Mãos à obra
Palácio Rio Branco deve ser desocupado nas próximas semanas e abrigar Secretaria da Cultura antes de obras de restauro

Mãos à obra

Patrimônio histórico de Ribeirão Preto, Palácio Rio Branco passará por restauro para ser transformado em centro cultural municipal; especialistas e comerciantes aprovam a medida

O busto do Barão do Rio Branco, no Centro de Ribeirão Preto, é testemunha das transformações da cidade: de potência cafeeira à capital do agronegócio brasileiro. A escultura, inclusive, presenciou a construção do Palácio Rio Branco, em 1917, prédio-símbolo do poder político municipal, que há 105 anos abriga a Prefeitura de Ribeirão Preto. Hoje, cerca de 40 prefeitos depois, o barão do Rio Branco quebrará uma tradição e não vai testemunhar a chegada de mais outro governante ribeirãopretano. O motivo: o Palácio Rio Branco vai deixar de ser a sede do Executivo até o início de agosto e deverá ser transformado em centro cultural e museu, bem como sede da Secretaria Municipal de Cultura.

 


Encomendado pelo então prefeito Joaquim Macedo Bittencourt ao engenheiro Antônio Soares Romeu, para que abrigasse os poderes Legislativo e Executivo de Ribeirão Preto, o Palácio Rio Branco atualmente concentra parte das decisões políticas sobre os rumos do município. No espaço de 1,8 mil metros quadrados e dois pavimentos, estão lotados o Gabinete do Prefeito, as secretarias de Governo, Casa Civil e Fazenda, a Assistência Técnico-Legislativa (ASTEL) e a Coordenadoria de Comunicação Social (CCS). Todas estas pastas estão de mudança nas próximas semanas para o novo Centro Administrativo José de Magalhães, localizado no antigo prédio da Caixa Econômica Federal, na Rua Américo Brasiliense. 

 


Segundo o Executivo, com a saída da sede administrativa para outro local, o Palácio passará a ter outra ocupação e função, com a instalação da Secretaria da Cultura no piso térreo. Já o andar superior será transformado no Museu da Administração Pública, equipamento histórico com o objetivo de preservar a memória secular do prédio. "Os últimos detalhes para a reforma do novo prédio onde será instalada a sede administrativa da prefeitura estão sendo finalizados. A mudança representará, também, uma melhoria no atendimento ao público, considerando a acessibilidade do prédio e as condições de trabalho dos servidores", afirma o prefeito Duarte Nogueira (PSDB).


Erguido entre 1915 e 1917, o eclético Palácio Rio Branco não representa apenas a sede do poder de Ribeirão Preto, mas uma visão de modernidade do município almejada pelos políticos e elite da época. O prédio, tombado desde 2015 pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (Conppac), passou por uma única reforma há 20 anos, quando foram trocados os madeiramentos, encanamento e rede elétrica. Hoje, o Palácio apresenta problemas estruturais, como infestação de cupins e infiltrações; pinturas originais também foram sobrepostas por novas camadas de tinta. São questões de deterioração a serem resolvidas durante o restauro, que deve durar 2 anos e meio e custar cerca de R$ 10 milhões, segundo a Cultura.

 


O projeto executivo de restauro do Palácio Rio Branco ainda está sendo elaborado pela Prefeitura, mas a curadoria do espaço já foi concluída pelo Instituto Paulista de Cidades Criativas e Identidades Culturais (IPCCIC). Segundo a historiadora e presidente da entidade, Lilian Rosa, a arquitetura e as pinturas do prédio devem ser preservadas durante o processo de reforma do Palácio, bem como devem ser catalogados e identificados os mobiliários existentes atualmente. “Por tudo isso, o Palácio caracteriza-se como o guardião de momentos de grande relevância para a história política da cidade, representados tanto no poder executivo como na participação da sociedade na vida política de Ribeirão. Qualquer mudança de uso no espaço, precisa garantir que esta história política seja preservada”, diz Lilian.

 

Dúvidas palacianas


Apesar de o Brasil ser uma república presidencialista, curiosamente, alguns monarcas disputaram a preferência do público que passa em frente ao Palácio Rio Branco: durante 33 anos, o império do Rei do Pão de Queijo esteve justo em frente à herma do Barão e competiu espaço com os políticos e autoridades locais. Em fevereiro de 2020, o empresário José Renato Diniz Turcato assumiu o ponto, com a instalação do Cheff Pão de Queijo. Segundo ele, o vaivém de figurões, bem como a importância do Palácio, são pontos fundamentais para o sucesso do negócio. “Existe um valor histórico intrínseco e intangível quando falamos no Palácio do Rio Branco. É o centro das decisões políticas mais importantes da cidade e um dos cartões postais mais bonitos de Ribeirão Preto. É um excelente ponto de referência, que ajuda na divulgação e localização de nossa loja”, destaca Turcato.
Segundo o comerciante, os empresários do entorno do Palácio já sabiam dos planos de mudança da Prefeitura para outro prédio; para Turcato, uma medida positiva, que tende a melhorar a estrutura burocrática e os serviços à população. Para ele, a chegada de um centro cultural pode trazer um fluxo maior de pessoas para o local e melhorar os negócios na região, mas há preocupação com um possível abandono do prédio entre a saída do Executivo e o início dos trabalhos de restauro. “Sabemos que pode acontecer de fato [o abandono]. Porém, é algo que não queremos e não gostaríamos. O Palácio é um lindo edifício e abriga uma praça arborizada, que foi recentemente reformada, mas precisa e necessita de restauração por completo, como todo prédio histórico”, aponta.

 


A mudança da sede administrativa da Prefeitura para outro local já estava nos planos desde o início do governo Nogueira, em 2017, como aponta a secretária da Cultura, Isabella Pessotti. A expectativa é de que a licitação para escolha da construtora responsável pelas obras de restauro do Palácio Rio Branco seja aberta em 2023. "O restauro faz parte da entrega completa deste local para a população, onde o objetivo final é promover uma ocupação específica para o setor cultural. Um patrimônio histórico da cidade precisa ser entendido como tal e a ocupação deve compreender a difusão e formação cultural e de educação, que são fundamentais para o futuro de nossa cidade", pontua Isabella.

 

Nova mentalidade cultural

 


No trabalho de curadoria feito pelo IPCCIC, a historiadora Lilian Rosa relata que foram feitas sugestões à Prefeitura sobre usos mais adequados do Palácio Rio Branco após o restauro. Para o instituto, o Palácio poderia seguir como sede do Executivo, conciliando política e história, com visitas guiadas e exposições. “Um espaço de cidadania, que preserva a memória política do município, organizando, salvaguardando e difundindo sua história”, aponta Lilian. A opinião é compartilhada pela arquiteta Ingrid Sominami Lopes, proprietária do restaurante Palacete 1922 (o restaurado Palacete Jorge Lobato, no Centro), que pede diálogo com a população. “É importante decidir ouvindo a comunidade sobre a melhor utilização do Palácio. Para mim, o espaço deve ser utilizado para a preservação da cultura do nosso povo em todas as suas expressões, além de ser um local gerador de cultura”, pontua.


Ingrid e o irmão, o engenheiro civil Hector Sominami Lopes, foram responsáveis pelo restauro do antigo Palacete Jorge Lobato, hoje Palacete 1922. As reformas no prédio, como contam os proprietários, foram feitas a partir dos mesmos materiais e métodos de construção disponíveis na década de 20. A entrega de um restauro bem feito garantiu um retorno positivo dos clientes e de outros empresários, segundo Ingrid. “Muitos moradores da cidade têm uma memória afetiva com o Palacete e ficaram agradecidos pelo que fizemos. As pessoas vêm ao Palacete e se tornam participantes do projeto, muitos doam móveis e objetos históricos para que componham a decoração do prédio, reconhecendo a importância da preservação dos locais e objetos que contam a nossa história”, destaca.


Para a arquiteta, Ribeirão Preto ainda tem dificuldades de conciliar a preservação do patrimônio histórico e cultural com os tão almejados avanços à modernidade. Ela exalta a iniciativa de restauro do Palácio Rio Branco, afirmando ser importante que todos possam acessar mais este equipamento público. “O processo de restauro deve ser executado de forma a engajar a nossa sociedade: as faculdades, os arquitetos, as organizações civis e toda as pessoas que desejarem”, afirma Ingrid. “Ainda permanece uma ideia equivocada que modernidade e preservação do patrimônio não são conciliáveis. Muitos municípios, no mundo todo, já provaram que é possível pensar políticas de desenvolvimento, sem destruir o patrimônio e, ainda, transformando-o em um vetor de geração de trabalho e renda, por meio da economia criativa”, opina a historiadora e presidente do IPCCIC, Lilian Rosa. 

 

Pequeno palácio, grandes histórias

1913

Inauguração da herma em homenagem ao Barão do Rio Branco

 

1914

Câmara de Ribeirão Preto autoriza construção do Palácio

 

1915


Começam as obras do Palácio Rio Branco

1917


Inauguração do Palácio Rio Branco; Câmara e Prefeitura dividem o espaço

 

1956


Câmara deixa o local; Palácio passa a abrigar exclusivamente o poder Executivo

 

 

1992
 

Palácio recebe primeira reforma; madeiramento, encanamento e rede elétrica são trocados

 

2017


Cápsula do tempo é enterrada em frente ao Palácio Rio Branco

 

2022
 

Prefeitura deixa o Palácio Rio Branco, que passará por restauro

 

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