Bolsa Família: 20 anos de distribuição de renda
Benefício é direcionado a famílias em situação de pobreza ou pobreza extrema

Bolsa Família: 20 anos de distribuição de renda

Programa objetiva reduzir a pobreza e a desigualdade no país

O Bolsa Família completa 20 anos em 2023. Criado em 2003, pelo governo federal, o programa objetiva reduzir a pobreza e a desigualdade no país por meio da distribuição de renda. É direcionado a famílias em situação de extrema pobreza ou pobreza, que recebem um valor mensal em dinheiro para suprir suas necessidades básicas. Desde sua criação, o Bolsa Família tem tido um impacto significativo na qualidade de vida das famílias beneficiadas, proporcionando maior acesso à alimentação, saúde e educação.

 

Segundo dados da Secretaria Municipal de Assistência Social de Ribeirão Preto, o Bolsa Família atende cerca de 23 mil famílias na cidade, com um valor mensal de R$600, totalizando R$13,8 milhões injetados na economia local somente no mês de abril. Comparado ao ano anterior, o número de beneficiários aumentou em 1.970 famílias.

 

O programa também concede um adicional de R$150 pelo Benefício Primeira Infância, que engloba 4.542 crianças em Ribeirão Preto, totalizando R$681 mil no último mês. No Estado de São Paulo, mais de 1 milhão de crianças de zero a seis anos foram contempladas, em 951 mil famílias, com um repasse total de R$176,93 milhões em abril. Em todo o país, são 7,2 milhões de famílias com pelo menos uma criança nessa faixa etária, resultando em um investimento de R$1,3 bilhão.

 

Pesquisas realizadas pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FEA-RP/USP) mostram que 70% dos filhos de famílias beneficiárias do Bolsa Família, em 2005, já não dependiam do programa na idade adulta. Fábio Augusto Reis Gomes, professor de Economia e diretor da FEA-RP/ USP, falou sobre os pontos positivos e os caminhos para o aprimoramento do programa, bem como seu impacto na economia local.

 

Como o aumento do número de beneficiários do Bolsa Família pode influenciar na economia de Ribeirão Preto?

 

O programa Bolsa Família garante um valor mínimo de R$600 por família e, portanto, um aumento no número de famílias implica um valor maior transferido para Ribeirão Preto. Como se trata de famílias de baixa renda, esses recursos devem ser consumidos ou investidos em pequenos empreendimentos. O efeito maior deve se dar no pequeno comércio de bairros mais pobres, especialmente no setor de alimentação. Em qualquer caso, são recursos injetados na economia. No entanto, frente à forte economia da cidade, esse aumento de renda é bastante reduzido. O valor é, sem dúvida, importante para quem o recebe, mas deve ter impacto muito limitado na economia de Ribeirão Preto como um todo.

 

Como os programas de transferência de renda podem contribuir para a redução das desigualdades sociais no Brasil?

 

Quando as transferências de renda são bem-sucedidas, alcançando os mais pobres, há uma clara redução na desigualdade de renda. E, de fato, há várias evidências que o Bolsa Família foi importante para a redução da pobreza e da desigualdade no Brasil.

 

Programas de distribuição de renda podem auxiliar no crescimento econômico do país, gerar empregos e aquecer o comércio ou a medida é apenas paliativa?

 

Um programa como o Bolsa Família tem o objetivo de reduzir a fome e a insegurança alimentar e, ao mesmo tempo, contribuir para que as crianças frequentem as aulas. Embora as transferências de renda possam contribuir para o comércio local, o efeito de longo prazo via educação que é fundamental. Por meio da educação, as pessoas podem ascender socialmente, tornando-se, inclusive, menos dependentes das transferências governamentais. Obviamente, a educação é investimento cujo retorno demora para ser colhido. Apenas após anos de estudo, a pessoa consegue empregos melhores. De todo modo, esse é, sem dúvida, o caminho para o desenvolvimento do país. Quanto maior o sucesso do Bolsa Família em manter as crianças na escola, maior o impacto do programa a longo prazo.

 

Existem críticas a respeito de programas de distribuição de renda de que eles criaram uma classe de pessoas “acomodadas”. Como avalia esse tipo de afirmação?

 

Afirmações como essas são precipitadas. Em geral, elas não são acompanhadas de estudos que as comprovem. De fato, há trabalhos científicos que testaram esse efeito acomodação e não encontraram evidência deste tipo de atitude. Além disso, refinamentos das regras do programa ao longo do tempo deram incentivos ainda maiores para as pessoas ingressarem no mercado formal de trabalho. Antigamente, uma pessoa que começasse a trabalhar e abrisse mão do Bolsa Família iria para o fim da fila do benefício se perdesse o emprego. Mais recentemente, essa regra mudou. Por alguns meses, se ela perder o emprego, ela volta a receber o Bolsa Família.

 

Já no caso de programas como o vale gás, como ele pode ajudar uma comunidade? Esse tipo de benefício é o mais indicado?

 

Benefícios como esse determinam como o recurso pode ser gasto. No caso, somente na compra de gás. Note que o Bolsa Família é um programa mais liberal no sentido econômico. A família recebe o valor e decide como gastá-lo. O pressuposto é que a família conhece melhor as próprias necessidades e aplicará adequadamente os recursos recebidos. Programas do tipo vale gás pressupõe que a família não faria boas escolhas, sendo melhor o próprio programa definir como os recursos devem ser gastos.

 

Com critérios que visam evitar a evasão escolar, é possível afirmar, além da renda, que programas como o Bolsa Família auxiliam na mobilidade social?

 

Sem dúvida. A educação permite que o indivíduo tenha ascensão social. No entanto, como já mencionado, a educação tem retorno no longo prazo. É preciso estudar ao longo de anos para que a pessoa se capacite, consiga melhores empregos, tenha uma renda maior e deixe, inclusive, de depender de programas como o Bolsa Família. Pesquisas da FEA-RP mostram que 70% dos filhos de famílias beneficiárias do bolsa família, em 2005, já não dependiam do bolsa família na idade adulta.

 

“Refinamentos das regras do programa ao longo do tempo deram incentivos ainda maiores para as pessoas ingressarem no mercado formal de trabalho”, comenta o especialista

 

O Bolsa Família completa 20 anos em outubro deste ano. Podemos falar que ele foi uma política social bem-sucedida?

 

Há estudos que apontam que o Bolsa Família teve impacto na redução da desigualdade social, por exemplo. Certamente, o programa ajudou a combater a fome e reduziu a insegurança alimentar de muitos brasileiros. Essas são algumas das dimensões nas quais o programa foi bem-sucedido. O próximo desafio é criar portas de saída que permitam inclusão produtiva de qualidade aos beneficiários. O maior apoio a famílias com crianças pequenas da atual versão do programa também é uma medida correta, pois os primeiros anos de vida são cruciais para o desenvolvimento dos indivíduos.


Foto: Arquivo Revide

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