A febre do skate
Pablo Jardim – skatista amador e professor de skate na Switch

A febre do skate

Sucesso brasileiro nas olimpíadas aumentou o número de praticantes do skatismo e alavancou a venda de produtos relacionados a esse universo

Matéria publicada na edição 1102 da revista Revide.

É difícil andar por Ribeirão Preto e não encontrar alguém em cima de um skate. A popularidade do esporte ficou em evidência, principalmente, depois das Olimpíadas de Tóquio em 2021. Com três medalhas, o Brasil conquistou o status de potência mundial na modalidade. Ainda no clima das vitórias olímpicas, em outubro do ano passado, a Prefeitura de Ribeirão Preto inaugurou uma das maiores e mais completas pistas de skate do país, a RP Skate Park, localizada no Parque Maurilio Biagi.

O skatista Pablo Jardim, natural de Angra dos Reis, chegar a Ribeirão Preto poucos meses antes da inauguração da pista. Segundo ele, a pista agrega toda a comunidade. “A pista aqui é muito superior que a de Angra e todas as cidades da região. Muita gente que não estava nem ligando para o skate, ou nem conhecia, está olhando com outros olhos, porque sempre vai surgir alguém para representar a cidade”, relata.

Jardim comenta que, antigamente, o skate era muito “underground”, ou seja, longe dos holofotes da imprensa e, em certa medida, marginalizado. “Agora, como está na mídia, virou um esporte muito sociável, para todos. Sempre vivi em cima de um skate e quero continuar até meu corpo aguentar”, afirma o skatista, que pratica a modalidade desde os dez anos e participou de campeonatos regionais e estaduais em uma época que o esporte não era tão popular no país.

Já para o skatista Antônio Melo de Carvalho, de 21 anos, o skate é um estilo de vida e bem-estar. “Gosto de andar com os parceiros sem compromisso nenhum, apenas para me divertir e me superar em cada manobra”. Carvalho declara que a prática do skate em Ribeirão Preto mudou nos últimos meses. “Na nova pista do Maurílio Biagi sempre vejo muitas crianças começando, o que é bem diferente de outras pistas da cidade. Mas na rua a gente vê de tudo”, destaca Carvalho.

Antônio Melo e Vincíus Acosta Cordeiro

Economia local

A visibilidade do esporte e o surgimento de novos praticantes aumentou a procura por lojas especializadas em artigos de skate em Ribeirão Preto. Noel de Carvalho, empresário e proprietário da RockShop, loja que localizada no centro da cidade há quase três décadas, viu a oportunidade de abrir mais uma unidade na frente do Parque Maurílio Biagi após o anúncio da construção da pista. “Eu achei um ponto bem em frente ao parque. A antiga proprietária até disse que seguraria para mim até a inauguração da pista, mas eu não queria correr esse risco e já aluguei o local. Fiquei mais de um ano pagando aluguel com a loja fechada”, destaca.

A nova loja impulsionou os negócios de Noel e aumentou a gama de produtos ofertados. “Aquele ponto ficou legal para todo mundo. Além de aumentar as minhas vendas, fez com que a minha loja ficasse forte no cenário, porque como estou de frente para a pista muita gente visita a loja por necessidade”, comenta.

As vendas da RockShop aumentaram em 90% depois das Olimpíadas e da nova pista. “Atualmente, estou vendendo em torno de cinco skates montados por dia, tirando as peças separadas que também vendo na loja. Perto do Natal, a gente chegou a vender, pelo menos, 15 skates montados por dia”, detalha o empresário. Porém, mesmo com a evolução do cenário na cidade, o proprietário ainda é cauteloso em relação ao futuro. “Hoje eu estou muito feliz, o skate mudou a perspectiva da loja, agora eu sei exatamente o que comprar e como que está o mercado, mas espero que não seja uma coisa atípica e temporária”, conclui.

Já o gerente de uma das unidades da Switch Skate Shop, Vinicius Acosta Carneiro, diz que o crescimento maior foi em relação ao público infantil e feminino. “O público que estamos recebendo foi atraído pelas Olimpíadas, ou seja, muitas crianças e muitas meninas, que viram a Rayssa Leal ser medalhista. É um público totalmente diferente da nossa outra unidade, localizada no centro da cidade. Aqui temos um público majoritariamente iniciante”, explica.

A unidade da Switch localizada na avenida Presidente Vargas também possui uma miniramp – pequena rampa de madeira – que recebe aulas diariamente. “Recebemos em torno de três alunos por dia, se chegar qualquer pessoa e quiser andar está liberado, mas temos horários com alunos agendados”, conclui o gerente e também professor de skate.

A Switch, que existe desde 2002, também foi beneficiada pelo aquecimento do mercado no final do ano. “Muita criançada pediu skate de Natal. Antigamente, era bicicleta, bola de futebol e de outros esportes. Agora, já foi diferente, o skate deu um ‘boom’ na cidade”, comenta o vendedor Raphael Ribeiro, que também anda de skate e acompanha a evolução do esporte diariamente.

Outras pistas

Apesar de ser a mais badalada no momento, a pista do parque Biagi não é a única na cidade. Algumas pistas como a Switch Skate Park e a Bank Skate Spot também são conhecidas pelo público. A Bank Skate Spot, no bairro Jardim Manoel Penna, foi uma iniciativa de skatistas locais que resultou em prêmio internacional que reconhecia o engajamento de pessoas em projetos que estimulam o esporte. A pista foi uma idealização de Ulisses Vittori, com o apoio de alguns amigos. Ulisses, que há 21 anos anda de skate, relata que a criação da pista foi teve como foco o público iniciante e também para os adultos que gostam de praticar o esporte como forma de lazer.

Após as Olimpíadas, a pista passou a ser procurada por pais que queriam que seus filhos aprendessem o esporte. “Começou a aparecer muita criança. Os pais perguntavam se também era escolinha. Isso tirou um pouco do preconceito que tivemos quando estávamos construindo a pista”, explica.

Ulisses Vittori, idealizador e um dos criadores da pista Bank Skate Spot

Com isso, a média de idade do público que visita a pista diminuiu. “No início, era um pessoal mais velho, com uma média de 30 anos. Mas, hoje em dia anda, criança de cinco, seis anos até o pessoal de 40 anos está por aqui”, explica Vittori. Para ele, o skate de Ribeirão Preto ainda tem muito o que evoluir com a pista no Parque Maurilio Biagi. “Depois da criação da nova pista, o nível de praticantes e de atletas vai subir muito mais”, declara. Contudo, o skatista avalia que somente a pista não é o suficiente para tornar a cidade um polo do skate. “Olhando para o lado profissional, não podemos só ficar nessa pista do Biagi, esperando que apareça novas estrelas. Tem que ser um negócio de expansão, Ribeirão tem capacidade de ter mais pistas com essa qualidade”, conclui.

Outra pista conhecida na cidade é a Switch Skate Park, que tem o diferencial de estar instalada em um ambiente coberto. O professor e ex-skatista profissional Rui Muluque, vencedor do primeiro campeonato brasileiro de skate em 1989 e aplaudido por nomes importantes do skate como Tony Hawk e Steve Alba, relata que o esporte de hoje é bem diferente do da época. “Os anos 80 tinha aquela inflação louca, tudo era muito caro e o dinheiro muito desvalorizado, mas mesmo assim quem andava de skate era sempre a classe média, era bem difícil você ver pessoas de classe alta andando. Hoje já é diferente, o esporte atinge todas as classes”, recorda. 

A nova onda do skate na cidade fez com que um público mais velho voltasse a praticar o esporte. “Do mesmo jeito que o pessoal do escritório marca para jogar um futebol, tem amigos que marcam para andar de skate. A relação é outra, esse pessoal não é competitivo, só quer acertar as manobras que acertavam lá atrás. Com isso, surgiu um novo mercado que ainda não era explorado antes. Não é só o pessoal novo que está começando a andar”, disse Muleque.

O professor, que já disputou três campeonatos mundiais, luta pela valorização do skate na cidade desde os anos 90. “Venho batalhando por essa pista, desde quando chegar a Ribeirão. Conseguimos entrar com o projeto da miniramp do Parque Maurilio Biagi, entramos com o pedido em 1994, mas só saiu do papel em 2001 o que já foi uma vitória para a comunidade”, destaca. O município ainda conta com outras pistas criadas pela própria comunidade, como a Ribeirão Skate Point, na zona Norte, que realiza campeonatos amadores e iniciantes para todos que gostam do esporte. 

Noel Carvalho e Rui Muleque


Fotos: Luan Porto

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