
Ribeirão Preto e região na rota do Audiovisual
Cidade, que criou sua Film Commission antes do Estado e do Governo Federal, foi citada no Festival de Cannes como potencial locação para produções cinematográficas
O que Ribeirão Preto tem a ver com a cidade de Cannes, ao sul da Riviera Francesa? A resposta é um dos festivais de cinema mais respeitados do mundo, que costuma ser um termômetro do sucesso que uma produção terá a partir da participação em sua mostra oficial. Pois foi na abertura de um dia de exibições de sua 78ª edição – ocorrendo de 13 a 24 de maio – que o Festival de Cannes citou Ribeirão Preto e outras quatro cidades brasileiras como potenciais locações para futuras produções cinematográficas.
Tal ação integra o Plano de Desenvolvimento da Indústria do Audiovisual Paulista da São Paulo State Commission, criada recentemente para fomentar a indústria audiovisual no Estado e da qual a Film Commission (FC) da Região Metropolitana de Ribeirão Preto – existente há anos – tornou-se parceira.
Ainda sem nome em português para designá-las por aqui, as Film Commisions são organizações que oferecem e viabilizam locações e possibilidades para filmagens de produções cinematográficas em uma cidade, estado ou país, para fomentar a economia local (leia mais a respeito em box ao lado). “Elas são os primeiros passos para o desenvolvimento organizado e sustentável do audiovisual em uma região”, explica o produtor cinematográfico Edgard Castro, envolvido com cinema há décadas sem nunca ter saído de Ribeirão Preto.
Ele comemora o fato de o audiovisual estar sendo reconhecido pelos governos brasileiros como um negócio de grande potencial. Prova disso é que o Ministério da Cultura, em parceria com o Ministério do Turismo e a ApexBrasil (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos), também já iniciou estudos para a formação de uma "Film Commission Nacional". Já existe também um órgão reunindo todas as FCs criadas até o momento no país, a Rebrafic (Rede Brasileira de Film Commissions).
Edgard acredita que a premiação da produção brasileira "Ainda Estou Aqui" com o Oscar de Melhor Filmes Estrangeiro, este ano, despertou a atenção do governo e das áreas do negócio cinematográfico para a qualidade do cinema nacional e a sua enorme oportunidade no mercado internacional. “No mundo inteiro o cinema é um grande negócio. Não só pelo entretenimento, turismo e visibilidade que propicia, mas principalmente por ser não poluente, gerador de renda, de empregos qualificados, impostos e de difusão da nacionalidade”, afirma.
Já o local onde um filme é produzido (locação), explica o produtor, atrai um novo segmento do turismo chamado "set-jetting", formado pela exploração de destinos mostrados em obras audiovisuais. “No Brasil, o exemplo mais recente é a casa onde foi rodado o filme ‘Ainda Estou Aqui’, que virou atração turística [na cidade do Rio de Janeiro]”, diz.
Edgard lembra que, no Brasil, o cinema também pode contar com incentivos fiscais do Governo Federal, via leis Rouanet e do Audiovisual; e do Estado, via ProAc (programa de Ação Cultural) e outros editais de apoio à atividade – todos dedutíveis do Imposto de Renda. Nos municípios, o incentivo vem das Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc.
“São os primeiros passos para o desenvolvimento organizado e sustentável do audiovisual em uma região”, explica Edgard Castro
Nossa Film Commission
Na Região Metropolitana de Ribeirão Preto, a Film Commission está organizada e é operada dentro do IPCIC (Instituto Paulista de Cidades, Identidades Culturais), com adesão dos 34 municípios da RMRP e apoios do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) e da Secretaria Municipal de Cultura, além da recém-criada São Paulo State Film Commission. Estruturada legalmente, tem registro na Ancine (Agência Nacional de Cinema).
O projeto da FC para o desenvolvimento de um Polo de Produção Audiovisual previa a necessidade de um diagnóstico das reais possibilidades de implemento da atividade audiovisual na região, o que foi viabilizado pelo IPCCIC. O instituto realizou levantamento de potenciais locações cinematográficas na RMRP e dos diferenciais competitivos de cada uma de suas 34 cidades. Também foi feita escuta sobre o conteúdo histórico de cada cidade e de suas potencialidades de Economia Criativa. As informações levantadas foram reunidas em um registro videográfico e hoje alimentam também um banco de imagens das múltiplas locações existentes na região. O trabalho ainda deu origem a uma série de curtas documentários – um sobre cada cidade – sob o título "Ligados pela História", que foi ao ar pelo SBT, em 2023.
“Esse levantamento permitiu um contato articulado com os prefeitos desses municípios, a apresentação do projeto, suas adesões e o início dos trabalhos que nortearam a criação de uma Film Commission”, afirma Edgard Castro. Segundo ele, outro estudo na cidade de Ribeirão Preto indicou que ela deveria ser a base de apoio à produção audiovisual dos demais municípios, por sua infraestrutura técnica e cultural, sua localização estratégica, suas facilidades de acesso, hospedagem, alimentação, serviços e, principalmente por esses municípios estarem ligados à cidade por rodovias em boas condições e distantes a poucos quilômetros.
De acordo com o produtor, a FC já iniciou uma aproximação dos prefeitos e as Secretarias de Cultura desses municípios com os órgãos da área no Estado de São Paulo e no Governo Federal. Também estabeleceu parcerias com organizações que desenvolvem projetos específicos para o audiovisual, como o Sebrae e o Sesc (Serviço Social do Comércio), que criou cursos técnicos e de especialização para os alunos das escolas de cinema da cidade (Mauá e Senac), cadastrou e catalogou produtoras locais, profissionais de audiovisual, empresas de serviços e equipamentos para a formação de uma rede de apoio ao setor na região.
Os próximos passos, segundo Edgard Castro, será a realização de um Festival de Curtas Metragens no final deste ano, aberto para todo o interior do estado de São Paulo, mas prestigiando, principalmente, os 34 municípios da região metropolitana. “Nós estamos levantando os nomes de todos os interessados em cinema, porque hoje, com o cinema digital, todos são potenciais financiadores”, entusiasma-se.
Cinema no DNA
Para Edgard Castro, a Região Metropolitana de Ribeirão Preto tem os ingredientes necessários para se tornar um "Hub do Audiovisual": alta taxa de luminosidade natural (Sol), localização estratégica em relação ao eixo Rio/ São Paulo/Brasília, completa infraestrutura cultural, rodovias em bom estado, rede hoteleira, aeroporto internacional e segmentos da economia com potencial para serem apoiadores culturais, como o agronegócio e o setor sucroenergético. Além disso, há os cenários naturais, com rios, cachoeiras, cavernas, entre outras locações atrativas às produções audiovisuais. Edgard cita ainda cursos técnicos de cinema e a proximidade com a UFScar, que oferece graduação em “Imagem e Som”.
Isso tudo sem falar no histórico significativo de produções, produtores cinematográficos e até atores de Ribeirão Preto e região. Entre eles, Lourenço Sant'Anna, um dos produtores executivos de “Ainda Estou Aqui”; Luiza Tubaldini, de “O Vendedor de Sonhos”; Fernando Coimbra (“O Lobo Atrás da Porta”); Fabiano Gullane, (seriado “Senna”), que é de São Simão; o ator Lino Facioli, que atuou em “Game of Thrones”; a atriz a Camila Queiroz; o roteirista Rubens Lucchetti; e o próprio Edgard Castro, que produziu “O Cortiço”.
O que são Film Comissions
Film Commissions (Comissão Fílmica, em tradução literal) são organizações que facilitam e incentivam a produção de filmes e outros projetos audiovisuais em uma determinada região, estado ou país. Sua origem, na década de 1940, nos Estados Unidos, está ligada à necessidade de produtoras locais obterem licenças e apoios para filmagens, mas, hoje, também prestam serviços de apoio aos produtores, promovem ações de fomento e capacitação de mão de obra local para produções audiovisuais.
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