Para especialistas, potencial de Ribeirão Preto para eventos é inegável, mas falta ação coordenada

Para especialistas, potencial de Ribeirão Preto para eventos é inegável, mas falta ação coordenada

A economia local é turbinada nos meses de maio e junho por grandes eventos já consolidados; porém, ainda há espaço para o crescimento do turismo na cidade

Agrishow, Ribeirão Rodeo Music e João Rock são três grandes eventos no calendário de atrações em Ribeirão Preto. Juntos, atraem enorme público e incrementam a economia local. Faltam, no entanto, estudos e análises que apontem com precisão esse impacto turístico para a cidade e possibilitem o direcionamento de ações para sua potencialização. “Temos uma rede hoteleira que depende desses eventos, que acabam servindo de vitrine para a cidade e região. Eles trazem visitantes, que ajudam a movimentar a rede de turismo, sobretudo a rede hoteleira. Também são importantes para bares, restaurantes e comércio. Acho que o primeiro passo é manter o que já temos”, aponta Luciano Nakabashi, professor da Faculdade de Economia e Administração de Ribeirão Preto - FEARP/USP.

 

Na Secretaria Municipal da Cultura e Turismo (SMCT), as informações disponíveis restringem-se à Agrishow. Em nota, a secretaria afirma que o impacto econômico direto do púbico é de R$ 192,5 milhões, indireto (efeito multiplicador), de R$ 139,4 milhões, sendo o total movimentado pelo público de R$ 331,9 milhões. A partir de dados de 2024, a secretaria traça o perfil do visitante deste evento, voltado ao setor do agronegócio, predominantemente masculino (67,1%), com ensino superior completo (66%), idade média de 44 anos e renda média de R$ 12.500 mensais.

 

De acordo com a SMCT, há uma alta procura por hospedagem durante o evento, pressionando o setor hoteleiro — mesmo 63,9% dos visitantes fazendo visita “bate e volta” à Agrishow. Entre os turistas hospedados, 19,2% ficam em hotéis/flats, 7,7% usam Airbnb ou similares, outros se utilizam de imóveis alugados, casa de amigos ou parentes. A ocupação hoteleira durante a Agrishow beneficia, inclusive, estabelecimentos das cidades do entorno. Há intensa movimentação também no segmento de locação de imóveis, específica para a temporada Agrishow e Ribeirão Rodeo Music, outro grande evento que acontece no mesmo período.

 

“Ribeirão Preto tem um potencial turístico indiscutível. Esta gestão está trabalhando para ampliar a força do turismo local e regional, melhorar a economia, valorizar ainda mais a cultura ocal e ampliar a visibilidade do nosso município para todo o país. Estamos aqui para fazer história e tornar Ribeirão uma referência turística”, afirma Maria Eugênia Biffi, atual secretária de Turismo.

 

Marcio Santiago, vice-presidente do Ribeirão Preto Convention & Visitors Bureau e presidente do Brasil C&VB diz que a cidade se ressente de uma política pública permanente. “Os recursos públicos carreados para a Secretária de Turismo são insuficientes e comprometem a representação mais assertiva. Vide o estado de penúria, de décadas, que vive o Parque Permanente de Exposições. Se o tivéssemos em sua plenitude, poderíamos captar mais eventos corporativos”, afirma.

 

Segundo ele, Ribeirão Preto tem tudo para ser um grande centro de eventos e se consolidar na rota dos grandes eventos nacionais e internacionais. “Há mais de 25 anos o RPC&VB promove, capta e representa institucionalmente os equipamentos e serviços turísticos da cidade e sabe que “vender” o destino não é tarefa difícil. Fez isso com a Stock Car, Agrishow e com a seleção francesa. Conseguiu também, junto ao Ministério do Turismo, o título de Cidade Referência em Turismo de Negócios e Eventos”, enfatiza.

 

AGRISHOW FORTE ALIADA DA CIDADE

 

A organização da Agrishow 2025 — principal vitrine de lançamentos e palco das tendências e tecnologias do agronegócio —, estima um público de 195 mil visitantes do Brasil e do exterior. O evento chegou à sua 30ª edição com expectativa de movimentar R$ 15 bilhões em negócios, cerca de 10% acima dos R$ 10,5 bilhões do ano passado. Segundo a organização, o gasto médio, por pessoa, é estimado em R$ 1.100, alavancando principalmente os setores de Hotéis, Restaurantes e Bares e o Comércio Varejista.

 

CIRCUITO PARALELO

 

Eventos corporativos paralelos à Agrishow — conectados à feira —, ganham força durante sua realização, ajudando a movimentar a economia de Ribeirão Preto e apontando uma direção para a potencialização desses grandes eventos no calendário da cidade. Isso porque muitas das 800 marcas expositoras, bem como empresas diversas que atuam junto ao setor, aproveitam o grande público qualificado do agro para promover e estreitar relacionamentos comerciais e institucionais, ou até mesmo trocar experiências e conhecimento.

 

A demanda no período da Agrishow é tão alta que na tradicional Choperia Pinguim, por exemplo, o espaço de eventos começou a ser procurado há cerca de um ano. “Além da preparação para receber um grande público na choperia tradicional, também nos estruturamos, com bastante antecedência, para atender esta importante demanda corporativa. Somos uma marca tão famosa quanto a própria cidade e nosso amplo espaço de eventos, no primeiro andar do prédio histórico, no centro de Ribeirão Preto, é bastante procurado”, conta Paulo Ferreira, diretor da Choperia Pinguim

 

Segundo ele, a procura é tamanha que, ao saberem que o espaço de eventos já estava reservado, as empresas optaram por contratar o serviço Pinguim Fest para levar a tradição da marca a outros locais. Para ser ter uma ideia, 10 dos 13 eventos Pinguim Fest contratados no período da Agrishow foram voltados ao agro. Em apenas uma dessas ações, o cliente reuniu cerca de dois mil convidados, ao longo de cinco eventos realizados durante a última semana.

 

Outro aspecto destacado por Ferreira, é a qualidade e a grande variedade oferecidas pelo circuito gastronômico de Ribeirão Preto. “No Pinguim, por exemplo, vamos além do famoso chopp, carro-chefe da casa. Trabalhamos com um cardápio bem estruturado e de alto nível, que permite experimentações, harmonizações e momentos exclusivos. São diversas possibilidades que valorizam a passagem do cliente. Isso faz muita diferença”, completa.

 

FORTE VOCAÇÃO

"O potencial de Ribeirão Preto é imenso, especialmente no turismo de negócios! A cidade desenvolveu essa forte vocação para grandes eventos, que atraem centenas de milhares de pessoas, ano após ano. Esse público flutuante movimenta os setores de Comércio, Serviços e Turismo, dentro de um ecossistema que impulsiona a economia da cidade e da região. São mais recursos que circulam e ficam por aqui, gerando ainda mais investimentos e empregos. Nossa visão desse mercado de grandes eventos é sempre sistêmica e integrada. Procuramos enxergar todas as oportunidades que possam ser geradas a partir dessa atividade que é tão efervescente e que movimenta tantos segmentos produtivos. Um complementa e alavanca o outro, fazendo a roda da economia girar. Há muitas conexões possíveis e precisamos estimulá-las e aproveitá-las da melhor maneira possível" - Paulo César Garcia Lopes, presidente o SINCOVARP (Sindicato do Comércio Varejista de Ribeirão Preto e mais 43 cidades da região) e da CDL Ribeirão Preto (Câmara de Dirigentes Lojistas)

 

NÚMEROS E PROJEÇÕES

 

O Centro de Pesquisas do Varejo (CPV), mantido por SINCOVARP (Sindicato do Comércio Varejista) e CDL RP (Câmara de Dirigentes Lojistas), mapeou a realização de pelo menos 50 eventos voltados ao agronegócio e paralelos à Feira. “Essas ativações acabam fomentando a geração de empregos temporários e renda. Além disso, ajudam a movimentar segmentos como os de comunicação visual, locação de equipamentos audiovisuais, buffets, decoração de festas, estacionamentos particulares e serviços de organização de eventos”, analisa Diego Galli Alberto, economista e coordenador do CPV.

 

Segundo o presidente da Abrasel Alta Mogiana, Renato Munhoz, grandes eventos como Agrishow, Ribeirão Rodeo Music e João Rock têm efeitos distintos no setor de alimentação fora do lar. A Agrishow, por exemplo, gera um impacto mais expressivo nos bares e restaurantes da cidade e da região. “Em 2024, registramos um crescimento médio de 25% no movimento durante os dias da feira, com pico especialmente no período noturno durante a semana. Para este ano acreditamos em um aumento de até 30% no fluxo de clientes, principalmente em estabelecimentos com perfil alinhado ao público da feira, como restaurantes tradicionais, churrascarias e bares de grande visibilidade”, afirma.

 

Já os eventos musicais, como o Ribeirão Rodeo Music e o João Rock, também contribuem para o setor, mas de forma mais concentrada. Parte do público vem exclusivamente para os shows, passa a noite na cidade e retorna no dia seguinte. Esses visitantes, ao buscarem opções gastronômicas antes ou depois dos eventos, beneficiam estabelecimentos do centro e proximidades das festas. Nestes casos, o impacto é mais pontual, já que muitos moradores de Ribeirão Preto vão direto para os eventos, sem consumir fora deles. Apesar disso, de forma geral, eventos de grande porte geram um aumento expressivo no movimento do setor de alimentação fora do lar, em especial bares e restaurantes, mesmo que aglutinado em certos pontos da cidade, segundo constata a Abrasel Alta Mogiana.

 

RRM: FORÇA CULTURAL DO INTERIOR

 

Realizado este ano nos dias 26 e 30 de abril e 2 e 3 de maio, no Parque Permanente de Exposições, o Ribeirão Rodeo Music foi idealizado por Matheus Calil, junto com outros empresários da cidade, e desde a primeira edição, em 2005, o evento cresceu e se atualizou. Atualmente, são 120 mil metros quadrados de estrutura montada. O palco conta com 70 metros de comprimento de frente e 22 metros de altura, sendo mais de 800 metros quadrados de painéis de alta definição de LEDs. O evento possui quatro setores para o público: Arena; camarotes Black Lounge Ballantine’s (não open e VIP) e Brahma; Front Stage, além do Espaço Raiz, dedicado a enaltecer a cultura, a música e a tradição sertanejas, onde é realizada a tradicional Queima do Alho. Provas esportivas de montaria em touros, Três Tambores, Team Penning e Ranch Sorting reúnem competidores em busca das premiações.

 

Com estimativa de receber um público de 160 mil pessoas, nos quatro dias de festival, a organização do Ribeirão Rodeo Music calcula gerar mais de dois mil empregos diretos e indiretos. “O Ribeirão Rodeo Music chega à sua 19ª edição neste ano e estamos muito orgulhosos da trajetória que trilhamos. Queremos unir o moderno com o tradicional e gerar uma experiência inesquecível ao nosso público. Em 2026, teremos a edição especial de 20 anos do RRM com muitas novidades”, afirma Matheus Calil, um dos organizadores do evento.

 

JOÃO ROCK: IMPACTO TAMBÉM SOCIAL

 

Com público esperado de mais de 60 mil pessoas na edição 2025, segundo a organização, o João Rock deve gerar mais de 5 mil empregos diretos, incluindo o período pré, durante e pós (desmontagem) evento. “80% do público vem de fora, intensificando o fluxo em estradas, shoppings, restaurantes, bares e hotéis da cidade”, afirmam em nota. Além disso, através do ingresso solidário, que incentivou a doação de alimentos mediante desconto no valor do convite, o evento arrecadou 27 toneladas de alimentos que foram doados ao Fundo Social de Solidariedade de Ribeirão Preto, em 2024.

 

Com quatro palcos montados, recebendo distintas apresentações, o festival musical tem mais de 20 anos de história. “O evento, hoje, já está consolidado como um espaço para diferentes manifestações artísticas, incluindo ações interativas com o público, presença de grandes marcas, esportes radicais e diversas atrações imersivas”, afirma Luit Marques. “As apresentações do Palco Brasil vão proporcionar uma verdadeira viagem pela história da black music nacional, reunindo artistas lendários que mantêm esse legado vivo. A celebração da música negra reafirma a importância desse gênero para a música brasileira e para o João Rock”, enfatiza Marcelo Rocci.

 

IDEIAS NÃO FALTAM

 

Além destes grandes eventos, Luciano Nakabashi, professor da FEARP/USP, também ressalta a vocação de Ribeirão Preto para atender toda a região, inclusive cidades que são um pouco mais distantes, como referência de acesso a serviços, comércio, saúde e educação.

 

“Atendemos os municípios mais próximos, mas também cidades importantes como Franca, São Carlos e Araraquara. Os eventos que acontecem no estádio do Santa Cruz, no Ribeirão Shopping, etc., também ajudam nesse sentido e mostram o potencial de Ribeirão Preto. Acho importante que a cidade tenha uma agenda. E dá para pensar em outros eventos relevantes, que não coincidam com os mais importantes que já temos”, enfatiza. Os festivais, na sua opinião, são fortes candidatos a preencher o calendário, principalmente no se gundo semestre. “Alguns municípios acabam atraindo um grande público em determinados períodos, através de festivais, como Gramado e Paraty, por exemplo. Nosso Carnaval vem ganhando força e também pode ser mais explorado, visto que o próprio estado de São Paulo vem ganhando participação nesse período. Além disso, temos a rota da cerveja, que é importante e pode ser mais explorada. Podemos pensar em atrair mais público pela gastronomia do interior, como queijos, café e vinho. Ter uma agenda de eventos importantes, incluindo alguns festivais, que podem também estar associados à gastronomia. Explorar um pouco mais o ecoturismo, como forma de atração de turistas, é outra opção”, avalia o professor.

 

Na opinião de Luciano, os investimentos que estão ocorrendo no aeroporto são importantes, pois acabam servindo à entrada de visitantes, além de atrair pessoas da região que usam o aeroporto. Ele sugere investimentos em parques que já existem e a criação de outros, para ajudar a manter o público mais alguns dias na cidade, e acrescenta: “Ribeirão Preto vem aproveitando parte do seu potencial, mas ainda há muito espaço. Precisamos prezar também pela segurança, que é fundamental em um município que tenta atrair visitantes. Isso depende da polícia estadual e municipal e, talvez até mais importante, de políticas de suporte (auxílio e capacitação) à população mais vulnerável, para redução da pobreza”, aponta.

 

Há quem diga que o turismo pode ser a principal fonte de receitas de um país. Dados do Banco Central (BACEN) mostram que, no primeiro trimestre de 2025, o Brasil arrecadou mais de U$2.4 bilhões em receitas, superando a exportação de algodão e aves. Cerca de 16% a mais, se comparado ao mesmo período do ano passado. Em 2024, faturou R$ 207 bilhões. Márcio Santiago, do RPC&VB, aponta que, atualmente, no Brasil, o Turismo representa em torno de 8% do PIB e pode chegar a 14%, desde que, adotadas as políticas adequadas. “Esse percentual, superaria o PIB do agronegócio. Tudo isso sem contraindicação, pois o segmento é proativo e distribuidor de rendas. Sem mencionar o potencial social na geração direta e indireta de empregos”, comenta. Segundo ele, destinos que já enxergaram o potencial do turismo estão muito a frente. Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo, por exemplo, já identificaram isso e promovem os destinos em feiras e eventos nacionais e internacionais.


Fotos: Digital Eventos e Divulgação/Agrishow

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