Vivendo a solitude
Para o psicólogo, ficar sozinho é um desafio que traz benefícios ao indivíduo

Vivendo a solitude

Em entrevista à Revide, o psicólogo Felipe Areco comenta diferentes aspectos da solitude, assunto que está cada vez mais presente na sociedade

Texto: Gabriela Maulim  Fotos: Luan Porto

Viver sozinho é um medo para muitas pessoas. Entretanto, outras escolheram seguir o caminho da solitude, onde o autoconhecimento e a própria companhia bastam. Nessa entrevista, o psicólogo e docente do Centro Universitário Barão de Mauá Felipe Areco tira algumas dúvidas relacionadas ao tema que, com a pandemia de Covid-19, tornou-se ainda mais presente na sociedade. Confira abaixo: 

Mesmo que a solitude seja uma questão de escolha e de bem-estar do indivíduo, ela é benéfica para a saúde mental?

Primeiro, é importante destacar que estar sozinho é algo que provoca medo em boa parte da sociedade. Muitas pessoas, às vezes, não conseguem se imaginar sem alguém ao lado, seja com a companhia de um namorado, amigo ou um indivíduo que possa fazer parte da vida dela ou tenha algum tipo de vínculo que ofereça proximidade e intimidade. Não há nenhum problema em ficar sozinho, até porque, esse é um desafio que traz diversos benefícios ao indivíduo. A solitude é saudável, pois traz uma questão de individualidade, um comprometimento com a pessoa no sentido da própria companhia dela. Então, é bom para a saúde mental experimentar e estar disponível para a solitude. 

Essa é, de fato, uma escolha ou é uma consequência de fatores externos?

As duas questões, tanto uma escolha quanto a consequência de fatores externos. Quando a gente fala de escolha, estamos relacionando a alternativa que podemos ter. Então, o indivíduo pode sim escolher ficar com a sua solitude e com a sua própria companhia. Já quando a gente pensa na consequência de fatores externos, é possível também, pois fatores relacionados à convivência, às relações e à forma que esse indivíduo se configura em estar no mundo pode ter influência nessa decisão. 

O que leva a pessoa escolher viver a solitude?

A solitude é um termo mais poético para quando nos referimos a solidão. A solitude é um momento em que o indivíduo está conectado e em paz com ele mesmo. Ele aprende a desfrutar de um tempo que só ele consegue perceber que é importante. Por exemplo, realizar algum tipo de tarefa, como um almoço, um jantar, um café da manhã ou até mesmo, como vemos muitas pessoas fazendo, viajar sozinho. E, nesse sentido, podemos pensar que existe a possibilidade desse indivíduo perder o medo de ficar sozinho, porque, não necessariamente, ele precisa de uma pessoa para fazer todas essas ações que foram mencionadas.

Existe alguma diferença entre solitude e solidão?

A solitude é um estado mais positivo, um isolamento mais voluntário, de independência e de estar bem consigo mesmo. Já a solidão, ela tem uma condição associada à dor e à tristeza. A gente também pode configurá-la como um sentimento de vazio, como se fosse uma necessidade o desejo de ter a companhia de uma pessoa, mas que não tem. 

Quanto tempo leva para uma pessoa transformar a solidão em solitude?

Não existe um tempo para essa questão. Podemos dizer que em alguns momentos a gente pode estar em solidão, com a dor e o sofrimento, mas não quer dizer que em outros não teremos a solitude, a nossa própria companhia e o desejo que isso seja algo prazeroso. Então, não existe um tempo de uma coisa para a outra, é possível que as duas aconteçam em determinados momentos da vida de um indivíduo.

Como podemos apreciar a nossa própria companhia?

Muito importante a pessoa se conhecer de verdade. E isso é algo que demanda das nossas experiências, não só com outras pessoas, mas de vida e de mundo externo. Não só pelos padrões da sociedade em que vivemos. Podemos tirar lições valiosas de tudo o que o que vivemos até esse exato momento. A pandemia da Covid-19 trouxe, de uma maneira bastante interessante e instigante, essa possibilidade, em que o indivíduo começou a perceber como é a sua própria companhia. Até então, tudo era feito de forma muito rápida. A pandemia chegou e mudou essa dinâmica. A partir daí, baseado em minha experiência clínica, comecei a perceber que os indivíduos estão entrando em uma conexão de maior intensidade e apreciando a própria companhia. Isso se torna mais saudável, porque ele acaba tendo mais tempo para ele mesmo, colocando-se em uma posição de prioridade. Claro que sabemos que as outras pessoas, como amigos, relacionamentos, família e colegas de trabalho também são importantes. A interação e o convívio social continuam, mas esse é um movimento que o indivíduo tem feito de uma maneira mais significativa nos últimos meses.

Quando é aconselhável procurar uma ajuda profissional?

Independente de solitude, solidão e qualquer outra questão que coloque o indivíduo em um momento de fragilidade na sua existência, a condição de procurar ajuda em psicoterapia com um psicólogo se faz necessária. Primeiro, precisamos deixar bem claro que não é uma regra eu não estar bem, sentir algum tipo de situação que eu não consiga ter controle e, aí sim procurar ajuda profissional. Sempre foi muito importante a gente ter ajuda de um especialista, seja de um psicólogo ou de alguém que trabalhe com a saúde mental. Em tempos pandêmicos, cada vez mais é necessário que as pessoas procurem ajuda e se ajudem, façam esse movimento de buscar auxílio, de se conhecer melhor e de se colocar nessa disponibilidade consigo mesmo. Hoje, as pessoas têm conseguido fazer exercício com maior tranquilidade, mas não existe uma hora certa. Tudo vai depender da experiência, das atividades, dos desafios e das fragilidades que cada um tem.

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