Economistas debatem os principais desafios econômicos para Brasil em 2023

Economistas debatem os principais desafios econômicos para Brasil em 2023

Entre os desafios que o presidente eleito Lula terá que enfrentar, inflação e renda do brasileiro estão entre os mais urgentes

O presidente eleito Luís Inácio Lula da Silva (PT) precisará de um planejamento econômico sério, eficaz e realista. O que nem sempre agrada a população à curto prazo. Um dos primeiros desafios a serem enfrentados, e mais sentidos pela população é a alta dos preços.

 

A última edição do boletim Focus, divulgado pelo Banco Central, aponta uma inflação de 5,6% para o final de 2022. A meta de inflação para este ano, definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), é de 3,5% e será considerada cumprida se oscilar entre 2% e 5%. Os efeitos da alta dos preços, contudo, é sentido de maneira diferente em cada faixa de renda. Os mais pobres, que comprometem a maior parte da renda com consumo, tendem a sentir mais a inflação no orçamento familiar.

 

Já a taxa de desemprego recuou para 8,9% no último trimestre, mas o país bateu recorde de trabalhadores sem carteira assinada, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O Instituto considera uma pessoa desempregada aquela pessoa que não trabalha, mas que procurou emprego nos últimos 30 dias.  Nessa categoria são 9,7 milhões de brasileiros.

 

Por outro lado, o país soma 7,9 milhões de pessoas na força de trabalho potencial. São pessoas que poderiam trabalhar, mas não trabalham. Esse grupo inclui 4,3 milhões de desalentados, que desistiram de procurar emprego; e outras 3,6 milhões de pessoas que podem trabalhar, mas que não têm disponibilidade por algum motivo, como mulheres que deixam o emprego para cuidar os filhos.

 

Além dos indicadores básicos da econômica, Lula deverá tomar decisões que dividem opiniões. Uma delas é a política de preços da Petrobrás. Tanto o petista quanto Jair Bolsonaro (PL) já teceram críticas à política de Preço de Paridade Internacional (PPI) da Petrobrás.

 

O sistema de precificação toma como base os custos de importação, o que inclui taxas portuárias, transporte e o valor do dólar como referências para o cálculo do combustível. O valor dos combustíveis afeta toda a cadeia produtiva, alterações nesse indicador impactam diretamente na inflação e no poder de compra da população.

 

Outra política econômica que deverá ser revista é a do teto de gastos. Assim como Bolsonaro, Lula também indicou que deseja permitir o crescimento das despesas acima da inflação, o que hoje é proibido. Aprovado em 2016 no governo do ex-presidente Michel Temer, o teto de gastos estabelece um limite nas despesas públicas pelos próximos 20 anos. O orçamento do ano seguinte deverá tomar como base o orçamento corrente, corrigido apenas pela inflação, ou seja, sem aumento real. 

 

Para debater esses e outros desafios econômicos para o próximo presidente, a Revide ouviu cinco economistas de Ribeirão Preto. A pergunta foi a mesma: Na sua opinião, quais serão os maiores gargalos da economia do País em 2023?

 

 

FÁBIO AGUSTO REIS GOMES

Diretor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da USP

 

“Ainda estamos enfrentando um cenário pós-pandemia e o cenário internacional ainda gera preocupações, principalmente a questão da guerra na Ucrânia. Sendo assim, o cenário econômico de curto prazo será desafiador para o próximo mandato presidencial, pois a população brasileira ainda enfrenta um nível de endividamento elevado, uma taxa de juros elevada e uma certa vulnerabilidade social.

 

O país precisa implementar reformas econômicas urgentes e, ao mesmo tempo, garantir um colchão de proteção social para os mais vulneráveis. Além disso, administrar bem as políticas fiscal e monetária é fundamental. Se os sinais de arrefecimento da inflação se confirmarem, haverá espaço para quedas na taxa de juros, o que contribui para a equalização da dívida. Uma solução positiva do conflito na Ucrânia também abrirá espaço para quedas importantes nos preços de commodities. E no longo prazo, não há dúvida de que o controle da inflação e a boa coordenação das políticas monetária e fiscal são pontos essenciais, inclusive para permitir uma queda na taxa de juros.

 

Mas o crescimento de longo prazo depende de termos ampliação do capital físico, o que envolve melhoria da infraestrutura do país, do capital humano, com a qualificação da mão de obra, e das regras do jogo, com instituições sólidas e reformas econômicas.  Infelizmente, o Brasil ainda não tem tradição em fazer planejamento de médio e longo prazos. Isso deve ser repensando no âmbito do executivo e do legislativo”.

 

 

ALBERTO BORGES MATHIAS

Economista, professor titular da FEA-RP e presidente do INEPAD Educação.

 

“Neste momento, fim de outubro de 2022, a economia brasileira apresenta condições excepcionalmente favoráveis. O setor público, como em raros momentos da história econômica brasileira, apresenta resultado primário, todas as receitas menos todas as despesas exceto juros, positivo, ou seja em condições de reduzir a carga tributária do país.

 

O gasto financeiro do governo é elevado, em razão de inúmeros erros das políticas econômicas passadas, sendo coberta por emissão de títulos públicos, mas a dívida pública perante o PIB é baixa para padrões internacionais de países desenvolvidos. Para 2023 teremos reajuste dos salários públicos, mas com possibilidade de manutenção do resultado primário.

 

O IPCA deve fechar este ano próximo a 6% ao ano, e em 2023 próximo a 5% ao ano. Assim, a inflação elevada é um problema resolvido. A taxa de câmbio deve manter-se próxima a R$ 5,20 por dólar em 2022 e 2023. Em razão das reservas elevadas do Brasil em dólar e ouro, o crescente saldo comercial e o crescente investimento estrangeiro no Brasil, é impossível termos uma crise cambial, exceto se medidas extremadas forem tomadas.

 

No mercado de trabalho temos aumento real de renda, redução de desemprego e falta de mão de obra, notadamente falta de capacitação para o trabalho, o que deve ser ocorrer por longos anos, em razão não da falta de investimento na educação, porque o investimento é elevado para padrões internacionais, mas pela fata de gestão e qualificação, este será um enorme desafio às organizações. Pelo exposto teremos aumento de demanda de comércio e serviços. Neste contexto a dificuldade estará na gestão das organizações, pois não mais terão elevadas inflações para passar ineficiências de gestão aos preços”,

 

CRHSTIAN GANZERT

Doutor em Administração pela USP, professor de Economia e Administração, empresário e consultor de empresas.

 

"Os maiores gargalos para a economia em 2023 são os juros altos, a baixa confiança nos instrumentos governamentais de distribuição sustentável de renda, manutenção de bons indicadores de performance econômica para estímulo ao consumo de base e a falta de infraestrutura de energia e transportes.

 

A Selic deverá se manter alta até que haja sinais de que a inflação não apresente mais a tendência de crescimento do primeiro semestre de 2022, mas isso somente deverá acontecer com o aumento da produção, que por sua vez ocorrerá com aumento da propensão ao investimento direto. Os juros altos impedem não somente o consumo como também canalizam parte dos investimentos produtivos para o mercado financeiro, pois esses tendem a apresentar melhores ganhos e menores riscos do que os mercados de bens e serviços em tempos de crise.

 

Ainda que haja nos últimos meses uma equivocada percepção de retomada produtiva por conta da recente deflação propiciada por manobras governamentais para baixar o preço de combustíveis, entende-se que os subsídios por redução de tributação gerarão um efeito rebote nas contas dos Estados e União, o que gerará a necessidade de expansão das alíquotas para manutenção do equilíbrio orçamentário sem romper o teto de gastos. 

 

Diante do exposto, é impossível caracterizar um cenário econômico positivo para o próximo ano sem contar com o desdobramento político do novo Governo, bem como as medidas dali derivadas para melhoria das expectativas dos investidores a respeito de melhores condições para produção e consumo, em uma economia que não tende a se recuperar sozinha sem a ação direta do Governo. Bancando-se condições de oferta de bens e serviços para uma futura redução dos juros, isso permitirá, finalmente, a decolagem da economia brasileira”.

 

JOSÉ MELINI

Professor de economia do Centro Universitário Moura Lacerda e especialista em Relações Internacionais.

 

“Para 2023, entre os gargalos para a economia brasileira temos um cenário de grande incerteza em relação à muitos fatores. No cenário externo, a economia dos países desenvolvidos está desacelerando e a inflação está alta para os padrões históricos. Os bancos centrais dos EUA e Europa estão subindo a taxa de juros, o que tende a atrair capital para esses mercados e pode dificultar uma caída o dólar, além de aprofundar a fraqueza dessas economias.

 

A economia dos países desenvolvidos mais fraca também impacta o mercado consumidor para produtos brasileiros. A China, o maior comprador de bens brasileiros, também cresce menos do que crescia antes, apesar de ainda crescer a taxas robustas (acima de 4%). A guerra na Ucrânia gera incerteza sobre o comportamento do preço de matérias primas e alimentos e também sobre o abastecimento e o custo da energia, sobretudo na Europa.

 

Temos as incertezas domésticas também, como a associada ao processo eleitoral e a ainda indefinida agenda econômica do novo governo, as medidas de expansão do gasto público recentes e as promessas para o ano que vem, que envolvem, além da manutenção de alguns gastos, propostas de redução da tributação  (a correção da tabela do imposto de renda para pessoa física), restos a pagar, o investimento público em níveis baixíssimos, qual será a regra para a política de correção do salário mínimo e imprecisão quanto a evolução de preços-chaves, como combustíveis e botijão de gás. De acordo com esse cenário, a princípio os prognósticos para o investimento não são muito positivos.

Em 2023, segundo a opinião mediana do mercado financeiro captado pelo Boletim Focus do Banco Central do Brasil em 21/10/2022, a economia brasileira deve crescer 0,63%. O FMI é um pouco mais otimista, esperando crescimento de 1,034% no relatório do mesmo mês. Esses dados podem (e devem) ser revistos nos próximos meses.

 

Entretanto, esses números representam uma desaceleração considerável em relação ao esperado para 2022 (crescimento de 2,8%) e é bem abaixo do esperado para a economia global, que deve crescer acima de 3% no ano que vem, com o Brasil repetindo mais uma vez um resultado ruim, algo recorrente nos últimos anos. O baixo crescimento torna difícil a economia crescer gerando emprego em quantidade e qualidade (formalizado e com salários mais altos).

Por outro lado, a inflação está caindo e pode fechar 2023 abaixo de 5%, após ter ficado por onze meses consecutivos acima de 10% (entre setembro de 2021 e julho de 2022). Apesar disso, mesmo fechando 2023 abaixo de 5%, a inflação provavelmente ainda estará acima do centro da meta estabelecida pelo Banco Central, de 3,25%.”.

 

ANTÔNIO VICENTE GOLFETO

Diretor do Instituto de Economia Maurílio Biagi da ACIRP.

 

O primeiro grande desafio econômico do Brasil hoje é a dívida pública muito alta, projetada em cerca de 78% do PIB de 2022. Segundo boletins macrofiscais emitidos pela Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, a dívida pública tem crescido a taxas mais rápidas que o PIB.  Não é nem culpa dos políticos, mas da pandemia que desorganizou a economia do mundo.

 

Se a gente consome mais do que produz, a sociedade se endivida. Precisamos inverter. O outro gargalo é o desemprego, mas está diminuindo. Ademais, segundo dados do Banco Central do Brasil, verifica-se uma queda nas reservas internacionais brasileiras, a qual saiu de um patamar de US$390 milhões em janeiro de 2020 para US$362 milhões em janeiro de 2022. Apesar de ainda ser uma reserva confortável, esse é o menor valor registrado desde 2011. Tal queda pode ter sido influenciada pela elevação da taxa de juros nos Estados Unidos.

 

De todo modo, para vislumbrar 2023 e os próximos quatro anos, precisamos de menos adjetivos e mais substantivos, de substância. Tem fundamento melhorar o salário mínimo e a distribuição de renda, mas sem produtividade não se consegue fazer nada pelo social. É preciso um plano sustentável. Temos dois candidatos que podem ser grandes estadistas, mas para serem chefes de Estado à altura do que a sociedade precisa, é preciso apresentar claramente o Plano de Governo. Muitas vezes deixam de dizer o que pensam em fazer porque podem perder votos. A política precisa deixar de ser a arte de usar a palavra para esconder o pensamento”.

 

Leia mais:
Bolsa Família de R$ 600 exigirá carteira de vacinação de crianças


Foto: Divulgação PT

Compartilhar: