Nos últimos cinco anos, 45 crianças e adolescentes foram adotados em Ribeirão
No Dia Nacional da Adoção, o Portal Revide preparou uma reportagem com histórias de pessoas que vivenciaram o processo e com os dados do município
Em Ribeirão Preto, de janeiro de 2015 a abril de 2019, 45 crianças e adolescentes foram adotados na cidade. De acordo com dados da Vara da Infância e da Juventude, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em maio deste ano há 206 pretendentes para adoção ativos no município, sendo casais e solteiros. Entretanto, há apenas dois adolescentes com idades de 12 e 15 anos disponíveis para adoção na Justiça. O juiz Paulo César Gentile fala sobre o assunto e tranquiliza os adotantes.
“O pretendente tem que demonstrar a motivação legítima e dar respaldo a pretensão e mostrar que ele tem condição de cuidar de uma criança. A situação financeira é a que menos importa, a pessoa tem que ter uma rotina e um ambiente capaz de receber uma vida, ela vai passar por um estudo psicológico e aí então pelo cadastro de Ribeirão Preto, que alimenta o estadual e, depois, o nacional. Ou seja, uma pessoa de Ribeirão pode ser chamada para adotar uma criança de qualquer lugar do país”, conta o juiz.
Segundo o Tribunal de Justiça, a grande maioria das pessoas deseja adotar uma criança recém-nascida. Para estas, o tempo de espera é de aproximadamente cinco anos. Mas não há sorteios.
“A fila anda, mas devagar, pois são muitos os pretendentes e poucas as crianças disponíveis para adoção. É mais difícil colocar um adolescente em adoção, mas também é raro ter algum para ser adotado. Tem caído o número de crianças entregues para adoção voluntariamente. Não sei avaliar esse fenômeno, mas acho que as políticas de distribuição de renda aplicadas aos longos dos últimos 30 anos geraram esse reflexo”, conclui Gentile.
Experiências
Neste sábado, 25, é comemorado o Dia Nacional da Adoção. A data é um momento para lembrar da importância que é o acolhimento de crianças e adolescentes por novas famílias. Por isso, o Portal Revide conversou com pessoas que vivenciaram estes processos em Ribeirão Preto. Confira:
Legado e sonho
O professor Lucas Ormeño, de 31 anos, é adotado e agora pretende adotar um filho. Negro, ele vive em uma família de brancos, o que não atrapalhou em nada o afeto com os familiares.
“Fui adotado ainda bebê. A minha mãe biológica, apesar da adoção, sempre esteve por perto. Mamava nela, inclusive. Mas percebi que era adotado pequeno ainda. Isso nunca foi escondido pelos meus pais. Devia ter no máximo 5 anos. Todo mundo perguntava porque da diferença. Eu mesmo não percebia nada. A gente não tem esse raciocínio de como eu sou o único negro numa família branca. Hoje, crescido, eu entendo, mas eu olhava meus pais e meus irmãos e via somente pais e irmãos. Via minha família. Nunca me senti tratado diferente ou coisa parecida. Na verdade, esses questionamentos eram sempre externos. Sou muito amigo de meus irmãos hoje, e mesmo após o falecimento dos meus pais, ainda nos vemos assim. Família, porque é o que somos de fato”, fala Ormeño.
Diferente do que é visto normalmente, o homem ainda tem contato com a mãe biológica e diz ter entendido os motivos da não criação. “Não conheci meu pai biológico. Mas eu sei onde ela mora, o que tem passado, e sempre nos falamos. Temos um ótimo relacionamento, e conforme eu crescia eu entendia os motivos pelos quais ela não pode ficar comigo. Claro que cada caso é um caso, mas não tenho e nunca tive nenhum tipo de sentimento de rejeição. Acredito verdadeiramente que nem todo pai e mãe biológicos deixam de criar seus filhos por simplesmente não querê-los. Conheci outras pessoas que passaram por situações parecidas, e entendi que a maneira como cada um sente o seu processo de adoção é muito particular”.
Agora, ele pretende adotar um filho. “Aprendi que adoção é algo necessário, inclusive, dentro de lares onde todos os filhos são biológicos. Eu como filho também adotei meus pais e não trocaria por nenhum outro casal na terra. Ter a certeza de que fui de fato querido, e que lutaram por mim, só me faz sentir mais amado. Não é gratidão, porque não era caridade. Era amor. Era de fato maternidade e paternidade. Pretendo adotar, mas não é como uma tradição a ser mantida, e esse desejo não vem do fato de eu ter sido adotado. Vem do meu desejo de ser pai. Por não ter conseguido ter filhos após anos de tentativa, resolvemos nos dar a chance. Não estamos escolhendo sexo ou cor, e não fazemos questão de bebês. Minha esposa e eu só queremos um filho”.
Escolha de criança
Nem todos os casos de adoção são de pessoas que optam por apenas receber uma vida. Os números mostram que a preferência são por brancos e com menos de 10 anos. Dentre os 45 adotados na Comarca ribeirãopretana, que abrangem Ribeirão Preto, Guatapará e Bonfim, 28 eram brancos, nove pardos e oito negros.
Diferente dos outros pais, Sônia Maria Moreno adotou uma criança mestiça e com uma deficiência. Após perder dois bebês, ela e o ex-marido optaram por encontrar um filho, mesmo que não fosse de sangue.
Assim, com 10 dias de vida, apareceu Maicol Yoshini na vida do casal. Atualmente, ele tem 34 anos e vive sorridente com a mãe. “Eu já tinha perdido duas crianças. O médico disse que seria muito arriscado tentar novamente. Então a gente decidiu adotar. Eu fiz a ficha de adoção e como meu ex-marido é japonês, optamos por um mestiço. O meu filho nasceu e foi entregue ao juizado. Chamaram-nos e informaram que havia um garotinho que sofria convulsões e estava tomando gardenal. Entretanto, não pensamos duas vezes e fomos conhecer o neném”.
A informação daquela época era de uma suspeita de uma possível tentativa de aborto, o que machucou o crânio de Maicol. Só apenas com oito meses de vida, foi descoberto que o menino tinha paralisia cerebral.
“A deficiência afetou a parte motora, o que traz dificuldades na fala e no andar. Mas ele se tornou o xodó da família. Começamos todo o tratamento de terapia e tudo que tinha que fazer, até que com quatro anos ele começou a andar. Passamos por uma série de problemas com a mãe biológica, mas hoje foi tudo superado. Ele é meu filho. Não há diferença nenhuma. É tratado por todos de maneira normal”, enaltece Sônia.
Superação em conjunto
Desde 2015, 24 meninos e 21 meninas foram adotadas em Ribeirão Preto. A família de Elisangela Borges se enquadra nesses dados. A mulher é mãe de três crianças, mas dessas, duas são adotadas.
Tudo começou com a vontade de adotar antes mesmo do casamento com o marido Wander. “Eu e meu esposo nos casamos em março de 2011. Meu sonho sempre foi adotar uma criança. Então deixei bem claro isso a ele antes do casamento. Concordamos que íamos ter um filho biológico e adotar mais um. Entretanto, depois de um ano de tentativas veio o diagnóstico de endometriose grau moderado, foi preciso fazer três cirurgias para tratar o problema e também retirar as trompas. Nesse período, iniciei o processo de adoção junto com o tratamento de fertilização in vitro”.
No começo, o casal se inscreveu para receber uma criança de até cinco anos de qualquer etnia ou sexo. Ao mesmo tempo, havia o trabalho médico para que fosse possível a gravidez. “Até que resolvemos desistir do tratamento e nos tornarmos pais apenas por meio da adoção. Decidimos, depois de muito estudo, mudar nosso perfil para duas crianças de até 9 anos. Isso ocorreu em fevereiro de 2017. No dia 7 de abril daquele ano, nós recebemos o tão esperado telefonema dizendo que nossa hora havia chegado”.
As crianças foram apresentadas no dia 10 daquele mês e em 8 de maio de 2017 já estavam no novo lar. Everton, 10 anos, e Anna Clara, 8 anos, eram irmãos que ganhavam novos pais. “Foi a maior emoção que vivi até aquele momento. A adaptação das crianças transcorreu de forma tranquila, até que três meses depois uma grande surpresa aconteceu. Eu estava grávida. Era um milagre, pois sem as trompas é raro engravidar segundo a Medicina. Tudo deu certo e a Sofia nasceu no dia 24 de maio de 2018. Nessa sexta-feira, 24, fez um ano que nossa família ficou completa”, finaliza a professora.
Fotos: Arquivo Pessoal e Luan Porto
