Corda bamba

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Demora na liberação de medicamentos para a intubação de pacientes com Covid-19 cria estado de tensão permanente em hospitais e na Secretaria de Saúde de Ribeirão Preto

Nas últimas semanas, Ribeirão Preto atravessou momentos de tensão na espera por novos lotes da medicação necessária para a intubação de pacientes com Covid-19. Com a ocupação dos leitos de UTI acima dos 90%, as reservas se esgotaram rapidamente e o município se viu à beira de um colapso. De acordo com estimativas do governo municipal, a última compra da medicação para intubação deve abastecer os hospitais por três meses. Em tempos normais, antes da pandemia, essa mesma quantidade de medicamento seria suficiente para suprir o município por três anos.

O chamado “kit covid” é composto por três medicamentos que são indispensáveis para a intubação e o tratamento de pacientes em estado grave: Midazolam, que é um indutor do sono; Fenatil, utilizado para aliviar dores crônicas; e o Cisatracúrio, que atua como um bloqueador neuromuscular. Até o dia 16 de abril, o município aguardava a chegada dos remédios. Hospitais como o Santa Lydia tinham estoques para mais três dias. “Para a Secretaria de Saúde, o ponto crítico é o Hospital Santa Lydia e os polos Covid. Todos os hospitais estão mais ou menos na mesma situação, temos nos ajudado mutuamente na troca de drogas, mas todo mundo está nesse perfil de mais dois ou três dias”, declarou o secretário de Saúde, Sandro Scarpelini. O carregamento chegou somente no domingo, 18 de abril. Segundo a Prefeitura, ele contém um estoque de mais 40 dias de Midazolam e 14 dias de Fenatil e do bloqueador neuromuscular.

A demora na entrega dos lotes se deve a uma requisição administrativa feita pelo Ministério da Saúde no dia 23 de março. Com essa requisição, todo kit Covid deve ser enviado pelas farmacêuticas para o Ministério da Saúde e não mais para estados e municípios. Previsto na Constituição, esse artifício permite, em emergência, que o governo federal use bens privados para resguardar o interesse público e depois indenize os gastos. Com essa ação, a União pretende realizar uma distribuição mais equitativa do kit.

Prevendo um atraso na liberação das drogas, a Prefeitura de Ribeirão Preto contatou o Ministério Público, que moveu uma ação contra a medida, mas ela não foi acatada pelo juízo de primeira instância. "No dia 5 de março, a Prefeitura de Ribeirão Preto fez um contrato com a empresa fornecedora desses medicamentos. Nós íamos receber algumas semanas depois os primeiros lotes dessa aquisição, no valor de R$ 4 milhões, para atender toda a nossa estrutura por três meses", lembrou o prefeito Duarte Nogueira (PSDB). "A requisição administrativa virou um confisco de 100% da produção", criticou Sandro. Assim, mesmo com o acordo firmado com a farmacêutica, o município teve de aguardar a liberação do governo federal para ter acesso ao medicamento.

Questionado sobre o porquê de o município não ter feito um estoque, preparando-se para possíveis atrasos, o secretário de Saúde foi enfático. “Se eu tivesse comprado 3 milhões em agosto do ano passado, teria jogado no lixo, porque vencem. O medicamento tem prazo de validade. Por isso o contrato prevê entregas mensais”, explicou.

A ação do Ministério da Saúde também foi criticada pelo governo paulista. Em nota, o Palácio dos Bandeirantes cobrou celeridade na liberação e declarou que foram destinados 500 mil medicamentos provenientes da requisição administrativa. “Esse baixo quantitativo foi liberado entre os dias 15 e 31 de março, após seis meses sem realizar nenhuma entrega ao Estado, e equivale a cinco dias de consumo diante da demanda mensal atualmente registrada na rede de saúde de São Paulo, de 3,5 milhões de sedativos e neurobloqueadores. Essa demanda é de conhecimento do Ministério, uma vez que o Estado informa diariamente o status de seu consumo”, informou, em nota.

Em entrevista na última semana, ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, respondeu às críticas de São Paulo. “Há estados que são maiores que países e que têm condições de captação no mercado internacional. A própria iniciativa privada pode buscar insumos no exterior e trazer. É obrigação de todos nós, que somos gestores, em uma ação conjunta, suprir o mercado nacional. Não é hora de um ficar atirando no outro”, alegou o ministro.

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