Especialista comenta os prejuízos na formação das crianças durante o ensino remoto
Bell escreve o blog “Cotidiano em Foco" no Portal Revide

Especialista comenta os prejuízos na formação das crianças durante o ensino remoto

Em entrevista ao Portal Revide, a professora e escritora Gabriela Pujol Bell falou sobre educação e socialização de crianças e adolescentes

Para Gabriela Pujol Bell, desde a creche até a universidade, todos os estudantes sofreram com o ensino remoto. Em entrevista ao Portal Revide, Gabriela falou sobre a desigualdade social e a falta de políticas públicas na educação.  Além disso, ela comentou sobre a necessidade da interação no processo de alfabetização.

Gabriela é professora com licenciatura para as séries iniciais do ensino fundamental e pós-graduanda em neuropsicopedagogia pela Universidade Cândido Mendes.

Com 23 anos de experiência como professora, Gabriela começou a lecionar em aulas particulares. Além de desenvolver trabalhos voluntários, em parcerias com escolas públicas.  Inclusive, é na educação pública que ela faz sua caminhada como educadora. Atuou também como Coordenadora de Educação Integral e regente de turma, desde creche até classe de EJA. Atualmente, é professora na Prefeitura Municipal de Sertãozinho. Sua missão profissional é mediar a transformação de vidas e da sociedade. Tem formação como Palestrante pelo Instituto de Desenvolvimento Humano Edmar Oneda (IDHEO).

Ela escreve o blog “Cotidiano em Foco" no Portal Revide e traz análises críticas sobre educação e a vida em sociedade.

Confira a entrevista:

É possível mensurar os impactos que o período de aulas remotas terá na formação intelectual e técnica para o futuro?

GABRIELA: Como o ensino remoto ainda não deixou de acontecer totalmente e as aulas ainda acontecem à distância ou no formato híbrido, não é possível mensurar o impacto causado pela falta do ensino presencial a curto, médio e longo prazo na educação brasileira.

A senhora acredita que a desigualdade educacional entre o aluno do ensino público e privado aumentou? 

GABRIELA: É uma questão delicada de se responder, tendo em vista que o ensino remoto é uma modalidade que caiu de paraquedas para toda a esfera educacional e nenhum ser humano estava preparado para essa situação. Por isso, existe a possibilidade de pensar que um aluno de escola particular pode ser favorecido por condições econômicas melhores que lhe ajudem como, por exemplo, em relação ao acesso à internet de melhor qualidade para assistir às aulas. Mas isso não garante que o aluno particular tenha tido menos prejuízo, pois o seu desempenho e engajamento podem ter sido inferiores ou não em relação ao da escola pública, dependendo talvez da sua disposição física e emocional ou da ajuda que teve da família.

No entanto, a desigualdade social aumentou e está escancarada por conta da falta de política pública que não cumpriu o seu dever de casa dando aos alunos e suas famílias o acesso à rede de internet de qualidade para o acompanhamento das aulas remotas além de não ter oferecido suporte social e econômico nesse momento tão desafiador. A missão da educação pública é, há muito tempo, acolher um aluno de forma totalmente integral e, nesse contexto, não se pode tapar o sol com a peneira, deixando de admitir que, por exemplo, a refeição feita pelos alunos na escola pública é, para muitos, a única do dia.

Os alunos de ensino básico que estão na fase de alfabetização terão maiores prejuízos do que os que já tem formação?

GABRIELA: De modo geral, os prejuízos foram causados a todos os alunos desde a creche à universidade, pois além dos estudantes não estarem no ambiente socioeducacional construindo sua aprendizagem, a questão emocional provocada pela situação pandêmica gerou um estresse enorme que só cada um para dizer o que realmente sentiu e o quanto foi afetado. Dessa forma, a nível educacional, não há como generalizar.

Mas é possível sinalizar que a alfabetização, apesar de ter sido um desafio enorme, quase impossível, no ensino remoto, vai continuar acontecendo ao longo do processo nas aulas presenciais, sendo reforçada. Essa fase da aprendizagem é muito importante e necessita demais da interação entre a criança e o educador, pois a intervenção para construção da leitura e da escrita precisa acontecer em momentos como, por exemplo, segurar a mão de um aluno para ajudá-lo no traçado de uma letra. É uma fase mágica que pode acontecer em qualquer momento da vida de uma pessoa, tanto que existem muitas classes de EJA para jovens e adultos que não são alfabetizados e não sabem ler o mundo à sua volta.

"É preciso olhar para todos os alunos e suas famílias com interesse em perceber o que aconteceu com eles por conta da educação remota", aconselha Gabriela

Como a falta de convívio social escolar durante esse período afetou as crianças?

Resposta: O convívio social em ambiente educacional não aconteceu durante esse tempo e, realmente, afetou os alunos que deixaram de interagir com uma série de questões pelas quais elas passam, quando estão nas creches e escolas. A interação escolar entre aluno e professor proporciona a construção de conceitos baseado na troca de saberes. Além disso, a socialização favorece o viver de forma coletiva, pois a Educação acontece baseada em quatro pilares que são o aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser. Por isso, e como canta Balão Mágico, "a escola é a luz que ilumina o caminho da gente". Dessa forma, a falta de convívio social no ambiente escolar é extremamente prejudicial ao desenvolvimento de crianças, jovens e adultos.

Qual a opinião da senhora sobre a inclusão de mais aulas na grade diária ou a implantação do ensino em tempo integral como forma de reduzir os impactos do período sem aulas?

GABRIELA: É preciso cuidado para considerar essas possibilidades nesse momento, tendo em vista que cada rede de ensino tem sua jornada específica. Aumentar a grade não garante um aprendizado efetivo, pois tudo vai depender do planejamento e da qualidade do que é proposto. O que seria eficaz é uma oferta de reforço de conteúdo em horários no contra  turno. No caso do ensino integral, como está na pergunta, ela caberia como aumento de jornada e não como oferecer uma proposta de educação que, segundo a BNCC, tem como propósito a formação e o desenvolvimento global dos estudantes, compreendendo “a complexidade e a não linearidade desse desenvolvimento, rompendo com visões reducionistas que privilegiam ou a dimensão intelectual (cognitiva) ou a dimensão afetiva”.

Quais são as soluções para minimizar os prejuízos causado pelo ensino remoto? (O que pode ser feito agora em relação a um retorno ao ensino presencial?)

GABRIELA: A princípio, acolher, acolher e acolher. Não há como pensar numa educação pós Pandemia sem refletir na Pandemia em si. É preciso, em primeiro lugar, olhar para todos os alunos e suas famílias com interesse em realmente perceber o que aconteceu com eles por conta da educação remota. Mas um olhar de acolhimento e aceitação, sem pressa. Não há conteúdo que seja mais urgente nesse momento que transmitir a todos a mensagem do quão importante e bom será a construção de uma caminhada escolar nova. A escola precisa ser luz na vida da sociedade. Após o acolhimento com uma avaliação diagnóstica bem elaborada para observar como os alunos estão voltando, será possível traçar metas novas a curto, médio e longo prazo.

 

 


Foto: Pixabay/ Arquivo Pessoal

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