Alicerce forte

Alicerce forte

Apesar da crise causada pelo novo coronavírus, setor imobiliário conseguiu se manter aquecido durante os momentos de incerteza e projeta uma retomada para os próximos meses

Texto: Paulo Apolinário


A venda de imóveis cresceu 10,5% no segundo trimestre de 2020 no Brasil em relação ao mesmo período do ano passado. As vendas também apresentaram alta de 9% entre junho de 2020 e 2019 em relação aos 12 meses anteriores. Os dados fazem parte de um levantamento da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc) e revelam a força do setor mesmo durante o período de maior incerteza da crise causada pelo novo coronavírus. Uma série de fatores incide sobre os resultados do mercado imobiliário. Segundo o economista e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP de Ribeirão Preto, Luciano Nakabashi, os juros baixos e a retomada gradual da confiança estão entre os principais motivos para a solidez desse segmento. Em agosto, o Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, cortou a taxa de juros a colocando em um patamar mínimo histórico: 2%. "Se compararmos a incerteza que tínhamos em março e abril com hoje, ela é muito menor. Isso aliado a juros mais atrativos, foram clareando um pouco o otimismo das pessoas", comenta Nakabashi.

Em Ribeirão Preto, as construtoras e incorporadoras mantiveram o mercado aquecido. Marcelo de Andrade Barros, diretor financeiro e comercial da Habiarte, frisa que a decisão do Banco Central em afrouxar ainda mais a política monetária foi decisiva para manter diversos setores da economia funcionando, com destaque para o mercado imobiliário. "Diante de um quadro de inflação totalmente controlada em níveis baixíssimos, a redução da taxa básica de juros veio para dar uma injeção de ânimo para o setor produtivo, tanto na ponta das vendas, quanto na ponta do financiamento. É um cenário que sempre foi desejado por empresários e clientes, mas que até alguns anos atrás parecia impossível de acontecer. Agora, veio para ficar”, ressalta o diretor da Habiarte. Ricardo Telles, diretor e presidente da Perplan acrescenta que a redução constante na taxa de juros nos últimos anos tem auxiliado o mercado imobiliário não apenas no momento da crise. Esse fator é decisivo para o setor, pois é vantajoso para as empresas conseguirem crédito barato para construírem e, também, para os consumidores financiarem o imóvel. "A taxa Selic baixa permite e melhora o poder de compra do consumidor, fazendo com que famílias com menores rendas consigam comprar imóveis melhores", pontua. Além disso, segundo Telles, os juros baixos atraem investidores para o setor imobiliário, que antes preferiam deixar o dinheiro rendendo em bancos.

Um dos motivos para o setor não ter parado durante os momentos mais duros da crise da Covid-19 foi a categorização como "serviço essencial" do setor imobiliário, o que permitiu a continuidade das obras e a pontualidade nas entregas. “A continuidade manteve postos de trabalho e, em alguns casos, até mesmo gerou novas vagas”, afirma Augusto Collaço, diretor comercial da Copema. “Considerando que o segmento é quem mais emprega na cidade, gerando cerca de 10 mil vagas diretas e indiretas, a construção civil ajudou a aquecer a economia local nesse momento de crise”, acrescenta. Apesar de as obras não pararem, o choque causado pela quarentena, em março e abril, fez o mercado repensar os rumos para o restante do ano. Segundo José Camarero Neto, diretor comercial do grupo que engloba as construtoras Bild Desenvolvimento Imobiliário e Vitta Residencial, nos dois primeiros meses da quarentena, os consumidores, principalmente de renda média, optaram por guardar o dinheiro e não embarcar em um investimento a longo prazo. "No entanto, a partir de maio, o mercado começou a retomar e começamos a bater recordes de vendas", lembrou diretor. Isso fez com que o ano tivesse três momentos distintos no planejamento das empresas. Entre janeiro e fevereiro, ninguém esperava que a pandemia fosse ter tamanho impacto, por isso, a Bild estimava um crescimento de 60% em 2020. Entre março e abril, a incerteza tomou conta do mercado e foi necessário recalcular a rota. Todavia, passado o susto inicial e com o crescimento da confiança e da estabilidade, a empresa projeta um crescimento de 40% para o ano.

Apesar de o canteiro de obras não ter parado, muitas empresas tiveram de se adaptar ao home office e às novas regras para os trabalhadores dos escritórios. Segundo Luciano Marco, diretor comercial e de marketing da Stéfani Nogueira, nos períodos mais rígidos da quarentena, os escritórios e plantões de vendas precisaram ser fechados. “Nesse momento, revimos nossas estratégias e aceleramos o processo de transformação digital, que já estava em curso na Stéfani Nogueira”, explica. Dessa forma, a empresa conseguiu equilibrar as frentes de trabalho e proporcionar tranquilidade para os clientes. "Conseguimos aliar a tecnologia ao conhecimento de nossos consultores para ‘fazer a roda seguir girando’, criando o menor impacto possível no planejamento anual", ressalta Marco. Entendendo o momento, a empresa intensificou o atendimento via chat e WhatsApp, além de criar formas de ofertar o produto ao cliente. "Os empreendimentos possuem o tour virtual pelo apartamento decorado, que proporciona uma experiência próxima do real", conta o diretor comercial. O economista Luciano Nakabashi ressalta que a estratégia de cada empresa é essencial nesse momento. Além das medidas governamentais, como o controle da crise e manutenção dos juros baixos, cabe às empresas repensarem o novo momento que o Brasil e o mundo atravessam. "Em termos gerais, o setor imobiliário depende muito dos elementos macroeconômicos. Porém, do ponto de vista de cada empresa, a retomada depende do planejamento estratégico. Tem empresa que consegue crescer em momentos ruins e há empresas que crescem menos do que a média do mercado", alerta o economista. 

Melhor momento desde a implantação do Plano Real

"O setor imobiliário está em um momento inédito, com pouca oferta de novos empreendimentos e um custo de oportunidade baixíssimo para os clientes e investidores. O momento é muito propício para aquisição ou investimento em ativos reais, e o produto imobiliário é o que mais se destaca dentro das possibilidades. Vejo o setor tendo um dos seus melhores períodos desde a implantação do Plano Real”.

João Marcelo de Andrade Barros, diretor financeiro e comercial da Habiarte

Pilares da retomada

“O setor imobiliário deve atrair boas oportunidades ainda, com novos poderes de compra ao consumidor e os investidores. O mercado de construção civil será um dos pilares para a retomada econômica do país, visto que há uma tendência de retomada de compra, pois o setor da construção civil continua aquecido. O que acontece no momento é que as construtoras estão sofrendo com reajustes de preços nos suprimentos como aço e cimento. É pública a luta do setor para conseguir manter os preços”.

José Camarero Neto, diretor comercial do grupo que engloba as construtoras Bild Desenvolvimento Imobiliário e Vitta Residencial

De olho no futuro 

“Há, sim, otimismo no mercado imobiliário. Contudo, o mercado é cíclico e esse otimismo pode durar, estimo, perto de dois anos. Ao final desse tempo, outras coisas podem influenciar nos resultados, como o ano eleitoral, os juros, que podem subir um pouco, e o fato de parte da demanda reprimida já ter sido suprida. Uma preocupação que surge, mas em pequena escala, é com relação ao aumento dos custos de produção. Apesar disso, o otimismo do mercado como um todo é bastante forte. Em particular, na Perplan, indica um aumento no número de lançamentos, em 2021, em relação a todos os outros anos”.

Ricardo Telles, diretor e presidente da Perplan

Condições ideais 

“O momento é ideal para quem quer adquirir imóveis, seja para morar ou investir. Além da queda nos juros, alguns bancos elevaram o limite de financiamentos, há incentivo governamental e outras facilidades, como a utilização do saldo de Fundo de Garantia (FGTS). Aliado a isso, o mercado está oferecendo excelentes opções e condições diferenciadas”.

Augusto Collaço, diretor comercial da Copema

Experiência e cautela 

"Somos uma empresa com quase 40 anos no mercado da construção civil e já vivenciamos outros momentos desafiadores. Como sempre, fomos conservadores e cautelosos, o que nos permite sempre avançar. Mas o otimismo também faz parte do nosso DNA. Seguimos planejando e construindo o futuro, acreditando que ele será muito melhor do que nossas projeções".

Luciano Marco, diretor comercial e de marketing da Stéfani Nogueira

Compartilhar: