Luta contra o racismo

Luta contra o racismo

A advogada Luana Karla De Souza Arantes explica por que o racismo não pode ser considerado opinião, quais os impactos do preconceito e a importância de ações afirmativas

*Matéria publicada na edição 1090 da revista Revide.

Em 20 de novembro, é celebrado no Brasil o Dia da Consciência Negra. A data lembra o líder do Quilombo dos Palmares, Zumbi, que foi morto por bandeirantes nesse dia, em 1695. Ele foi uma figura importante na história do Brasil e representa a resistência à escravidão no país, que perdurou por longos 353 anos (oficialmente, de 1535 a 1888).

Tantos anos de escravidão faz o racismo ser, ainda, muito presente no dia a dia. É frequente acompanharmos nos noticiários casos graves de preconceito, como a violência policial contra negros, seguranças que perseguem negros em lojas de shopping e ataques a políticos negros.

Na entrevista desta semana, a advogada especialista em Direitos Trabalhistas e Previdenciária e membro da Comissão da Igualdade Racial na 12ª Subseção da OAB de Ribeirão Preto, Luana Karla De Souza Arantes, explica por que o racismo é estrutural na sociedade e por qual motivo a lei não é suficiente para acabar com este tipo de preconceito no Brasil.

O que é racismo?

O racismo é a discriminação social, a crença na existência de raças e sua hierarquização. É a ideia de que há raças e de que elas são naturalmente inferiores ou superiores a outras, em uma relação fundada na ideologia de dominação. As características fenotípicas são utilizadas como justificativa para atribuição de valores positivos ou negativos, atribuindo a essas diferenças a justificativa para a inferiorização de uma raça em relação à outra. 

Podemos considerá-lo como uma opinião?

Jamais, uma vez que opinião significa maneira de pensar, de ver, de julgar ou ponto de vista adotado. Logo, o racismo é preconceito, discriminação ou antagonismo por parte de um indivíduo, comunidade ou instituição contra uma pessoa ou pessoas pelo fato de pertencer a um determinado grupo racial ou étnico, tipicamente marginalizado ou uma minoria. Assim, opinião é um “achismo” sobre algo ou alguém. Já o racismo é um fato predominante, é crime na Lei nº 7.716 de 5 de janeiro de 1989, o qual traz consigo imensas dores, lutas e resistência de um povo que busca dia a dia a sobrevivência e reconhecimento para alcançar seus espaços.

"Para que haja mudança nesse cenário, é primordial reconhecer que o racismo é um problema estrutural", ressalta a advogada

Por que o racismo é considerado estrutural na sociedade?

Porque foi criada uma estrutura que impede as pessoas de pele negra chegarem em lugares de direito como seres humanos normais e capazes que são. No racismo estrutural, os negros são tratados como inferiores, como menos capazes, estando sujeitos a obrigações e deveres diferenciados, que criam condições desiguais de convivência. Vários conceitos foram criados para sustentar o racismo estrutural, como a supremacia branca e a história escravagista.

Racismo estrutural é a formalização de um conjunto de práticas institucionais, históricas, culturais e interpessoais dentro de uma sociedade que frequentemente coloca um grupo social ou étnico em uma posição melhor para ter sucesso e, ao mesmo tempo, prejudica outros grupos de modo consistente e constante, causando disparidades que se desenvolvem entre os grupos ao longo de um período.

O racismo social também foi chamado de racismo estrutural, porque, segundo Carl E. James, a sociedade é estruturada de maneira a excluir um número substancial de minorias da participação em instituições sociais. Por muito tempo imperceptível, essa forma de racismo tende a ser de tamanha dificuldade de percepção tendo em vista um conjunto de práticas, hábitos, situações e falas enraizadas em nossa cultura, promovendo, direta ou indiretamente, a segregação e preconceito racial. Ou seja, essa estrutura impede e inviabiliza que os negros tenham acesso a educação, empregos e socialização.

Racismo é crime no Brasil, mas por que a lei não é suficiente para resolver o problema?

É primordial entender que a lei sozinha não é capaz de mudar comportamentos e mentalidades, ou seja, faz-se necessário a implementação de ações públicas de conscientização da população sobre o racismo e a importância dessa luta, para que a sociedade aprenda que houve um erro histórico e que se mantém enraizada a crueldade em diminuir pessoas negras e inferiorizá-las, fazendo com que o racismo seja banalizado.

É necessário que o Estado e todos os poderes tenham uma visão de reconhecimento à história do povo afrodescendente, que é carregada de muita dor, desigualdade, exclusão e menosprezo. Para que a lei seja efetiva, é crucial que o Estado, ao receber a denúncia de racismo, não a banalize, fazendo com que seja eficaz o cumprimento da lei, para que a pessoa que comete esse crime entenda a gravidade do ato e não reincida.

Também é necessário que as provas de que este crime de fato aconteceu não sejam complexas. A meu ver, uma avaliação psicológica seria capaz de detectar o quão afetada fica a vítima de racismo. Após anos de desigualdade, humilhações e impedimentos, o sistema social precisa reconhecer que o racismo não é algo banal na sociedade ou apenas o famoso “mimimi”, visto que a luta contra o racismo foi, é e sempre será de muita resistência.

O que pode ser feito para mudar essa situação? Para que haja mudança nesse cenário, é primordial reconhecer que o racismo é um problema estrutural e, diante disso, adotar posturas de enfrentamento, pois a negação e a naturalização do racismo contribuem para sua perpetuação. É necessário garantir representatividade de raças e etnias nos espaços coletivos de decisão, para que as minorias possam defender seus próprios interesses e os espaços de falas sejam verdadeiramente representados, garantindo a manutenção entre a igualdade e a diferença, dentre outros. 


Fotos: Luan Porto

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