Eleição: 'Guerra de argumentos’ será na rede, diz especialista
Eleição: 'Guerra de argumentos’ será na rede, diz especialista

Eleição: 'Guerra de argumentos’ será na rede, diz especialista

A Lei nº 13.165 restringiu o financiamento e reduziu o tempo das campanhas eleitoras; Gildo Yamashiro comenta como fica a corrida por votos em 2016

A reforma eleitoral, causada pela Lei nº 13.165, de 2015 reduziu o tempo da campanha eleitoral de 90 para 45 dias, com início previsto para o dia 16 de agosto e também diminuiu o tempo de propaganda dos candidatos no rádio e na TV de 45 para 35 dias, com início em 26 de agosto, no primeiro turno. Além dessas mudanças, a lei restringe o financiamento de campanhas somente às doações de pessoas físicas e recursos do Fundo Partidário.

Nas mídias

Assim, a campanha terá dois blocos no rádio e dois na televisão com 10 minutos cada. Além dos blocos, os partidos terão direito a 70 minutos diários em inserções, que serão distribuídos entre os candidatos a prefeito (60%) e vereadores (40%). Em 2016, essas inserções somente poderão ser de 30 ou 60 segundos cada uma.

Para o jornalista e Gildo Yamashiro, a principal alteração desencadeada pela lei está por conta do tempo dos programas de televisão, que ficaram menores.  Contudo, ele explica, haverá um tempo maior de comerciais. “Teremos uma campanha com inserções curtas, porém, mais frequentes. A diferença entre os programas e os comerciais é o formato de mensagem. Enquanto no horário eleitoral, as ideias são desenvolvidas, mais explicativas, nos comerciais, a linha é mais publicitária, com informações mais curtas, objetivas”, destaca Yamashiro, que estará em Ribeirão Preto entre os dias 8 e 9 de julho para ministrar o curso de Estratégias em Campanhas Eleitorais.

Com experiências nas campanhas de José Serra (PSDB), Sérgio Cabral (PMDB), Maria Abadia (PSDB), Yamashiro é coordenador de media training para partidos e coligações. Ele acredita que, durante a corrida para as eleições municipais, para o eleitor, pode ficar a sensação de que a campanha estará maior, já que o telespectador, que tem a chance de desligar a tevê para fugir do horário gratuito, não terá a mesma possibilidade de escapar dos comerciais, que estão no intervalo da programação normal. 

Dinheiro para campanha

Outra questão levantada por Yamashiro acerca das novas diretrizes para as campanhas está ligada aos orçamentos. “O eleitor e a sociedade estão mais atentos depois da sucessão de escândalos envolvendo os financiamentos de partidos.  Inevitavelmente, as campanhas terão orçamentos mais reduzidos – até porque alguns dos grandes financiadores estarão bastante receosos de continuar a investir. A tendência é vermos campanhas mais criativas, com menos ostentação. No quesito de conteúdo, haverá uma necessidade incrível de tentar se diferenciar, propondo uma honestidade até então nunca vista. É hora de ´mãos limpas´. Mas, claro, muitos discursos cairão no vazio”, aponta.

Confira entrevista

Portal Revide: Os candidatos terão que investir mais no contato pessoal com o eleitor?

Gildo Yamashiro: O corpo a corpo ainda é um elemento forte de campanha. Um aperto de mão e olho no olho ainda são uma forma de transmitir confiança; trata-se, afinal, de relações humanas. E a proximidade com o eleitor é fundamental. Mas o candidato que faz isso apenas como protocolo de campanha comete o eterno erro da hipocrisia. E o eleitor sabe disso. A verdadeira campanha eleitoral, para candidatos sérios, começa muito antes, com trabalho comunitário de verdade. É quando o candidato frequenta e cumprimenta as pessoas não apenas pedindo o voto, mas por uma relação real entre membros da comunidade. Ou seja, conexões verdadeiras de prestação de serviços, de confiança. O contato é com o cidadão, não com o eleitor. Precisamos de pessoas mais verdadeiras na política e o candidato que perceber isso vai se beneficiar sempre.

Portal Revide: E a internet? Você acredita que será uma ferramenta mais utilizada?

Gildo Yamashiro: Uma campanha eleitoral serve, teoricamente, para expor ideias e projetos de um candidato. A TV massifica essa mensagem. Mas por qual meio essa mensagem chega mais rapidamente hoje em dia? A TV cria uma imagem mais polida e, portanto, mais romantizada (para não dizer falsa) dos candidatos. A internet é um pouco mais rude, digamos assim. Ela, como espaço mais democrático, vai possibilitar a interação e, portanto, o contraponto de quaisquer argumentos.  A polarização política da população nos últimos anos vai acentuar esse aspecto. Será uma guerra de argumentos, o que é bom, democraticamente.  A internet ainda não é a protagonista da campanha, mas é a principal disseminadora de ideias. Infelizmente, também rende muitos boatos. Neste sentido, o eleitor às vezes, fica confuso e acaba desacreditando em tudo.

Portal Revide: A internet gera registros, ‘ela não esquece’. Promessas ficam arquivadas, gafes são registradas e propagadas. Como lidar com tudo isso e um pouco mais durante a campanha?

Gildo Yamashiro: Esses aspectos da internet exigem de candidatos e de figuras públicas uma postura mais consciente. Não se trata apenas de ´parecer´, mas de ser mesmo. Talvez estejamos chegando à essência da coisa, inclusive em política. A internet tem registros de praticamente tudo que é dito, experimentado e vivido. E, evidentemente, as figuras públicas são o maior alvo dessa vigília. O candidato com ‘telhado de vidro’ precisa preparar explicações concretas e transparentes, e não enrolações. Quando o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) tentou se explicar sobre contas na Suíça, alegando que era apenas beneficiário delas, isso, apesar de ser um argumento jurídico, não cola para mais ninguém. No caso do deputado, foi condenado pelo próprio eleitor, embora possa até se livrar politicamente.  Então, nesse novo mundo, regido por registros contínuos e imperdíveis, o candidato que pretende um cargo político tem de se fiar numa forte característica: coerência.  E isso não apenas nos momentos de campanha, quando surgem as promessas mais mirabolantes, mas em toda a carreira pública.

A internet é uma ferramenta mais democrática que a TV e permite interatividade. Os candidatos, e sua equipe de marketing, terão de lidar, por exemplo, com o fator “troll” dos internautas. Poderia comentar?

Gildo Yamashiro: A internet produz informações de todo o tipo, incluindo as falsas, agressivas e irônicas.  Como lidar com isso? Primeiro, é definir o peso de cada argumento. Se estiver ganhando proporções sérias, a resposta deve ser imediata, objetiva e, acima de tudo, sincera. Erros cometidos devem ser admitidos, porque serão expostos de qualquer maneira. Então, o melhor é ter a humildade de admitir, se desculpar.  E sempre aconselho a dar respostas que apontem para soluções, não apenas reflitam sobre os problemas. Não se trata apenas de admitir um erro, mas de mostrar quais são as alternativas para que eles não se repitam. Aprender com os erros é uma característica muito aceita pelo eleitor brasileiro.

Portal Revide: É mais fácil elaborar uma campanha para esse “novo cenário” – virtual – ou no “cenário antigo”?

Gildo Yamashiro: As campanhas hoje são naturalmente mais complexas.  Por tudo isso que disse acima. A quantidade de argumentos, a velocidade de disseminação de informações e, principalmente, a interatividade com o público derrubaram muitas das cartilhas de marketing que regeram as campanhas nas últimas décadas. A imagem plastificada de políticos não convence mais ninguém, os deslizes viram terremotos. O desafio das campanhas está em encontrar a essência útil dos candidatos – como o trabalho de cada um pode beneficiar a sociedade? O marketing precisa externar um projeto, uma linha de raciocínio, uma ideia cidadã. Caso contrário, será propaganda enganosa.  Um copo vazio, ainda que seja de cristal, será apenas um copo vazio.

Portal Revide: À primeira vista, é sabido que teremos campanhas mais enxutas, como menos dinheiro de financiadores. Qual será o principal impacto nas campanhas para a disputa municipal?

Gildo Yamashiro: Menos dinheiro, mais criatividade. Exatamente porque a campanha será mais de inserções comerciais do que de programas eleitorais, haverá bastante espaço para criar peças simples, mas com ideias melhores. Às vezes, a parafernália de produção atrapalha a mensagem. Particularmente neste ano, com campanhas municipais, os candidatos precisarão sair mais às ruas, interagir fisicamente e online. O trabalho de convencimento terá de ser maior. Muitos candidatos  vão apostar mais forte na internet, porque acreditam que é um meio de custo menor.  Possivelmente, veremos campanhas online mais profissionais e campanhas na TV menos ostensivas.

Portal Revide: O desenrolar da Operação Lava Jato, a saída da presidente Dilma Rousseff (PT), o escândalos como os da merenda escolar, surtirão efeito decisivo nas eleições?

Gildo Yamashiro: A principal consequência dos escândalos na última década é a credibilidade. O político vai lutar muito para parecer honesto. Todas as pesquisas mostram o cidadão brasileiro farto de tanta corrupção, independente de bandeira partidária. Então, esquerda e direita têm o mesmo desafio: recuperar a confiança do eleitor. Veremos  todas as formas de tentar alcançar isso, já que pelas últimas delações premiadas, praticamente todos os partidos e figuras de destaque foram atingidas. Creio que um fator determinante cada vez mais forte é o índice de rejeição dos candidatos. Vai vencer não a melhor proposta, mas quem for o menos odiado.  E isso tem tudo a ver com credibilidade. Não é questão do eleitor confiar em determinado político, mas é ter a certeza de que a outra opção é ainda pior. Vivemos dias de aceitação e não de exaltação.

Portal Revide: É possível driblar essas dificuldades?

Gildo Yamashiro: Sempre. Até porque o eleitor precisará fazer uma opção, obrigatoriamente. Ou seja, vai ter de usar algum critério para escolher seu candidato.  Qual é esse critério? – é a pergunta de um milhão de dólares. Provavelmente será um conjunto de argumentos, mas certamente vai passar por honestidade (ou menos desonestidade), ideias para saída da crise, projeto para gerar emprego e renda, e menos pirotecnia possível.  


Foto: Valter Campanato Z Agência Brasil

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