Ensino pós-pandemia

Ensino pós-pandemia

Pandemia mudou a maneira como as crianças e adolescentes se relacionam com a escola. Elaine Assolini, especialista em Educação, aponta os acertos e pontos a serem aprimorados na formação dos jovens

Terminado o primeiro semestre de 2022, educadores e pais podem fazer um balanço de como foi a readaptação das crianças e adolescentes ao ambiente escolar. Após dois anos distantes das salas de aula, a dinâmica entre estudantes e professores mudou. A evasão escolar e o uso obrigatório de plataformas digitais para acompanhar as aulas transformaram as relações de ensino no país.

 

Para preparar os pais para as férias, e os professores para o segundo semestre, a professora Elaine Assolini fala sobre os principais desafios na educação pós-pandêmica. Elaine atua há mais de duas décadas anos no magistério, com vivência nos ensinos fundamental, médio e superior. Atualmente, é professora na graduação e pós-graduação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, da Universidade de São Paulo (FFCLRP-USP).

 

Diversos estudos apontam uma defasagem na educação, principalmente nos anos iniciais, causada pela pandemia. Quais são os efeitos mais visíveis dessa defasagem?

Sobretudo, a pandemia afetou os mais pobres. As crianças de baixa renda não tinha, e ainda não têm recursos próprios para acompanhar as aulas à distância. Muitas não possuem um notebook ou celular. Em alguns casos, a família só tem um celular. Quando a mãe sai para trabalhar, a criança não tem nenhum dispositivo para acompanhar as aulas. Já nas instituições privadas o cenário foi outro. Desde sempre correram atrás do prejuízo, enviando tarefas para casa, criando plataformas digitais e outras ferramentas. Além disso, algumas escolas particulares voltaram às aulas em outubro do ano passado. Enquanto que no Estado e na rede municipal, as aulas retornaram apenas em fevereiro deste ano.  


Além da defasagem no ensino, os professores também têm se queixado de que muitos alunos voltaram completamente distantes do cotidiano escolar. Elas não conseguem mais se adequar aos horários de entrada, intervalo e saída. Apresentam dificuldade em permanecer na sala por muito tempo. Algumas dessas crianças voltaram ansiosas, angustiadas e enlutadas. Assim como os adultos, as crianças também sofreram durante a pandemia. Esse primeiro semestre serviu para que as escolas retomassem essas questões básicas, como a rotina escolar. Percebemos que os prejuízos não foram somente no âmbito cognitivo, porque se fosse, bastaria mudar a metodologia de ensino. Os professores tem que lidar com desafios no âmbito emocional dos alunos.

 

E o que tem sido feito para minimizar esse prejuízo?

As escolas públicas têm se concentrado nas áreas de língua portuguesa e matemática, oferecendo aulas extras. A Prefeitura de Ribeirão Preto também está correndo atrás desse prejuízo, oferecendo atividades no contraturno e disponibilizando mais um professor por sala.  Além disso, o Estado buscou socorrer os professores, porque não só os alunos voltaram perdidos.  Sabemos que ainda não é o modelo ideal, mas já é alguma coisa. A criança ter esse contato regular com a escola novamente já ajuda


Vários estudos apontam que as escolas precisam trabalhar de maneira ininterrupta para reaver o tempo que as crianças passaram em casa. Os professores fizeram o que puderam de acordo com as condições de que eles dispunham.  As crianças que já tinham algum tipo de dificuldade de aprendizagem sofreram ainda mais.  E aquelas que estavam seguindo o ritmo normal de evolução também foram impactadas negativamente. Por isso, não devemos rotular os alunos, devemos oferecer oportunidades a todos e entender a realidade daquele estudante. O desafio da escola é muito grande. Elas não podem parar. Paralelamente a isso, as escolas devem oferecer formação didática e pedagógica para os professores. 

 

Aulas de reforço, aulas particulares e outras tentativas de compensar essa defasagem durante as férias podem ser uma solução?

Eu vejo como uma possibilidade. É lógico que não precisa ser 4h de aulas diárias. Mas as escolas que podem oferecer algo para os alunos nesse período de férias, vejo com bons olhos e tem resultados positivos. O clima é outro, o aluno não vai estar preocupado com prova, entrega de trabalhos e a rotina exigente das escolas.  É preciso destacar que tanto o processo quanto as atividades propriamente ditas precisam ser diferenciados. Não dá para repetir o que se faz em sala, precisa ser algo instigante. 


De que forma os pais podem ajudar no desenvolvimento escolar dos filhos durante as férias, mas sem tirar delas o direito ao descanso e ao lazer?

Podemos pensar em situações práticas. Um bate-papo que o pai tenha com o filho sobre uma temática. "Dinossauros", "o que levar na mochila para a escola", "amigos". O diálogo, a conversa, as situações interativas acrescentam demais. E algumas vezes, no dia a dia, os pais não tem oportunidade de vivenciarem situações interativas de qualidade com os filhos. Pode ser uma volta na praça, conversando e, mais importante, escutando a criança. 

 

Quais foram as principais competências que os professores precisaram desenvolver durante a pandemia?

Foram as competências e as habilidades ligadas às tecnologias digitais e de comunicação. Elas precisaram, e ainda precisam, ser aprendidas. O professor precisa aprender a lidar com elas, não tem como escapar. Outra competência que eu entendo que esse professor precisou desenvolver foi no sentido da avaliação. O aluno precisa ser avaliado ininterruptamente.  Avaliar os avanços e progressos, mas também as lacunas. O processo de avaliação é contínuo porque ele se retroalimenta. Também destacaria as competências e habilidades relacionadas aos seus saberes e fazeres pedagógicos.

 

Por fim, o professor precisa entender que ninguém passou ileso pela pandemia. A habilidade de perceber que as pessoas se transformam e que o mundo mudou com a pandemia é muito importante. Os professores voltaram da pandemia sabendo o quão importantes eles são.

 

Não foi uma vez que eu escutei: "preciso de um professor particular, não tenho paciência para ensinar". Muitas mães e muitos pais observaram os esforços que os professores fizeram para ministrar uma aula on-line. Ademais, as instituições, o Estado e as prefeituras devem dar muita atenção aos processos formativos do professor. O professor precisa mais do que nunca de formação continuada. A formação continuada é um dos pilares do desenvolvimento profissional do docente. 

 

Acredita que essas mudanças no ensino tornam ainda mais essenciais as metodologias ativas de ensino?

Já eram importantes e agora elas são fundamentais. Elas permitem aulas mais interessantes, aulas com muitas perguntas. Aulas que colocam o aluno em uma situação de ter que pensar. O aluno deixa de ser espectador, para ser alguém que constrói, critica e coloca a mão na massa. As metodologias ativas elas sempre vão colocar o estudante em uma situação central. É diferente do ensino tradicional, no qual o sujeito fica copiando. A mão está copiando, mas a cabeça está em outro lugar. As metodologias ativas chamam o aluno a participar. Apostar nas metodologias ativas tem sido uma boa alternativa. 


Foto: Acervo pessoal

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