
Conquistas e desafios
A AEAARP completa 75 anos desempenhando um papel importante para o avanço de Ribeirão Preto e região
* Entrevista publicada na edição 1.153.
Em 2023, a Associação de Engenharia, Arquitetura e Agronomia de Ribeirão Preto (AEAARP) completa 75 anos de fundação. Nesse período, consolidou-se como uma das mais estruturadas e influentes do país, com representantes nos conselhos de classe – Sistema Confea/CREA e CAU – e nos conselhos consultivos municipais – urbanismo, meio ambiente e patrimônio histórico, entre outros. Atualmente, são cerca de 2.500 associados, que contribuem, de forma expressiva, para a constante profissionalização do setor. Na entrevista a seguir, o presidente, o engenheiro mecânico Giulio Prado, e o vice, o engenheiro civil Fernando Junqueira, discorrem sobre o papel da entidade, apontando quais foram os principais avanços até aqui e quais são os desafios a serem vencidos na busca pelo desenvolvimento sustentável da cidade.
Qual é o propósito da AEAARP?
GIULIO: A gênese da Associação é a de promover a valorização dos profissionais de Engenharia, Arquitetura, Agronomia e Ciências Geológicas. Isso acontece quando a entidade fornece ferramentas de conhecimento – semanas técnicas, palestras, cursos livres e convênios – e, também, quando se coloca a serviço da comunidade, expondo e defendendo o conhecimento técnico em áreas estratégicas, como infraestrutura e planejamento, entre outros.
Como ela influencia/impacta Ribeirão Preto e região?
FERNANDO: Uma das primeiras ações da AEAARP, em 1948, foi designar o engenheiro Galileu Frateschi para representá-la no grupo recém criado no legislativo para debater o Código de Obras. Isso está registrado no livro ‘AEAARP 60 anos: histórias e conquistas’. Desde aquele momento e até hoje, a Associação jamais se absteve desses debates. No último período, por exemplo, eu tenho acompanhado, pessoalmente, a tramitação da Lei Complementar de Uso e Ocupação do Solo. Vou lá porque sei que não estou sozinho nessa. Eu represento um grupo que acompanha atentamente essa questão não é de hoje, é desde os anos 1940.
GIULIO: É importante a gente registrar, também, que as reuniões da Região Metropolitana de Ribeirão Preto acontecem na Associação desde antes de sua formalização. A regionalização é uma questão que defendemos pelo fato de Ribeirão Preto ser, desde sempre, o centro dessa região. Formalizá-la significa promover a confluência de interesses e investimentos e aí voltamos aos nossos temas prediletos: urbanismo, planejamento, meio ambiente, desenvolvimento e infraestrutura.
Como é a relação da associação com o poder público e com o empresariado local?
GIULIO: A relação é institucional. No caso atual, o prefeito Antônio Duarte Nogueira é nosso associado. Temos uma forte relação de amizade, assim como com o empresariado local. Muitos deles são nossos associados também.
FERNANDO: Inclusive eu, que tenho um longo histórico na construção civil.
GIULIO: Exatamente. E esse exemplo é importante: para nós, da AEAARP, essas relações de amizade, de proximidade, são muito importantes. Para os nossos associados, significa que oferecemos um ambiente qualificado de contatos profissionais, não é mesmo? Agora, essa relação é sempre pautada na defesa da ética e da boa prática profissional, que é o que valoriza todo o conjunto e a nossa marca.
Quais foram as principais conquistas até aqui?
GIULIO: Nossa maior conquista, certamente, é chegarmos aos 75 anos com a relevância política e institucional que temos, além de oferecermos aos sócios uma sede muito bem estruturada, que atende às suas necessidades. Por exemplo: associados têm uma sala exclusiva para receberem clientes, sem custo algum. Sabemos o quanto esse apoio é importante, especialmente para profissionais liberais. O trabalho institucional acontece tanto na sede, pelo fato de recebermos reuniões de conselhos e grupos de trabalho, como fora, porque somos sempre chamados a compor grupos de debate, tanto na Prefeitura quanto na Câmara Municipal.
FERNANDO: É exatamente isso e esse pequeno resumo demonstra que, desde sempre, é o ser humano e o profissional que estão no centro de nossas atenções.
Quais são os principais desafios pela frente?
FERNANDO: Nosso desafio é o de ampliarmos essa relevância. No Brasil, o associativismo passa por um período diferente. Hoje, as associações – a nossa e todas as outras – têm outros cenários de atuação, muito diferentes dos anos 1940. Temos de ser o lugar onde o profissional de Engenharia, Arquitetura, Agronomia e Ciências Geológicas, os técnicos, os tecnólogos e os estudantes se sintam à vontade para conversar sobre assuntos que os interessam, que façam contatos profissionais, que venham conhecer as pessoas nas semanas técnicas, que se exponham, se apresentem e que construam conosco esse novo capítulo da nossa história.
GIULIO: Conversar, trocar experiência e ter um ambiente qualificado para isso é o que importa para quem está entrando no mercado e para quem está nele já há muito tempo. Tem tudo isso na AEAARP.
Podemos dizer que Ribeirão Preto é uma potência no setor em que vocês atuam? Quais são os pontos que se destacam nesse sentido?
FERNANDO: Ribeirão Preto é a terceira região do Estado de São Paulo que mais aprova projetos no Graprohab, que é o órgão estadual dedicado a esse tema. Isso significa que, ainda que as condições econômicas não sejam as mais favoráveis no momento, a gente constrói, investe, incorpora e planeja. Isso é um termômetro de outras áreas da economia, sobretudo o setor de serviços e a indústria, onde os nossos associados também estão.
GIULIO: Temos que destacar também que, do ponto de vista histórico, Ribeirão Preto teve e tem muitos profissionais de Arquitetura e Urbanismo que são prestigiados nacionalmente. Ijair Cunha e Cássio Pinheiro Gonçalves são exemplos do passado que deixaram marcas importantes em nossa paisagem, como a sede da Recreativa na Avenida Nove de Julho. A nossa revista Painel, que é uma publicação que mantemos desde 1979, contou essas histórias em uma série de reportagens publicadas ao longo de 2021 e compiladas em uma edição especial publicada em janeiro de 2022. Está tudo no nosso portal, o aeaarp.org.br.
E quais são os principais problemas de infraestrutura identificados no município atualmente?
GIULIO: A questão hídrica é uma das que mais afeta o setor produtivo atualmente, e que reverbera para a população. Nós temos de falar sobre o abastecimento de água de maneira franca e, sobretudo, técnica. E, também, com tempo. A AEAARP integra um grupo de trabalho neste sentido e nós queremos continuar contribuindo para o futuro produtivo da nossa cidade com qualidade de vida para todos nós.
FERNANDO: Temos, ainda, as discussões das leis complementares ao Plano Diretor, com as quais a AEAARP colabora desde sempre. Acompanhamos de perto a execução das obras do PAC-Programa de Aceleração do Crescimento, que vão mitigar algumas questões de mobilidade. Esses são exemplos de questões que têm sido bem cuidadas e que exigem soluções em médio e longo prazo.
Para onde a cidade está crescendo? Esse crescimento está sendo feito de forma sustentável?
GIULIO: As regras urbanísticas de hoje não admitem mais um avanço desordenado dos empreendimentos. As cidades brasileiras seguem uma norma que é aperfeiçoada desde 1979. Quer dizer, já faz muito tempo que empreendedores e autoridades têm em mãos conjuntos de regras urbanísticas que foram desenvolvidas por técnicos com o objetivo de proporcionar crescimento sustentável aos municípios.
FERNANDO: É isso mesmo. Pensa que é simples aprovar um projeto? Não é. Por isso, temos de investir na formação de profissionais habilitados pelo Sistema CONFEA/CREA e CAU, que são capazes de fazer bons projetos. A qualidade, no caso, não é meramente estética; é também de planejamento, de pensar como as pessoas vão viver ali, como será a cidade quando aquele empreendimento estiver vivo, com gente morando. Iniciativa privada e poder público andam juntos e é assim que deve ser.
Como a cidade tem se comportado na questão ambiental/sustentabilidade?
GIULIO: Acho que estamos caminhando bem. Como o Fernando comentou, iniciativa privada e poder público têm de caminhar juntos e, nessa questão, a parceria tem dado muito resultado positivo. A cidade tem desafios importantes e, em contrapartida, tem iniciativas relevantes e profícuas nesse sentido. Em 2019, por exemplo, lançamos a campanha Civilidade nas Ruas na AEAARP, em parceria com outras entidades. Já fizemos muitas ações e reunimos muita gente engajada nessas questões. Nós compartilhamos informações com a população de uma forma geral e também investimos em oferecer conteúdo técnico para o nosso associado, para que a nossa forma de produzir também seja positivamente impactada. Se cada um colaborar com alguma coisa, a gente vai muito bem para o futuro.
FERNANDO: A primeira vez que falaram sobre esse tema na AEAARP foi nos anos de 1970. A palavra era ecologia. Com o tempo, o termo foi mudando, assim como a visão das pessoas e o comportamento. O Aquífero Guarani é o nosso grande patrimônio ambiental e é, também, o que nos sustenta. Chegamos a pensar, no passado, que poderia ser para sempre. Hoje, graças ao conhecimento técnico, a gente sabe que não é bem assim. Por isso, precisamos planejar o nosso futuro de forma que a sustentabilidade ambiental não seja uma bandeira ou um slogan. Ela faz parte dos nossos projetos porque nós já desenvolvemos conhecimento para isso e queremos viver com qualidade nessa cidade linda.
O que podemos falar, especificamente, da região central da cidade?
GIULIO: Pessoalmente, eu gosto muito do centro da cidade. Na Associação, sempre que é oportuno, nós falamos sobre isso, em palestras ou na revista Painel. O centro é um exemplo de organização urbanística. O desenho das avenidas que cercam o quadrilátero central e as ruas que compõem esse conjunto urbanístico não aconteceram ao acaso. Foram planejados. Observe: visto de cima, esse quadrilátero se assemelha a um tabuleiro de xadrez, diferentemente de outras grandes cidades, que têm ruas muito estreitas e irregulares em seus centros históricos.
FERNANDO: Isso é interessante porque, veja só, foi essa qualidade urbanística que sustentou os investimentos em construções naquela região por muitas décadas! O centro conta a história do ciclo do café, com os casarões, os teatros, as praças, isso em um período em que os construtores eram basicamente italianos, que chegaram por aqui a partir do final do século XIX. Por isso as construções tinham essa estética da terra deles, com muitos adornos. O centro conta, também, a história da expansão da construção civil na cidade, com os edifícios modernistas, por exemplo. E, veja, tanto eu quanto o Giulio somos engenheiros, eu civil e ele mecânico. Isso sobre o centro foi estando na AEAARP que a gente teve a oportunidade de ver e aprender.
É importante manter esses patrimônios como forma de preservar a nossa história para as próximas gerações? Existe essa preocupação?
FERNANDO: As cidades, normalmente, partem do centro. O nosso modo de ver essa história é esse que a gente falou – do urbanismo, do traçado das ruas, da qualidade e tipo das construções. É evidente que preservar é importante. Mas, para além disso, nós temos de contar essas histórias e valorizá-las.
GIULIO: No Conselho de Preservação do Patrimônio Cultural (CONPPAC), temos dois representantes da AEAARP e a gente defende que a preservação não seja um fim em si. Nós temos de pensar nisso do ponto de vista da continuidade da nossa cidade: vamos ter o que naquele espaço e para quê? O centro e a nossa história têm de nos servir de exemplo e de espaço de uso. Não podemos correr o risco de repetir o que aconteceu em outras cidades, onde o centro foi praticamente abandonado e, só depois, adotaram projetos de recuperação histórica e cultural. Ribeirão tem a oportunidade de seguir valorizando sua história e seus espaços.
Foto: Luan Porto