Ponto de ônibus em frente ao Marp gera disputa há 15 anos
Tráfego de Ònibus e aglomeração de passageiros em frente à fachada histórica o dia todo

Ponto de ônibus em frente ao Marp gera disputa há 15 anos

Diretor e Associação de Amigos do Marp – Museu de Arte de Ribeirão Preto – reivindicam há mais de 15 anos retirada de ponto de ônibus que “esconde” fachada do imóvel histórico

Uma polêmica acerca de acessibilidade, preservação e valorização de um patrimônio histórico-cultural de Ribeirão Preto opõe, há mais de 15 anos e quatro administrações municipais, Prefeitura e RP Mobi, de um lado, e AAMARP (Associação dos Amigos do Marp) e o próprio Marp (Museu de Arte de Ribeirão Preto) Pedro Manuel-Gismondi, de outro. O centro da discórdia é o ponto de ônibus instalado desde 1999 em frente à fachada do museu, localizado à esquina das ruas Barão do Amazonas e Duque de Caxias – Centro histórico de Ribeirão Preto.

 

Desde sua inauguração, em 31 de dezembro de 1992, o Marp ocupa imóvel histórico construído para abrigar a Sociedade Recreativa de Esportes, inaugurada em 1908. Com arquitetura em estilo eclético projetada pelo ítalo-brasileiro Affonso Geribello, o edifício também foi sede da Câmara Municipal de Ribeirão Preto, de 1956-1984, e passou a abrigar o museu após ampla reforma. Em 2008, o prédio foi tombado como patrimônio municipal pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural (Conppac), em resposta a processo de iniciativa da AAMARP.

 

Criada em 2004 por um grupo da sociedade civil interessado na continuidade dos trabalhos e atividades desenvolvidos pelo museu, a AAMARP tem sido porta-voz de todas as reivindicações de transferência do ponto de ônibus feitas a diferentes administrações municipais. “A gente tem batalhado há décadas por isso e várias vezes a Prefeitura disse que ia acatar nosso pedido, mas muda o prefeito e a gente não consegue”, reclama a atual presidente da entidade, artista plástica Eny Aliperti.

 

De acordo com ela, a atual localização do abrigo de ônibus acarreta problemas de diferentes ordens ao museu, como o de poluição produzida pela movimentação dos dezenas de veículos pesados a servirem nove linhas de transporte urbano com parada ali (leia mais a respeito no box ao lado). “Não só afeta as obras como os visitantes. Além disso, muitas pessoas que querem conhecer o museu, às vezes, não acham sua entrada”, denuncia Eny.

 

Ela acrescenta que a reivindicação de transferência não tem intenção de atrapalhar a circulação de veículos do transporte coletivo ou seus usuários, mas preservar dois patrimônios: o imóvel histórico e o acervo do Marp, com mais de mil obras de artistas de Ribeirão Preto e região (leia na página seguinte). “Acredito que instalar o ponto um quarteirão acima ou abaixo de onde está hoje não fará grande diferença para os usuários”, comenta a artista plástica, que também não poupa críticas ao que considera descaso de todas as administrações anteriores com os museus da cidade. “As pessoas mal conhecem o Marp, que só não acabou porque tem a AAMARP batalhando para angariar fundos que ajude em sua manutenção. A Prefeitura entra com o mínimo possível”, dispara.

 

Contatada para falar sobre o assunto, a atual secretária municipal de Cultura e Turismo de Ribeirão Preto, Maria Eugênia Biffi, informou, por meio de sua assessoria, que “está em tratativa com a Secretaria de Governo e a RP Mobi”.

 

Preservar o entorno é importante

 

Diretor do Marp há 23 anos, Nilton Campos cita outros transtornos causados pela circulação e aglomeração de pessoas sob o abrigo de parada de ônibus em frente ao museu. “Os veículos que trazem estudantes de escolas públicas a visitas agendadas aqui, por exemplo, têm que parar na rua de trás. A aglomeração também é ruim porque algumas pessoas jogam lixo na calçada”, declara.

 

Quem também não se conforma com a localização do ponto de desembarque/embarque em frente ao prédio histórico é o atual presidente do Conppac, Lucas Gabriel Pereira, especialista em Direito Municipal, Ética e Efetivação em Direitos e pós-graduando em Gestão Social do Patrimônio Cultural pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Segundo sua interpretação das leis que versam sobre patrimônios tombados, “a preservação do entorno é tão importante quanto a do bem propriamente dito”. Citando o artigo 18 do decreto-lei federal 25/1937, e o 15 da Lei Complementar 2.799/2016 de Ribeirão Preto, ele fala ainda em “violação à ambiência do patrimônio cultural”. “Poderia o Conppac abrir processo para remover/transferir o ponto de ônibus defronte ao Marp? Poderia”, provoca.

 

RP MOBI

A polêmica acerca do ponto de ônibus em frente ao Marp não terá um desfecho favorável aos reclamantes tão cedo, a julgar pelo posicionamento da RP Mobi, responsável pelo gerenciamento do transporte coletivo urbano em Ribeirão Preto. Por meio de sua Assessoria de Comunicação Institucional, a empresa informou que a estrutura atende ao corredor de transporte implantado na rua Barão do Amazonas e seu remanejamento para a frente de estabelecimentos situados na mesma face de quadra do Marp é “inviável”, pois pode prejudicar o conforto dos usuários do transporte coletivo, bem como comprometer as condições de segurança e fluidez do tráfego de veículos e pedestres na intersecção das ruas Barão do Amazonas e General Osório. “Uma vez que os maiores fluxos de embarque de passageiros nesse local ocorrem nos horários de pico da demanda, no início da manhã e ao final da tarde, (...) observa-se, nesses períodos, a formação de fila desses veículos, que, por vezes, se estende até muito próximo da rua General Osório”, argumenta em nota.

 

A RP Mobi pontua, ainda, que a desativação do ponto depende da construção de um terminal de ônibus urbano na Área Central, nas imediações das praças XV de Novembro e Carlos Gomes, capaz de proporcionar melhores condições de segurança e acomodação dos ônibus e seus usuários, permitindo, assim, “prescindir dos pontos de parada hoje existentes no entorno desses logradouros, a exemplo daquele regulamentado defronte ao Marp”, conclui o texto.

 

Não foi informada qualquer previsão sobre a viabilização de construção de um novo terminal.

 

O QUE É QUE O MARP TEM...

O Museu de Arte de Ribeirão Preto possui um acervo com mais de mil obras, a maioria realizada por artistas de Ribeirão Preto e região no período pós-guerras. As mais representativas foram reunidas por meio do tradicional Salão de Arte de Ribeirão Preto (SARP), realizado anualmente há mais de três décadas. O acervo possui núcleos significativos de obras dos chamados "cinco históricos" – os artistas plásticos que mais se destacaram em Ribeirão Preto durante as décadas de 1970 e 1980: Odilla Mestriner, Pedro Manuel-Gismondi, Francisco Amêndola, Bassano Vaccarini e Maurilima. Sua Biblioteca Leopoldo Lima, localizada no térreo, é especializada em história da arte e aberta à visitação pública. O museu também abriga a Biblioteca e Arquivo Pedro Manuel-Gismondi – acervo documental e bibliográfico com cerca de 3.000 volumes, entregue pela família de Manuel-Gismondi em regime de comodato.

 

DESDE 1999

Dotada de três abrigos, pavimento de concreto armado e acessibilidade facilitada a pedestres e cadeirantes por rampa de acesso e piso tátil, a estação de embarque e desembarque de usuários do transporte coletivo localizada em frente ao Marp é um dos 13 pontos de parada de ônibus criados no entorno do Terminal Carlos Gomes quando de sua desativação, em 1999. “Ela veio substituir abrigos lá existentes há mais de 25 anos e atende atualmente a 12 linhas regulares de ônibus, registrando, em dias úteis, média de 1.020 embarques”, informa a RP Mobi.

 

 


Lucas Nunes

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