 e 2015, Carla respondeu pela coordenação acadêmica do Programa Internacional de Capacitação em Pesquisa para Profissionais de áreas relacionadas à saúde, oferecido pela Organização dos Estados Americanos, em parceria com o Center for Addictions and Mental Health (CAMH), da Universidade de Toronto, no Canadá. Também liderou a criação e é coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem, Saúde Global, Direito e Desenvolvimento (GEPESADES) e do Centro de Educação em Direitos Humanos e Saúde (CEDiHuS) da EERP. Em 2014, foi contemplada com bolsa de cátedra em Direitos Humanos pela Comissão Fulbright, do Center for Civil and Human Rights, da University of Notre Dame, nos Estados Unidos. 
 
Carla afirma que é preciso consolidar os direitos em equidade em saúde no BrasilRevide: Por que se inscreveu no Programa Líderes em Equidade em Saúde?
Carla: Como trabalho com direitos humanos, em especial, com  o direito à saúde e sua relação com o desenvolvimento, atingir a equidade em saúde aparece como um desafio real, que deve ser enfrentado para que possamos consolidar os direitos humanos no nosso país. O Programa também prevê a utilização de metodologias inovadoras de intervenção junto a comunidades que irão subsidiar o desenvolvimento de projetos locais por nosso grupo de pesquisa.
 
Que tipo de metodologias são essas?
Além da parte teórica, os participantes contam com apoio de um grupo de coaching, que desenvolve trabalhos utilizando o referencial do professor Marshall Ganz, denominado “organizing”, metodologia de liderança que valoriza a mobilização, utilizando narrativas individuais e grupais. Como primeira ação para o desenvolvimento de nossos projetos, nos dias 26 e 27 de maio, oferecemos, na EERP, workshop “Liderança em Mobilização de Pessoas”. O objetivo foi desenvolver habilidades de liderança e mobilização social em alunos de graduação em Enfermagem. 
 
A seleção para o Programa de Liderança em Equidade em Saúde foi concorrida?
Inicialmente, os organizadores receberam 206 inscrições. Entre elas, foram selecionados 50 candidatos para entrevistas de 30 minutos pelo Skype. Estavam previstas dez vagas para candidatos americanos e cinco para profissionais de outros países. Após a seleção, um dos participantes da Etiópia, em virtude de problemas pessoais, abriu mão da vaga. Dessa forma, foram selecionados 11 candidatos dos Estados Unidos (EUA) e quatro de outros países (Uganda, Índia, Filipinas e Brasil). Somos a primeira turma deste programa. 
 
Nesse grupo, quais são os seus principais objetivos?
Compartilhar experiências e vivências relacionadas à busca por alternativas para a equidade em saúde, além de ter acesso a resultados de pesquisas desenvolvidas na área em outras localidades. Além disso, pretendo fortalecer o intercâmbio com pesquisadores norte-americanos e dos países em desenvolvimento envolvidos no Programa. Quero, também, conhecer novas metodologias de intervenção voltadas para o trabalho em comunidades. Tenho interesse, claro, em todo referencial de liderança para mobilização social.
 
Quais são metas do Programa?
O Programa Líderes em Equidade em Saúde é oferecido pelo Health Workforce Institute, do Milken Institute School of Public Health, da George Washington University, com apoio da Atlantic Philanthopies. A proposta é formar líderes globais que compreendam os fatores que levam às iniquidades em saúde nos Estados Unidos e globalmente e que construam conhecimentos e habilidades para participar de mudanças em sistemas e organizações de saúde. 
 
Como esse programa é desenvolvido?
Ele ocorrerá até o final de 2017 e combina encontros presenciais e conteúdo on-line. Divide-se em duas partes: Equidade em Saúde e Liderança para a Mudança. Contará com três momentos presenciais, dois nos EUA, na George Washington University, e um na University of Global Health Equity, em Kigali, Ruanda. Durante o ano, os participantes acompanharão o conteúdo on-line e terão encontros quinzenais, com a apresentação de professores e de alunos sobre temas específicos do programa. Após o curso, os selecionados participarão da formação de outros líderes e comporão uma rede de pesquisadores e lideranças na área para atuar nos âmbitos local, regional e internacional. 
 
De que forma se pode definir o que é equidade em saúde?
Esse conceito vem se tornando mais conhecido no Brasil após a Constituição Federal de 1988 e a consolidação do direito à saúde para todos os brasileiros. Insere-se em um processo de transformação social, que reconhece a existência de diferenças e busca alternativas para lidar com as desigualdades sociais — especialmente de condições de saúde, de acesso e de utilização dos serviços de saúde — a partir de uma perspectiva embasada na justiça social.
 
Participantes do workshop realizado em maio na Escola de EnfermagemQual é o tema de sua pesquisa?
Como resultado de minha participação no Programa, desenvolverei o projeto “Liderança e Mobilização Social: fortalecendo a participação social, a cidadania e a equidade em saúde”, com alunos de graduação da EERP-USP e também com professores e alunos de uma escola de Ensino Fundamental de Ribeirão Preto. A proposta é formar, entre os alunos da Faculdade, líderes em equidade em saúde, que realizarão intervenções na comunidade e, consequentemente, formarão outros líderes.

Qual é o perfil dos participantes desse programa?
Os selecionados atuam na área da saúde ou em áreas relacionadas, tanto no setor público, quanto no setor privado. O grupo de participantes do programa é bastante heterogêneo, envolvendo prestadores de serviços, pesquisadores de Universidades e profissionais de áreas relacionadas à saúde, como eu, que trabalho com a educação em direito à saúde. O perfil de todos os selecionados pode ser visualizado no endereço.

Quais são as suas responsabilidades e atribuições como líder em equidade da saúde?
Uma das minhas responsabilidades é realizar a pesquisa e o projeto prático de mobilização social, com foco em intervenções para lidar com iniquidades e continuar interagindo com os membros deste programa.
 
Qual a importância desse trabalho para os novos profissionais em enfermagem?
A formação em liderança é essencial para a capacitação de enfermeiros atuantes e conscientes de seu papel político e social. Nesse sentido, o nosso projeto piloto será fundamental para despertar o interesse dos alunos do curso de enfermagem para a importância de atuarem em projetos junto à comunidade, buscando lidar com os diferentes fatores que geram iniquidades na área da saúde. 
 
Isso faz parte de um processo de formação e atendimento mais humanizado?
Sim, espera-se que os profissionais de saúde combinem o caráter técnico de sua formação com outras habilidades de comunicação e de liderança. Neste projeto, nosso foco é a formação de líderes aptos para fomentar iniciativas que envolvam a conscientização de que somos sujeitos de direitos. Estas iniciativas podem gerar e produzir a mobilização social como meio de exercício da cidadania. 
 
Equipe selecionada para o Programa Líderes em Equidade em SaúdeQual é o foco do trabalho neste momento?
Focaremos, nesta primeira etapa, na importância da participação e controle social como instrumento relevante para a efetivação do direito à saúde das pessoas. 
 
Este trabalho tem a ver com bem-estar e com a Agenda 2030 para os desenvolvimentos sustentáveis das Nações Unidas e na área de saúde?
Sim, um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) se refere diretamente à saúde e outro, à redução das desigualdades. Contudo, a saúde e a equidade em saúde estão indiretamente relacionadas a outros ODS e à agenda de desenvolvimento estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) e seus países membros, em continuidade aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. 

Texto: Rose Rubini
Fotos: Júlio Sian

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