Chefs da quarentena

Chefs da quarentena

Pandemia prolongada da Covid-19 fortalece o hábito de preparar as refeições em casa e revela novos talentos culinários

Diante das restrições impostas pela pandemia, muitas pessoas tiveram de se aventurar na cozinha pela primeira vez para não sobreviver apenas de delivery, de congelados e de produtos industrializados. Quem antes não passava nem perto do fogão e não conseguia nem fritar um ovo vem se surpreendendo com o universo de possibilidades que a culinária oferece. A alimentação caseira, dependendo das escolhas, pode ser prática, saudável, saborosa e econômica. Além disso, preparar as refeições pode ser um aprendizado divertido, terapêutico e prazeroso. Aqueles que já tinham uma certa familiaridade com a prática estão se reinventando, aprimorando técnicas e descobrindo novas combinações. Confira, a seguir, alguns relatos que servem de inspiração.

MAIS TEMPO NA COZINHA

Melina Cais aprendeu a cozinhar acompa - nhando de perto a avó e a mãe no comando das panelas. Em 2005, quando entrou na facul - dade de Engenharia Agronômica na Unesp, foi morar em uma república fora de Ribeirão Preto e longe da família. “Tive que colocar os meus talentos culinários à prova nessa época. Como já sabia bastante, consegui me adaptar à nova rotina sem problemas”, recorda. De volta à cida - de, manteve o hábito de preparar as refeições e logo viu que já estava apaixonada por esse universo. “Para mim, cozinhar é extremamente prazeroso, tanto no dia a dia, quanto no final de semana ou, ainda, em uma ocasião especial. Gosto de todo o processo, da compra dos ingre - dientes à montagem de uma mesa bem bonita. A comida feita em casa tem um gostinho único, pois temos a oportunidade de colocar tudo o que mais agrada o nosso paladar: alho, cebola, sal, pimenta, páprica, cheiro verde e alecrim, entre outros temperos”, afirma. Durante a pan - demia, ela tem ficado mais em casa e, conse - quentemente, na cozinha. “Aproveito o tempo para aprimorar minhas técnicas e testar novas combinações. No Instagram, sigo várias pessoas que cozinham muito bem. Dou um ‘print’ nas receitas que me chamam a atenção e, sempre que me dá vontade de comer algo diferente, olho os arquivos. Nesse período, já reproduzi diversas delícias”, confessa. Três pratos são sua marca registrada: salmão ao forno com queijo gorgonzola, fraldinha com alho ao forno e fa - rofa com cebola crispy. “Toda vez que eu faço é um sucesso. Não tem erro”, ressalta. Entre as suas preferências, ela destaca as carnes, de to - das as formas. É, inclusive, cofundadora de um blog especializado no assunto. Já a sobremesa é um tema um pouco mais complicado. “Tive algumas experiências que não saíram conforme o esperado”, diverte-se.

DO SOFISTICADO AO SIMPLES

Tuca Nassif também teve que se ajustar à nova realidade imposta pela pandemia. Antes, quando ele ia para a cozinha, era para preparar pratos mais sofisticados. “Como sou de uma família árabe, desde criança, fui acostumado a ver todo mundo reunido em volta da mesa, conversando, participando e apreciando banquetes típicos maravilhosos. Trabalho no ramo imobiliário e, nas visitas técnicas, o que me chama atenção, de imediato, é a cozinha e a varanda gourmet. Eu amo esses ambientes, que funcionam como o coração da casa ou do apartamento. Essa é a nossa cultura. Apesar de ser muito natural para mim, as receitas não são nada fáceis. É preciso ter habilidade para achar o ponto certo da massa da esfirra e chegar no tempero e na textura ideais para um quibe, por exemplo. Além disso, sou fã da culinária italiana. Uma das minhas especialidades é o risoto, que também exige uma técnica refinada de preparo para ficar como tem que ser de verdade”, ressalta.

Desde que a onda de Covid-19 começou, o empresário tem cozinhado bastante para a esposa, Carol, e para os dois filhos, Lucca e Enrico, mas, agora, uma comida mais prática, de acordo com as necessidades do dia a dia, com um cardápio composto por arroz, feijão, legumes, bife acebolado, ovos e legumes cozidos, entre outros. O toque “gourmet”, no entanto, está sempre presente. “É inevitável. Incremento o arroz para ficar mais parecido com um risoto. Tempero bem o feijão. Intercalo as carnes, os legumes e as opções de mistura. Essa variação é muito importante para não enjoar. Mesmo as receitas que são teoricamente simples podem, sim, ter sabores complexos. Basta usar um pouquinho de criatividade para encontrar inúmeras possibilidades de combinações”, indica Tuca.


EQUILÍBRIO NO DIA A DIA

Segundo a nutricionista Milene Ferronato, o primeiro passo para quem quer cozinhar em casa no dia a dia sem abrir mão da praticidade, do sabor e, especialmente, do equilíbrio, é o planejamento. “Vale a pena reservar um tempo para programar a semana. Ao selecionar receitas e comprar os ingredientes de acordo com essa demanda específica, a pessoa economiza tempo e dinheiro”, destaca a especialista. Na hora de montar o cardápio, é preciso ter em mente os conceitos de uma alimentação balanceada. “É fundamental ter na lista alimentos cereais (arroz/ milho/ quinoa/ aveia), leguminosas (feijão, ervilha, lentilhas), carnes (aves/peixes/bovina, de acordo com a preferência alimentar), ovos, queijos e óleos vegetais, incluindo azeite extravirgem de boa qualidade. Frutas, verduras de folhas e legumes não podem faltar, assim como as ervas, como manjericão, salsa, cebolinha e alecrim. Além de valorizarem o sabor, esses temperos agregam fitoquímicos importantes para a nossa saúde”, explica.

Para facilitar o preparo, os vegetais folhosos, depois de lavados, higienizados e secos, podem ser guardados na geladeira por, aproximadamente, três dias. Já as ervas, que estragam muito rápido, devem ser higienizadas e congeladas, aumentando sua durabilidade. “O congelador também ajuda a manter a consistência e o sabor de alguns pratos prontos, como molho de tomate, torta de frango, torta de vegetais, quibe assado, sopas, feijão e grão-de-bico, por exemplo. O recomendado é separar a comida em porções pequenas, colocá-la em potes de vidro e resfriá-la antes do congelamento”, orienta Milene.

SUGESTÕES DE CARDÁPIO
Fonte: Milene Ferronato 
1) 
• Salada de alface, agrião, cenoura ralada e tomate 
• Filé de frango com salsinha 
• Arroz • Feijão 

2) 
• Salada de alface
• Legumes assados no forno (berinjela, abobrinha e abóbora cabotiá, com cebola roxa e branca, sal, azeite e alecrim) 
• Carne (de sua preferência) grelhada 
• Arroz 
• Lentilha 

3) 
• Salada de alface americana, alface roxa, tomate cereja, milho verde e gengibre ralado
• Filé de tilápia com gergelim
• Batata cozida
• Laranja (ingerir a parte branca)

4)
• Salada de alface, couve manteiga e beterraba ralada
• Carne bovina em tiras com pimentão vermelho, pimentão amarelo e cebola
• Arroz
• Feijão

DICA DE PROFISSIONAL

Manuela Ferrão, chef à frente do Bistrot Clandestino, compartilha cinco dicas para deixar a comida caseira ainda mais saborosa:
1. Use ingredientes frescos. 

2. Evite temperos processados, que contêm muito sódio. Às vezes, um mix de ervas frescas, cebola e alho é suficiente, dispensando o uso do sal (então, processe tudo com um pouco de azeite e deixe na geladeira para temperar arroz, carnes e massas). 

3. Eu sei que é difícil ter que cozinhar todos os dias, mas faça disso um hábito de amor a todos da casa. Cozinhando em porções pequenas, todos os dias, você terá comidas novinhas à mesa para surpreender a família. 

4. Quando comprar as carnes no mercado, já faça as porções e deixe temperadas para cada refeição, identificando o que não vai ser usado em potes com data de manipulação e vencimento. Lembre-se: a organização deixa tudo mais prático. 

5. Se puder, chame alguém da família para te fazer companhia e ajudar a cortar os legumes, lavar as hortaliças ou mesmo arrumar a louça. Assim, a cozinha sempre será um ambiente afetivo para todos

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