Ribeirão Preto abandona patrimônios simbólicos da cidade
Em Ribeirão Preto, existem obras e empreendimentos que remetem ao passado em diferentes épocas da cidade

Ribeirão Preto abandona patrimônios simbólicos da cidade

Construções que remontam a história do município estão inutilizadas e em ruínas

Em Ribeirão Preto, existem obras e empreendimentos que remetem ao passado em diferentes épocas da cidade, principalmente em fases de grandes avanços econômicos da "Petit Paris" (pequena Paris), apelido dado pelas elites do tempo do café ao município, porém poucos ainda estão em pé e, desses poucos, menos ainda conservam a beleza que tiveram em seus tempos áureos.

Alguns se tornaram abrigo de moradores de rua e outros cenários de crimes macabros. De acordo com o professor José Antônio Lages, historiador e autor do livro "Ribeirão Preto Revisitada", a cidade nunca teve uma política pública de preservação. O estado atual desses prédios que resistiram ao tempo demonstra isso. "Sobre o patrimônio simbólico, pior ainda. Nem registro temos", diz Lages.

O Portal Revide selecionou cinco prédios que podem traçar diferentes períodos da história de Ribeirão Preto. Para Iole Almança de Morais, arquiteta e conselheira do Conselho de Defesa do Patrimônio Cultural de Ribeirão Preto (Conppac-RP), esses locais são importantes pois representam diferentes épocas e contextos históricos.

"As obras do passado passam a ser entendidas como representativas de um determinado tempo e lugar, como material histórico cujo valor está diretamente relacionado à sua capacidade de fornecer informações sobre o mundo que o produziu", comenta Iole.

Estação Barracão

A Estação Barracão de Ribeirão Preto ganhou este nome por causa de um grande barracão na frente do local onde os imigrantes eram entrevistados e apresentavam os documentos para os capatazes das fazendas da região. A estação está tombada desde 1982 pelo Condephaat e protegido pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (Conppac) desde 2009.

O local foi o que deu nome também a dois dos principais bairros de Ribeirão Preto. Barracão de cima e Barracão de baixo. Hoje, Ipiranga e Campos Elíseos, respectivamente. O galpão foi destruído em um incêndio na década de 20. Atualmente a Estação Barracão está trancada, com peças e móveis antigos de trem, a espera de um museu ferroviário.

De acordo com Iole, hoje o edifício está sem uso e já houve movimentações sobre possíveis novos usos para local. "Mesmo sendo de interesse público, nunca foi restaurado e não estão sendo estudados projetos de restauro", diz Iole.

Casarão Villa-Lobos

O Casarão Villa-Lobos é uma construção do final do século XIX e fica na Avenida Caramuru, no bairro República. De acordo Lages, no interior do casarão é possível ver belos exemplares da pintura da época do café. O prédio teve o tombamento decretado em 1988 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico (Condephaat).

Uma curiosidade do casarão, de acordo com Lages, é que ele tinha sido construído com a fachada voltada para o córrego Ribeirão Preto, de frente para estação provisória da Mogiana. "Com a expansão do caminho que levava a Bonfim Paulista, hoje a Avenida Caramuru, o casarão teve a posição mudada com uma frente 'postiça' voltada para a avenida", diz.

Segundo a edição 138 da Revista Revide, publicada em 1999, a casa é uma amostra arquitetônica do período de expansão do café na região. A família Villa-Lobos foi uma das primeiras a residirem no local, revelando o ideal estético da elite cafeeira.

"Já foi realizado um concurso para o projeto de restauro e requalificação da casa, que deveria ter se tornado um espaço cultural, porém pela alegação de insuficiência de recursos e falta de orçamento público, o projeto não foi executado", diz Iole.

Hotel Umuarama e Hotel Brasil

O Hotel Umuarama Recreio foi construído pelo imigrante grego João Constantino Miloná, após o sucesso de hotel com mesmo nome construído no centro de Ribeirão Preto, empreendido por Antônio Diederichsen. O hotel foi inaugurado em 1962 e os primeiros hóspedes foram professores estrangeiros contratados pela Universidade de São Paulo (USP). O hotel teve as atividade encerradas em 1994 e está em processo de tombamento pelo Conppac.

O Hotel Brasil começou a ser pensado em 1921. Por ele, passaram muitos estadistas, membros de associações internacionais e foi estadia para os clubes de futebol Boca Juniors e River Plate. De acordo com Iole, ambos os prédios estão sem uso e não há nenhum estudo de restauro.

Cianê, Indústrias de Fiação e Tecelagem Matarazzo

Em 1945, a empresa Matarazzo adquiriu um terreno com aproximadamente 151 mil metros quadrados no bairro Barracão (atual Campos Elísios) para instalação de um grande complexo industrial. Sua instalação na cidade causou grande impacto na economia local, tanto no aspecto de geração de emprego, como na diversificação econômica. Também sem nenhum plano de restauro ou reutilização, as tentativas de reavivar o local foram todas fracassadas.

Palacete Albino de Camargo Neto

Este exemplifica o que foi dito por Lages. Há um único registro de reconstrução em 1902. Após esta data, não existe nenhum outro projeto ou planta no arquivo público de Ribeirão Preto. O prédio está em ruínas e a Prefeitura já foi penalizada pelo Ministério Público, segundo Iole. "Foi considerado que a Prefeitura Municipal seria a corresponsável pelo abandono e perda de parte desse patrimônio de interesse artístico e cultural", diz.

"O destino que esses edifícios poderiam ter é a restauração das obras e adaptação para o uso na contemporaneidade, a fim de considerá-lo um patrimônio 'vivo', ou seja, ainda em uso", comenta Iole. Para ela, a especulação, já que esses prédios ficam em áreas cobiçadas pelo mercado imobiliário, faz com que os proprietários não se interessem nas restaurações.

Além disso, também faltam iniciativas do poder público. Iole acredita que Ribeirão Preto deveria incluir a tutela desses bens históricos no planejamento urbano. "Existem instrumentos e recursos previstos em lei federal, que garante a preferência de compra dessas edificações pelo poder público, com finalidade específica de preservação urbana", diz. "Tais edificações são de interesse comum da memória da cidade de Ribeirão Preto e deveriam ser acessíveis ao uso de seus habitantes", conclui.


Fotos: Amanda Bueno e Julio Sian

Compartilhar: