Desafios do novo prefeito: Saúde
Para especialistas, gerir a atenção básica com os limitados recursos disponibilizados ao município sempre será o principal desafio de qualquer administração
De acordo com a Prestação de Contas da Saúde Municipal referente ao 1º quadrimestre de 2024, o orçamento atualizado da pasta é de R$ 985,2 milhões este ano. Divididos entre os atuais 698.642 habitantes de Ribeirão Preto, resultaria em um investimento per capita de R$ 1.410 por habitante – R$ 2014 se considerarmos apenas os 70% dos ribeirão-pretanos que dependem exclusivamente do SUS. Isso se a rede municipal de atenção básica atendesse apenas usuários da cidade, o que, de acordo com o médico e gestor em saúde Sandro Scarpellini, historicamente, não ocorre. “Trinta a 40% das pessoas que estão nas UPAs de Ribeirão Preto vêm de outras cidades”, afirma o ex-secretário, que ocupou a pasta no primeiro mandato do prefeito Antonio Duarte Nogueira.
A soma das populações nos 26 municípios na área de abrangência da DRS-13 (Direção Regional de Saúde) – umas das células da Secretaria Estadual de Saúde a coordenarem a atenção secundária em cada região de São Paulo – resulta em 1.464.774 habitantes. Mesmo dividindo a dotação de Ribeirão para a Saúde entre 70% dessa população (cerca de 1 milhão de habitantes), o investimento per capita ainda ficaria abaixo dos R$ 1.000 (R$ 960). “Você gasta isso só com vacinas se fizer tudo em [serviços de saúde] particulares”, comenta Scarpelini, para quem o maior desafio de qualquer gestor municipal de Saúde é conseguir manter toda a estrutura da atenção básica apenas com os recursos de que o município dispõe. “O custo é muito alto. A saúde no Brasil é cara! Quando você faz a conta, o cobertor é curto. Ribeirão ainda consegue destinar mais do que é obrigada por lei [15% do orçamento], mas tem cidade que não consegue por nada”, afirma.
Este ano, a dotação da Saúde em Ribeirão corresponde a 18,5% do orçamento total previsto, de 4,9 bilhões, conforme a Lei Orçamentária Anual (LOA). De acordo com Scarpelini, ao menos metade disso será gasto com Recursos Humanos, o que a prestação de contas confirma: estão previstos gastos de R$ 472.181.035 com RH, cuja folha inclui 3.068 funcionários efetivos e 2.355 com outros vínculos empregatícios. O que resta vai para a manutenção de uma estrutura física de assistência formada por 47 Unidades Básicas de Saúde (UBS); 7 Centros de Atenção Psicossocial (CAPS); dois Centros Especializados em Reabilitação municipais; 8 Ambulatórios de Especialidades; 4 Unidades de Pronto Atendimento (UPAs); 6 hospitais com gestão municipal; 1 sede administrativa central e duas descentralizadas, Almoxarifado Central – que inclui Centro de Abastecimento Farmacêutico e Lavanderia –, 5 Centros Distritais de Vigilância em Saúde (Equipes da Vigilância Epidemiológica e Controle de Vetores), 1 Unidade de Vigilância de Zoonoses e 1 Central de Distribuição de Imunobiológicos.
“O município já está no limite do que pode investir. Então isso vai continuar sendo um problema, independente de quem estiver lá”, alerta o ex-secretário, que aponta ainda outro entrave à gestão municipal de saúde: a falta de informação e formação dos usuários, que leva muitos a buscarem a estrutura básica para atendimentos fora de sua competência. “Estatisticamente, cerca de 95% das pessoas que vão a uma UPA precisariam de um atendimento eletivo (prestado no nível secundário). Apenas 5% precisam mesmo do pronto-atendimento”, afirma Scarpelini. Isso, segundo ele, contribui para sobrecarregar o sistema.
Mudanças de protocolos
Atual diretor da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto (EERP) da USP (Universidade de São Paulo), Pedro Fredemir Palha, enfermeiro e pesquisador na área de gestão em saúde, reconhece o protagonismo da Secretaria de Saúde de Ribeirão Preto nos últimos anos. “A gente sabe que houve um crescimento, sabe dos desafios e do subfinanciamento que existe na área, do empenho do município em ter um financiamento próprio e para entregar recursos muito acima do que é preconizado pela Lei Orgânica da Saúde”, destaca. Ele acredita, porém, ser possível fortalecer a atenção primária, facilitando o acesso maior da população ao sistema.
Para Palha, pensar na “resolubilidade” da atenção básica de saúde a partir do desenvolvimento de protocolos específicos para atuação de diferentes profissionais poderia contribuir para melhorá-la. “Um conjunto de doenças ou adoecimentos poderiam ser facilmente resolvidas na atenção básica, por meio do acesso a uma equipe multiprofissional. Essas condições sensíveis, quando não detectadas no seu tempo ideal, vão encontrar outra porta de entrada, que são as unidades de pronto atendimento ou internações hospitalares por situações de agudizações desses adoecimentos”, afirma.
O gestor acredita que a rede pública municipal conta ainda com um número insuficiente de enfermeiros para desenvolver todos os protocolos estabelecidos pelo Ministério da Saúde. “Nesse ponto a gente está falando de um aspecto muito importante, que é a ampliação do escopo das práticas de enfermagem. Essa é uma linha de desenvolvimento que a própria Organização Mundial da Saúde e a Organização Panamericana de Saúde vêm trabalhando de forma sistemática, em diferentes países”, declara.
Palha destaca ainda outro desafio para os gestores, que é aumentar as Equipes de Saúde da Família (ESF), cujo trabalho também pode contribuir para aliviar a sobrecarga de atendimento, com seu caráter preventivo. Atualmente, o programa representa apenas 23,5 % da estrutura de assistência primária no município. “Não é suficiente para ter um potencial de resolubilidade”, diz o gestor.
Com graduação, mestrado e doutorado em Enfermagem pela EERP-RP/USP, a professora universitária Silvia Sidnéia da Silva considera que o município tem o atendimento primário como preconiza o SUS. Entretanto, pontua que “cotidianamente a população enfrenta dificuldades para agendamentos de avaliação com especialistas e para exames/procedimentos de alta complexidade; bem como falta de leitos para internações”. Também para ela é preciso acreditar na oferta do atendimento aos indivíduos e família por equipe multidisciplinar “e não somente centrada no médico”.
PROPOSTAS
André Trindade (União Brasil)
Ao lado do Nogueira, organizamos as contas, melhorando a rede de saúde, possibilitando construir as UPAs Norte e Oeste. Hoje, temos a UBDS Vila Virgínia atuando como a UPA 24 horas; e ainda teremos mais uma UPA no Ribeirão Verde, que segue em construção. Além disso, reformamos 90% das 57 unidades de saúde existentes em 2017; e ampliamos a rede: hoje são 70 unidades. Também construímos o AME (Ambulatório Médico de Especialidades), ofertando quatro centros cirúrgicos e atendimento de qualidade, reduzindo a fila de cirurgias eletivas. Sobre a marcação de consultas, criamos o App Saúde Digital para maior praticidade e rapidez à população. Com toda a certeza continuaremos com mais investimentos na saúde.
Ismar Menezes (Agir)
Traduzir R$ 894 milhões em atendimento de qualidade na saúde pública exige uma abordagem estratégica. Passos incluem: 1) Gestão Eficiente - plataformas digitais (triagem por aplicativos) para reduzir filas e capacitação contínua dos profissionais, com atenção especial a "Centros de Apoio à Saúde da Mulher"; 2) Melhoria na Infraestrutura, com modernização das unidades e aquisição de equipamentos modernos; 3) Expansão da Rede de Atenção, com novas unidades, ampliação do horário de atendimento dos postos de saúde e parcerias temporárias com o setor privado; 4) Monitoramento e Avaliação, com auditorias e feedback da população; e 5) Transparência, com prestação de contas periódica. O objetivo é melhorar a qualidade e eficiência do sistema.
Jorge Roque (PT)
Há um problema estrutural na saúde: 50% dos atendimentos são na emergência, e só 20% na atenção primária. Deveria ser o inverso. Essa distorção sobrecarrega as UPAs e UBS e gera demora para agendar consultas e exames e nos atendimentos de emergência. Há 50 equipes da Saúde da Família que atendem só um a cada 4 moradores. Vamos triplicar as equipes de médicos, enfermeiros e agentes comunitários. É uma estratégia testada mundialmente com ótimos resultados, e aqui já foi muito maior. É o mais adequado para doenças como diabetes e hipertensão, que lotam as UPAs. É preciso priorizar a saúde, contratar e valorizar mais os profissionais. Hoje, só 23% do orçamento, menos que em cidades similares, é aplicado na área. E 100% do orçamento do setor deve ser aplicado na saúde pública!
Marco Aurélio (Novo)
A Saúde em Ribeirão Preto está à beira do colapso por falta de estrutura e demora no atendimento. Tudo isso é resultado de gestões que foram ineficientes. Nossa proposta é reestruturar a Saúde com base nos princípios de uma boa gestão, otimizando o uso de recursos, investindo em tecnologia, infraestrutura, abrindo novos postos de atendimento com aumento no quadro de profissionais de saúde, com capacitação, qualificação e respeito. A UPA do Ribeirão Verde deve ser concluída e a UBS de Bonfim adequada para 24h, já neste novo modelo. Além disso, com pronta disponibilidade para atendimentos bem dimensionados, em todos outros os postos de saúde. É crucial reduzir a fila de espera por atendimento e, para isso, a agenda de consulta deve ser de fácil acesso e simplificada. Vamos também drenar a ineficiência da máquina pública e ao mesmo tempo, estimular o desenvolvimento econômico para garantir mais receita sem aumentar impostos. Somente com uma gestão enxuta e eficaz poderemos entregar atendimento de qualidade.
Ricardo Silva (PSD)
A palavra-chave é “organização”, “planejamento”. Temos um sistema de agendamento de consultas que não funciona. Ou seja, a pessoa não consegue fazer acompanhamento de rotina numa unidade “básica”, de forma preventiva e acaba lotando as UPAs. Por isso é fundamental priorizar a chamada “Atenção Primária”, o que não acontece no atual governo. As palavras “primária” e “básica” não estão aí por acaso. É esse justamente o sentido. Quando o “básico”, o “primário”, não funciona, as pessoas recorrem às UPAs, aumentam os adoecimentos, as internações, os afastamentos do trabalho. Além disso, houve uma redução muito grande de médicos, como consta em dados oficiais: atualmente, são apenas 400 médicos. Em 2008, para se ter uma ideia, eram 638. Nesses 16 anos, de lá para cá, a população saltou de 560 mil para mais de 700 mil, enquanto o número de médicos teve redução de 238. Isso precisa ser revisto. E vamos rever, vamos organizar, dialogando com os profissionais e investindo também em saúde mental, que é um tema muito importante.
Arte: Revide