Paixão pelo antigomobilismo

Paixão pelo antigomobilismo

Relíquias sobre rodas fazem sucesso entre os ribeirãopretanos

*Matéria publicada na edição 1098 da revista Revide.

O carro é uma paixão compartilhada por muitos brasileiros. Enquanto alguns aguardam ansiosamente a hora de conferir as inovações apresentadas pelas montadoras em seus próximos lançamentos, outros sentem o coração acelerar, de verdade, quando estão diante de relíquias do passado. O foco desta matéria está no segundo grupo, que tem uma verdadeira coleção de boas histórias para contar. Imagine, por exemplo, reformar uma moto BMW que veio da Alemanha na 2ª Guerra Mundial? O engenheiro Renato Penteado Crósta teve essa oportunidade.

“Gosto do desafio de restaurar, de fazer o veículo voltar a circular, mantendo a originalidade. Para que isso aconteça, é preciso estudar bastante sobre o assunto, entender a dinâmica do mercado, encontrar os contatos certos, inclusive no exterior, e estar sempre atento. Fiz todo o trabalho com a BMW, que foi, inclusive, divulgado pela fabricante aqui na América do Sul, pela raridade do modelo. Quando estava pronta, recebi uma ligação do interior do Rio de Janeiro. A pessoa que entrou em contato tinha uma moto idêntica. O pai dele e o tio haviam fugido da Alemanha juntos, com duas motos. Quando conferimos o número do chassi, elas eram sequenciais. Uma história e tanto. Não tinha como não vender a moto para ele”, lembra.  “Gosto do desafio de restaurar, de fazer o veículo voltar a circular”, revela Renato

E parece que o universo conspira a favor desses colecionadores. Como parte do pagamento, o comprador ofereceu para Renato uma das motos do seu acervo. “Para a minha surpresa, ele tinha essa Honda Gold Wing de 1978, que era minha paixão na juventude. Naquela época, ela foi absolutamente revolucionária. Parecia um sonho inatingível para mim”, acrescenta. O modelo é o mais fabricado do mundo. A linha de produção começou em 1974 e continua até hoje. O engenheiro mostra, orgulhoso, a riqueza de detalhes no design, os diferenciais da parte mecânica, o manual e até o chaveiro original. Entre outros veículos que estão guardados em sua garagem, esse parece ter um espaço especial. 

Renato faz parte do Faixa Branca Clube do Carro Antigo de Ribeirão Preto. Fundado em 16 de junho de 1989, o local se tornou o ponto de encontro dos fãs do antigomobilismo. O diretor do Sistema Clube de Comunicação, Demétrio Luiz Pedro Bom, também está na lista de associados. Para aparecer nesta reportagem, ele escolheu a Kombi “Last Edition”, um modelo raro – e cheio de significado – da Volkswagen. O colecionador explica que o veículo foi lançado no final de 2013, para marcar o encerramento da linha de produção da Kombi no Brasil. “Neste carro, temos itens que marcaram a história da Kombi, como, por exemplo, as duas cores na parte externa, branco e azul, que chamamos de saia e blusa. É tudo original: as janelas, as cortinas e os bancos listrados, entre outros detalhes que remetem à trajetória de 56 anos de absoluto sucesso desse veículo no país”, enfatiza. 

Foram somente 600 carros produzidos no país, todos numerados. O de Demétrio é o 95. A numeração motivou, inclusive, a confecção de uma placa personalizada: END 0095. E engana-se quem pensa que essa e as outras relíquias que ele adquiriu no decorrer dos anos ficam apenas na garagem para apreciação. “Todos os meus carros e motos funcionam e são licenciados. Alguns deles eu uso no dia a dia mesmo, para trabalhar e passear pela cidade. É um hobby delicioso e contagiante. Hoje, tenho o prazer de compartilhar essa paixão, não só com os meus amigos do clube, mas com os meus filhos também. Não tenho como descrever o quanto isso me deixa feliz”, revela.  

O empresário Eduardo Crósta é o atual presente do clube. É dele o carro símbolo do Faixa Branca. “Esse é um Ford Fanton 1931. Desde que foi reformado, sempre esteve à serviço do clube e da cidade e nunca me deixou na mão. Já conduziu políticos em posses, Rei Momo no Carnaval e Papai Noel no Natal. São muitas histórias para contar”, diverte-se. Eduardo, que já chegou a ter 23 carros, motos e bicicletas em sua coleção particular, afirma que, hoje, está mais comedido. “Não é fácil, mas estou tentando me controlar. O contato próximo com outros apaixonados por carros como eu, por meio do clube, tem me ajudado nessa difícil missão. Aqui, estou sempre envolvido com novos projetos”, comenta. 

Atualmente, o Faixa Branca conta com, aproximadamente, 250 associados, que se reúnem periodicamente para reuniões, exposições e eventos. Há, ainda, o Museu do Carro Antigo, que sedia exposições de veículos, fotos, troféus e diversos outros itens relacionados ao automobilismo local e nacional, incluindo macacões usados por pilotos consagrados como Paulão Gomes, Fábio Sotto Mayor, João Bá Aguiar e Antônio de Castro Prado. 

Preferência nacional 
Uma matéria sobre carros antigos, sem fusca, não é uma matéria sobre carros antigos. O modelo é preferência nacional. Alguns colecionadores optam por mantê-lo intacto, como o engenheiro químico Lélio Macedônio Cantarella. “Ser original é a prioridade. Por isso, precisamos entender sobre cada uma das características do veículo. Tenho uma pequena biblioteca em casa, onde busco essas referências para garantir a autenticidade dos modelos que revitalizo. Gosto de estudar a origem, pesquisar sobre a funcionalidade dos mecanismos e analisar os detalhes. 

Lélio aponta algumas das características originais que chamam a atenção no modelo

Esse modelo, por exemplo, tem placa preta, justamente por manter esses detalhes, como o cinto de um ponto e o retrovisor apenas no lado direito”, declara.
O empresário Eduardo Kohn Bredariol também é fã do carro. No entanto, o modelo dele tem uma série de inovações. “Tenho uma longa história com o fusca, desde criança, quando meu pai comprou um modelo 1953. Depois, foi um 59. Todo sábado, ajudava a lavar o carro e ganhava um pagamento simbólico pelo meu trabalho. Nesse processo, acabei tomando gosto. Quando tirei carta, o modelo era 71, assim como todos os outros, branco. 

Passeando, sofri um acidente e destruí o carro. Levou um bom tempo para encontrar esse aqui, um modelo 71 e branco, igual ao do meu pai naquela ocasião, mas acabei fazendo uma série de ajustes, como o teto solar e um motor diferenciado”, conclui.

Eduardo é o atual presidente do Faixa Branca Clube do Carro Antigo de Ribeirão Preto


Fotos: Revide

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