Do cinema à literatura

Do cinema à literatura

Edgard de Castro acredita que, além de sua atuação de destaque na produção de obras que enriqueceram o portfólio da sétima arte no país, a Fundação e a feira literária de Ribeirão são o seu legado

Edgard de Castro nasceu em Ribeirão Preto, em 21 de janeiro de 1943, e passou toda a infância e adolescência na cidade. Foi por influência do pai, advogado, que acabou se formando em Direito, em 1968, na Faculdade de Direito Laudo de Camargo da Universidade de Ribeirão Preto (Unaerp). Edgard advogou por cerca de um ano, mas, a inquietude social dos anos 70 falou mais alto e ele decidiu ir para a Inglaterra. “Eu não sabia muito bem o que queria fazer e na Inglaterra estava a grande transformação social, uma juventude cheia de questionamentos, o movimento hippie. Aquilo me atraiu”, conta.

 

O amor pela sétima arte


Cerca de um ano depois, sentiu que era hora de voltar para o Brasil, mas, uma pequena parada na Itália definiu os rumos que a vida de Edgard tomaria a partir de então. A amizade com o cineasta Jirges Ristum (pai do também cineasta André Ristum) o levou a conhecer mais de perto a sétima arte e o trabalho de diretores como Michelangelo Antonioni, Roberto Rossellini e Bertolucci, três nomes importantíssimos para a história do cinema mundial. “Por meio do Jirges, me aproximei do cinema, me envolvi com esse universo e gostei cada vez mais”, recorda. Um ano e meio depois, de volta a Ribeirão Preto, Edgard se uniu a um grupo de amigos, também admiradores da sétima arte, que eram os proprietários do Aquarius Auto Cine, na Avenida Presidente Vargas. Também chamado de cinema drive-in, era uma opção de cinema onde se assistia ao filme de dentro do carro, em um telão.


De espectador a produtor foi um pulo e junto com Renato Carrera Filho tiveram a  ideia de produzir um filme. Surgiu, então, o longa-me- tragem “A Carne”, baseado no romance de Júlio Ribeiro, um livro proibido na época por conter cenas explícitas de sexo. “O que pautava o cinema, naquela época, era a pornochanchada. A gente não queria entrar no universo da sétima arte por meio da pornochanchada, mas era necessário um apelo qualquer que motivasse o público a ir assistir nosso filme. Por isso, escolhemos esse livro que havia sido proibido e, mesmo assim, era muito lido às escondidas”, revela Edgard. “Hoje, é um romance naturalista bobo”, complementa. O filme “A Carne” foi lançado em 1975, com produção de Edgard, junto com Renato Carrera Filho, e direção de J. Marreco. No elenco, Selma Egrei e Newton Prado, dois artistas de grande impacto na época. 


E, assim, começou uma próspera carreira no cinema. Depois de “A Carne”, Ed- gard e Renato Carrera Filho produziram outros filmes de grande repercussão, como “Bacalhau” (1976), o premiado “Paranoia” (1977), com direção de Antônio Calmon, “O Cortiço” direção de Francisco Ramalho Jr., filme que abriu o Festival de Gramado, “Raoni” (1978) direção de Pierre Ditilieux (até a edição), nominado ao Oscar desse ano, “Pardo Sim! Sujo Não!” direção de Paulo Zola (1991) – fil- me de educação ambiental em computação gráfica sobre o Rio Pardo –, “Homem Voa? Santos Dumont” (2001), “Em trânsito” (2002), “Ribeirão Preto tem história” (2002) e “Tempo de Resistência” direção de André Ristum (2003). “Fazer cinema nessa época era muito difícil, usávamos recursos próprios e a Embrafilme. Além dos recursos, se está sujeito a muitos altos e baixos e ainda tem a questão da vaidade, egos. Mas, até que nos saímos bem”, diz.


Mais do que fazer cinema, Edgard sempre quis plantar uma semente da sétima arte em sua cidade natal. Em 2001, ele fundou o Núcleo de Cinema, uma organização não governamental que ajudou a implantar um polo cinematográfico e audiovisual no interior do Estado. Foi, também, responsável pela parceria entre a São Paulo Film Comission e a Cervejaria Heineken do Brasil S.A. para a implantação dos Estúdios Kaiser de Cinema, em Ribeirão Preto, com cinco estúdios grandes, três de médio porte e um pátio cinematográfico, núcleos de edição, computação gráfica, animação, oficinas de cenografia e figurino e camarins. Entre os filmes rodados no espaço, estão “Onde andará Dulce Veiga” (2008) direção de Guilherme Almeida Prado e “O Divórcio” direção de Pedro Amorim (2017). O espaço abrigou a antiga sede da Companhia Cervejaria Paulista era parte tombada  pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueo- lógico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat). Então ele teve a iniciativa de tombar o restante do imóvel pelo Compac o preservando assim essa patrimônio históricos . Hoje, é a sede do Grupo Thathi de Comunicação e do Instituto SEB.

 

O valor do conhecimento


Paralelamente ao trabalho no cinema, Edgard de Castro já estava envolvido com o universo literário como produtor cultural. Em 2004, ele assumiu a vice-presidência da Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto. “A literatura está na base de tudo, inclusive do cinema. O próprio roteiro é uma peça literária. ‘Paranoia’ foi baseado em um livro de Carlos Heitor Cony, ‘O Cortiço’ em obra de Aluísio Azevedo e ‘A Carne’ em um livro de Júlio Ribeiro. Tudo está intimamente ligado”, afirma. Para Edgard, o envolvimento com a Cultura – seja ela no cinema ou na literatura – é sempre gratificante. “Com a Fundação e, consequentemente, a Feira do Livro, conseguimos realizar um trabalho muito positivo. É um projeto local, que vem ganhando es- paço e novas dimensões, ampliando em tamanho e qualidade”, ressalta, hoje indo para toda Região Metropolitana de Ribeirão Preto.


Segundo ele, a Feira do Livro já plantou sementes e rendeu frutos, com muitos dos antigos frequentadores integrando os times que trabalham na Fundação e fazem o evento literário acontecer, com sucesso, ano após ano. Aos 81 anos, Edgard acredita que, além de sua atuação no cinema nacional, a Fundação e a feira literária são o seu legado. “Estar em contato com o conhecimento e a informação é essencial para o ser humano”, finaliza. 

 

1975
“A Carne”, de J. Marreco

1976
"Bacalhau", de Adriano Stuart 

1977
"Paranoia", de Antônio Calmon 

1978
"Cortiço", de Francisco Ramalho Jr. 

1978
"Raoni", de Pierre Ditilieux 

1991
"Pardo Sim" Sujo Não!

2001
"Homem Voa? Santos Dumont", André Ristum 

2001 
Fundador do Núcleo de Cinema

2002 
"Ribeirão Preto tem história", de Fred Nuti 

2002
"Em trânsito", de André Ristum 

2003
"Tempo de Resistência", de André Ristum 

2004
Assume a vice-presidência da Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto 

2013
Presidente da Fundação do Livro e Leitura de Ribeirão Preto

2014
Segundo mandato como vice-presidência da Fundação 

2018
Assume a vice-presidência da Fundação pela terceira vez 

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