
Ajuda especializada à mulher
Com o isolamento social, mulheres vítimas de violência doméstica foram obrigadas a passar mais tempo ao lado dos agressores. Em RP, elas contam com o apoio do NAEM, coordenado por Laura Aguiar
Texto: Gabriela Maulim
O isolamento social causado pela pandemia do novo coronavírus transformou a rotina de milhares de brasileiros. Contudo, para as mulheres vítimas de violência doméstica, ficar em casa não se resumiu a uma mudança cotidiana, mas instalou a preocupação de mais ataques físicos e psicológicos durante esse período.
No Brasil, segundo dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH), houve um aumento de 14,1% no número de denúncias feitas ao Ligue 180 nos primeiros quatro meses de 2020 em relação a 2019. Entre janeiro e abril do ano passado, foram registradas 32,9 mil ligações ao canal de ajuda ante 37,5 mil no mesmo período deste ano. Abril — primeiro mês de estabelecimento completo de isolamento social — foi o mês de mais destaque, com um aumento de 37,6% nas denúncias.
Em Ribeirão Preto, as vítimas de violência doméstica possuem o apoio do Núcleo de Atendimento Especializado à Mulher (Naem), coordenado pela psicóloga Laura Aguiar, que também atua no Serviço de Acolhimento Institucional para Mulheres Vítimas de Violência "Casa Abrigo Nilda Rocha Simões" e no Serviço de Reeducação do Autor de Violência de Gênero (SERAVIG).
Segundo a especialista, que iniciou a carreira no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e atuou, também, como coordenadora do Serviço de Acolhimento Institucional para Criança e Adolescente, a situação atual imposta pela pandemia prejudica a busca das vítimas por ajuda, embora não tenha causado, conforme análise empírica, aumento no número de casos. “O isolamento intensifica os conflitos e a permanência do autor em casa dificulta a busca da vítima por apoio, uma vez que os períodos de ausência diários, tais como passeio e trabalho do autor, podem contribuir para que ela procure os serviços de ajuda, favorecendo o rompimento do vínculo com o autor”, argumenta.
Ainda de acordo com a psicóloga, o trabalho da rede protetiva à mulher em Ribeirão Preto é oferecer subsídios para que ela consiga se desvencilhar do cenário abusivo. “É oferecido atendimento psicossocial, objetivando desenvolver na vítima recursos internos e externos para o enfrentamento da vivência, tais como: solicitação de medida protetiva, patrulhamento, por meio da Patrulha Maria da Penha, atendimento com escuta acolhedora e continente, encaminhamentos para saúde e outros serviços da rede”, pontua.
Na entrevista a seguir, Laura discorre sobre o cenário atual de violência doméstica durante a pandemia do novo coronavírus e destaca o atendimento especializado oferecido para atender e proteger as vítimas em Ribeirão Preto.
Nesse período de isolamento social em que as pessoas precisam estar em casa, houve um aumento dos casos de violência à mulher em Ribeirão Preto?
Podemos afirmar que neste período houve um aumento no número de mulheres encaminhadas e que procuraram o nosso serviço. Contudo, não podemos afirmar o aumento dos casos de violência contra a mulher no município, uma vez que nem todas as mulheres que sofrem violência procuram ou são encaminhadas ao Naem.
O que pode ocorrer quando as vítimas são obrigadas a ficar 24 horas na mesma casa que seu agressor?
Inferimos que a permanência dos membros familiares em casa, sem atividades externas, contribui para intensificar os conflitos e as vivências intrafamiliar. Devemos pensar em mecanismos de enfrentamento da violência, serviços e intervenções que possibilitem à vítima não permanecer em convívio com o autor. O apoio familiar é uma possibilidade de intervenção que colabora significativamente para romper o convívio. O atendimento do Naem, por exemplo, busca desenvolver na vítima recursos interno e externo para o enfrentamento da vivência de violência. Esgotadas as possibilidades, Ribeirão Preto possui dois serviços de acolhimento para garantir que a vítima não permaneça em situação de risco: o Serviço de Acolhimento Institucional para Mulheres Vítimas de violência em risco iminente de morte, "Casa Abrigo Nilda Rocha Simões", e o Serviço de Acolhimento para Adultos e Família Esperança, para mulheres e filhos sem moradia ou sem condições de auto-sustento.
Qual é o impacto que a pandemia e as medidas impostas trouxeram para a vida das mulheres que vivem junto aos seus agressores? O isolamento intensifica os conflitos e a permanência do autor em casa dificulta a busca da vítima por apoio, uma vez que os períodos de ausência diários, tais como passeio e trabalho do autor, podem contribuir para que ela procure os serviços de ajuda, favorecendo o rompimento do vínculo com o autor.
A pandemia do novo coronavírus contribuiu para que houvesse mais casos de feminicídio ou agressão contra mulheres no município? Empiricamente não podemos afirmar que a pandemia contribui para o aumento. O que podemos dizer é que houve uma mudança na rede de atendimento à mulher vítima de violência no município. A vítima está mais exposta ao autor de violência. Contudo, o número de mulheres que procuraram o Naem se manteve, quando comparado com o mesmo período do ano passado. Também não houve alteração nas queixas. Atendemos violência física, psicológica, patrimonial e moral.
Qual tipo de ajuda é oferecido para essas mulheres que buscam socorro no Naem? É oferecido atendimento psicossocial, objetivando desenvolver na vítima recursos internos e externos para o enfrentamento da vivência, tais como: solicitação de medida protetiva, patrulhamento, por meio da Patrulha Maria da Penha, atendimento com escuta acolhedora e continente, encaminhamentos para saúde e outros serviços da rede.
Desde o início do isolamento social, quais foram os pedidos de ajuda mais comuns que o Naem vem recebendo?
O Naem recebe relatos de todos os tipos, todavia, identificamos um aumento da violência psicológica que pode ou não ser acrescida de outra formas de violência.
Como as mulheres que sofrem algum tipo de violência doméstica devem prosseguir para pedir socorro? Há algum tipo de protocolo a ser seguido neste momento de pandemia?
A vítima poderá procurar o serviços que nomeamos como porta de entrada. São eles: o Naem, por meio de ligação telefônica, WhatsApp, e-mail e/ou pessoalmente, e a Delegacia de Defesa da Mulher (DDM), pessoalmente para registro de Boletim de Ocorrência. Cabe ressaltar que o Boletim de Ocorrência também pode ser realizado por meios eletrônicos. Outras possibilidades são serviços que não são específicos para atendimento da vítima, porém estão preparados para realizar a acolhida e os devidos encaminhamentos, como por exemplo as Unidades de Saúde, Centro de Referência em Assistência Social entre outros.