Desafios estruturais das novas gestões
Eleito para seu terceiro mandato, Lula assumiu como 39º presidente da República no último domingo

Desafios estruturais das novas gestões

Novas gestões do presidente Lula e do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, devem enfrentar desafios econômicos, políticos e sociais

Domingo, dia 1º de janeiro de 2023, foram empossados os novos representantes do Poder Executivo Federal e Estadual. Com mandatos até 2026, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que assumiu pela terceira vez o governo como presidente, e Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), empossado governador do Estado de São Paulo (após 28 anos de gestões do PSDB), devem enfrentar desafios econômicos, políticos e sociais nos próximos anos. Empossado como 39º presidente da República do Brasil, Lula, em um ato inédito, recebeu a faixa presidencial de um grupo de oito pessoas, representantes da sociedade civil brasileira, que subiram a rampa do Palácio do Planalto, em Brasília, junto do presidente e do vice-presidente, Geraldo Alckmin (PSB). “Renovo o juramente de fidelidade à Constituição, junto com vice e os ministros que conosco vão trabalhar. Se estamos aqui hoje é graças a consciência política da sociedade brasileira à frente democrática que formamos ao longo dessa campanha histórica”, disse Lula em seu discurso de posse no Congresso Nacional. 

 

Em ato inédito, a faixa foi entregue por um grupo de pessoas que representava a sociedade civil                                                                                                                                                                                                Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil

 

Também no dia 1º, em cerimônia na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), Tarcísio foi empossado governador do Estado, junto com o vice-governador Felício Ramuth (PSD). Após a solenidade, o novo governador foi recebido no Palácio dos Bandeirantes pelo ex-governador Rodrigo Garcia (PSDB). Foram nomeados, ainda, os 25 secretários de governo. Em seu discurso, Tarcísio destacou a necessidade de promover o diálogo constante com outros poderes, com o governo Federal e com a sociedade civil. “Para cumprirmos compromissos e transformarmos o serviço público é necessário trabalhar com grandes técnicos, ter humildade para reconhecer que a grandeza do Estado deve preceder qualquer objetivo pessoal, e promover o diálogo constante. O diálogo é construtor de pontes. É fundamental dialogar com os outros poderes, com o governo federal, com a imprensa, mas sobretudo, com os mais necessitados, com excluídos, com invisíveis. O diálogo deve ser um instrumento de edificação de justiça social”, disse o governador.

 

Novo governador do Estado de São Paulo, Tarcísio destacou a necessidade de promover o diálogo constante                                                                                                                                                                           Foto: Governo do Estado de São Paulo

 

POLARIZAÇÃO POLÍTICA

Segundo o professor, sociólogo e psicanalista Wlaumir Donizete de Souza, o grande desafio das novas gestões será promover as políticas públicas típicas de uma país de terceiro mundo, como é o caso do Brasil, e enfrentar a polarização e a radicalização política atual. No âmbito federal, o sociólogo destaca os setores de Educação, Saúde e combate à fome como fundamentais. “A política de Educação, com a melhoria nos índices educacionais e na qualidade da educação, incluindo a valorização dos professores. A questão da Saúde pública, com a melhoria do Sistema Único de Saúde (SUS) e a manutenção das Santas Casas e outras instituições agregadas ao governo federal. O saneamento básico, que é urgente no país e é um quesito que se avança muito pouco, com muita gente ainda sem água potável e em situações degradantes. Além disso, o combate à fome e à miséria”, pontua.

 

Na avaliação do sociólogo Wlaumir de Souza, as novas gestões devem enfrentar a polarização e radicalização política atual

 

Souza ainda ressalta a necessidade de uma política econômica efetiva para controlar a inflação, que reduz o poder de compra da população. “Na gestão federal, o problema número um é a questão da inflação. Não é possível falar em bem-estar social com o país com a inflação na casa em que está atualmente. Com ela, há o problema dos juros da Selic. A inflação aumentou o número de pessoas com fome no país e reduziu o poder de compra da classe média. A primeira questão a ser enfrentada é como debelar a inflação”, comenta.

 

Já em relação ao governo do Estado, o professor ressalta que o governador deve promover uma conciliação com o Executivo nacional. “O governo não está descolado do governo de Lula. Como a federação reúne maiores recursos com seu poder de atração dos impostos, Tarcísio dificilmente enfrentará Lula e seu governo, pelo contrário, deve tentar promover uma conciliação sem perder suas características de direita. O desafio de Tarcísio é a questão da educação no Estado de São Paulo, promovendo a valorização dos professores e a abertura de concursos públicos para contratação de profissionais, avançar nas questões de saúde e saneamento básico e, também, nas políticas de segurança estadual, que serão as bandeiras deste governo”, completa.

 

EQUILÍBRIO FISCAL

Na avaliação do economista e professor da Faculdade de Economia e Administração de Ribeirão Preto (FEA-RP/USP), Luciano Nakabashi, o principal desafio do terceiro mandato de Lula será enfrentar a questão fiscal com reformas estruturais. “O principal desafio ainda é a questão fiscal, pois isso não foi resolvido. O governo Bolsonaro segurou os gastos, congelando salários de servidores, reduzindo orçamento de alguns ministérios, mas isso não é sustentável. São necessárias reformas para se mudar os gastos de forma estrutural. Fazer reformas para redução de gastos ou para que os gastos aumentem menos do que o Produto Interno Bruto (PIB) e tenhamos uma trajetória de redução da relação dívida/PIB. Isso é fundamental para dar credibilidade ao país e atrair investimentos”, esclarece.

 

“O principal desafio ainda é a questão fiscal”, afirma o economista da FEA-RP, Luciano Nakabashi

 

O economista também destaca a necessidade de se controlar os gastos públicos, mantendo os investimentos sociais. “O governo Lula tem um histórico de gastos. Quando ele foi presidente, tivemos um aumento grande nos gastos, só que o PIB estava crescendo e o Brasil estava em uma situação confortável. Agora, a situação é mais complicada. O PIB cresce pouco. O crescimento da economia mundial dos principais países tende a ser menor, afetando, também, a economia brasileira. Temos juros alto para controlar a inflação e essa questão da trajetória da dívida em relação ao PIB que é um problema. É preciso manter os investimentos sociais, pois crescer distribuindo renda é a melhor forma para que o país chegue em um processo de desenvolvimento, ou seja, o país tem que crescer, mas precisa conseguir distribuir os ganhos deste crescimento”, diz Nakabashi. Sobre a gestão de São Paulo, o professor frisa que é preciso qualificar a educação, para se manter os bons indicadores do Estado, com investimentos em infraestrutura, como no Porto de Santos, e mantendo as contas públicas equilibradas.

 

GOVERNABILIDADE

De acordo com o cientista político Luiz Rufino, a nova gestão federal precisa garantir a governabilidade a partir da relação com o Congresso e o Senado. “Não existe Administração Pública sem a relação com Congresso e com o Senado. Na Ciência Política, existe o conceito de Democracia de Coalizão, que marca toda a política, desde a redemocratização, que é a necessidade de o Executivo cooptar, de certa forma, o Legislativo. A própria criação dos 37 ministérios que são entregues para representantes do Senado, do Congresso e entre os partidos, é para que se tenha governabilidade”, explica.

 

“O grande problema não serão os políticos, mas sim essa sociedade dividida, com opiniões já sedimentadas”, destaca Rufino

 

Ainda segundo Rufino, os dois discursos do novo presidente, tanto no Senado, quanto no parlatório, demonstram um posicionamento desenvolvimentista e que entende os ministérios e estatais, como Petrobrás e Correios, como ferramentas para fomentar a economia e, consequentemente, aumentar o consumo da população, especialmente das camadas menos favorecidas. “O maior problema interno será a pacificação e não acredito que ela vá ocorrer. Pois os antagônicos dentro da política já estão sedimentados na população. Temas como aborto e desarmamento, por exemplo, será difícil para o governo chegar em um senso comum e sinalizar uma pacificação. Cada decisão tomada no campo progressista, imediatamente será rejeitada por parte da população, que já tem a convicção formada. O grande problema não serão os políticos, mas sim essa sociedade dividida, com opiniões já sedimentadas”, diz Luiz Rufino.

 

Já na gestão estadual, o grande desafio deve ser qualificar a educação, em especial, o Ensino Médio. “No caso de São Paulo, o governador, mesmo sendo um egresso do bolsonarismo e em seu discurso ter agradecido a chance que o ex-presidente Jair Bolsonaro lhe deu, mostra- -se um quadro técnico e tem ao seu lado um político muito habilidoso, que é o Gilberto Kassab, um grande interlocutor de Lula. Não vejo dificuldades na relação política entre o Estado de São Paulo e o governo Federal” completa o cientista político.


Foto: Tomaz Silva/ Agência Brasil

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