Correção de rumo

Correção de rumo

Segundo os especialistas, as escolhas da presidente reeleita do Brasil, Dilma Rousseff, para a montagem da equipe econômica, apontam para uma correção de rumo

No ranking do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgado em dezembro do ano passado, Ribeirão Preto figura entre as 15 principais cidades do país — exceção feita às capitais — no que diz respeito ao Produto Interno Bruto (PIB). A produção do município em 2012 está estimada em R$ 20,3 bilhões, resultado que colocou a cidade na frente de oito capitais brasileiras nesse quesito. Apesar de passados dois anos desde a coleta das informações, tempo suficiente para mudanças no cenário econômico, não há como negar que Ribeirão Preto, assim como a região em que está inserida, é uma das principais do país. O desempenho econômico obtido no entorno ribeirãopretano tem extrema importância para o país. Da mesma forma, o cenário da economia brasileira é fundamental para definir o que se pode esperar para Ribeirão Preto.

Os homens fortes da economia


Alexandre Tombini
O presidente do Banco Central ocupa a posição desde o início do primeiro mandato de Dilma Rousseff. Economista formado pela Universidade de Brasília (UnB), é PhD na mesma área pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos. Funcionário concursado do BC desde 1998, foi diretor de Normas e Organização do Sistema Financeiro, diretor de Assuntos Internacionais e de Estudos Especiais do mesmo local. Também atuou, como assessor sênior do diretor executivo e membro da diretoria executiva da Instituição, além da passagem pela representação brasileira do Fundo Monetário Internacional (FMI).





Joaquim Levy
O engenheiro naval de 53 anos é mestre na em Economia pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e doutor na mesma matéria pela Universidade de Chicago. Sua indicação sugere maior rigor fiscal e abandono de manobras contábeis recentes. No primeiro mandato de Lula, Levy ocupou o principal cargo da Secretaria do Tesouro Nacional, entre 2003 e 2006, de onde saiu conhecido como “mãos de tesoura”. Economista bem avaliado no governo, o atual ministro costuma ser bem-humorado e gentil no trato, mas é reconhecido como workaholic e firme no trabalho. Carioca, é casado com uma advogada, é pai de duas filhas.





Nelson Barbosa
Considerado um técnico competente, o novo ministro do Planejamento já atuou na equipe do PT, tanto no governo Lula quanto no primeiro mandato de Dilma, mas em cargos diferentes. Aos 45 anos, Nelson Barbosa ocupou anteriormente cadeiras no próprio Ministério do Planejamento, no BNDES e no Ministério da Fazenda. Barbosa é bacharel em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e PhD pela New School for Social Research. De acordo com interlocutores do governo, o atual ministro sempre teve bom trânsito com a presidenta Dilma. Casado e pai de um filho, o novo ministro é natural do Rio de Janeiro.






Em início de ano pós-eleitoral, os olhos se voltam para as primeiras decisões do Governo Federal. Apesar de ter sido reempossada presidente do país, Dilma Rousseff prometeu mudanças para o segundo mandato ainda durante a campanha. No início de 2015, formalizou a alteração de 23 cargos no alto escalão federal, entre mudanças de cadeiras e novos nomes convocados para os 39 ministérios. Entre as mudanças propostas, uma das mais aguardadas referia-se à nova equipe econômica, anunciada no fim de 2014 e confirmada na chegada de 2015. Nessa área, a cúpula nacional é, agora, formada por Joaquim Levy, como ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, como ministro do Desenvolvimento, e Alexandre Tombini, que permaneceu no principal posto do Banco Central (BC).

A escolha de Levy para a Fazenda, como apontam os principais veículos de informação nacionais, atende às expectativas do mercado brasileiro, uma vez que o engenheiro naval e economista, que já ocupou cargos no mesmo ministério em ocasiões anteriores, tem um perfil mais rigoroso no que diz respeito aos gastos públicos. “Sua assunção ao cargo reflete a necessidade de um ajuste crível nas contas do Governo, uma vez que os gastos em 2014 ficaram acima das receitas em aproximadamente 6% do PIB anual brasileiro, colocando a dívida pública numa trajetória inconciliável com inflação baixa e com a confiança de empresários e de consumidores”, avalia o especialista Alex Luiz Ferreira, que integra o Departamento de Economia da FEA-RP/USP.

Nelson Barbosa, de acordo com Alex, sinaliza a intenção da presidente de equilibrar o custo desses ajustes, promovendo reformas pontuais. O ministro do Desenvolvimento é considerado um técnico competente. Já Alexandre Tombini, na visão do economista, que é especialista em câmbio, representa a continuação das insatisfatórias políticas monetária e cambial. “A recorrente falta de compromisso do BC com o centro da meta nos últimos anos prejudicou a reputação criada pelo órgão em administrações anteriores, o que custou muito alto à população brasileira. A atual política cambial também onera o bolso dos contribuintes”, lista o professor da USP.

Na visão de Alex, o confronto entre a ideologia da presidente e as restrições econômicas dos últimos anos resultou na composição mais pragmática desse time. Porém, ainda é preciso aguardar para saber até que ponto o Governo vai manter a autonomia desses profissionais, já que não há como conciliar popularidade e promessas de campanha com o enfrentamento dos desafios econômicos no curto prazo. Segundo o professor, haverá melhoria nas contas públicas, tanto pela redução dos gastos quanto pelo aumento de receitas, o que significa impostos mais altos. “É possível, ainda, que essas medidas, potencialmente recessivas, gerem meses de atividade fraca e consequente elevação nas taxas de desemprego”, ilustra o economista.

De acordo com os últimos boletins do Centro de Pesquisas em Economia Regional (CEPER) da Fundace, os índices econômicos da região não permitem muito otimismo, especialmente para cidades como Sertãozinho, que tem forte dependência da indústria e, particularmente, do setor sucroenergético. Pela economia mais diversificada, Ribeirão Preto apresenta sinais de enfraquecimento menos dramáticos, apesar de preocupantes. “Os índices de confiança de consumidores e empresários, os quais podem servir de indicadores antecedentes do cenário econômico, apontam para uma melhora marginal, mas ainda consistentes com um cenário de pessimismo”, avalia Alex.

Reflexos para a região
Alex Luiz Ferreira enxerga um cenário cada vez menos favorável para o álcool, tendo em vista a queda do preço do petróleo internacional, mas a economia temporariamente fraca não significa, exclusivamente, notícia ruim. “O momento é propício para optar por transformações internas que melhorem o uso de recursos, buscar, quando há flexibilidade para isso, reposicionar o negócio em diferentes nichos e focar os esforços comerciais na área internacional”, recomenda o economista, destacando o capital humano ribeirãopretano que, com criatividade, pode contribuir significativamente para a sobrevivência das empresas locais e regionais.

Notadamente um dos setores fortes da cidade, a construção civil deve enfrentar um cenário pouco animador neste primeiro semestre de 2015. No entanto, Fernando Junqueira, atual diretor do Sindicato da Indústria da Construção Civil (Sinduscon), de Ribeirão Preto, acredita em uma retomada no médio e no longo prazos. “Acreditamos que, este ano, será possível manter o nível atual do setor, com crescimento de até 0,5%. A fase de ajustes deve ser acompanhada de um aumento de produtividade”, analisa o empresário. Segundo Fernando, o segmento imobiliário, em particular, deve continuar se ajustando às dificuldades do cenário econômico com um número menor de contratações de obras e de novos investimentos. “A perspectiva é de retomada somente a partir do segundo semestre, sem crescimento no valor agregado das construtoras e queda de 2% nos empregos no setor”, prevê o dirigente.

Outro setor forte em Ribeirão Preto, o comércio registrou um crescimento moderado em 2014, resultado também esperado para este ano, já que os consumidores, assim como se repete no Brasil inteiro, estão com um alto nível de endividamento. “A expectativa, porém, é de que a nova equipe econômica encontre alternativas para a redução dos gastos públicos, abrindo espaço para um aumento no consumo”, aponta Fred Guimarães, coordenador do Núcleo de Economia e gerente executivo da Associação Comercial e Industrial de Ribeirão Preto (ACIRP).

Para Paulo César Garcia Lopes, presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Ribeirão Preto (Sincovarp), o sinal amarelo está aceso para este segmento. “O comércio, que já não teve bons desempenhos nos dois anos anteriores, pode sofrer em 2015 porque o consumidor está com o pé no freio, receoso em gastar e assumir riscos”, analisa o presidente, que vê na nova equipe econômica do Governo Federal a intenção de que a prioridade será, primeiro, arrumar a casa e somente depois focar na retomada do crescimento. “O Sincovarp defende a união de forças das entidades representativas da economia, em especial as que lidam com o comércio, para que possamos atravessar este momento difícil”, acrescenta Paulo.

No caso da indústria, Fred Guimarães prevê um ano mais complicado, mas, ainda assim, com margem para uma leve recuperação. “O BC tem permitido que o câmbio flutue mais livremente, visto que o dólar tem se valorizado diante do real, o que favorece as indústrias exportadoras”, aponta o diretor executivo. O diretor titular do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) de Ribeirão Preto, Guilherme Feitosa, afirma que o setor foi um dos que mais sofreram em 2014, e não acredita em mudança no ano que começou agora. “A indústria é muito penalizada por aquilo que se convencionou chamar ‘custo Brasil’, que inclui alta carga tributária, deficiência na infraestrutura e mão de obra pouco qualificada”, lista o diretor.
Apesar do cenário pouco favorável, é sempre possível, segundo Feitosa, encarar as crises como oportunidades.

“Nesse momento, o empresário pode repensar sua estratégia e fazer mudanças. Na crise, o foco passa pela redução de custos, por novos fornecedores, entre outras medidas”, acrescenta. Em Ribeirão Preto, é esperada estagnação ou retração da produção, assim como deve acontecer em todo o país. “Todavia, alguns grupos estão se movimentando e tomando ações para se tornarem mais competitivos e enfrentar os desafios. Nesse sentido, viu-se a recente fusão entre Dabi Atlante e Gnatus, gigantes da área de saúde, sediadas em Ribeirão Preto”, exemplifica Guilherme, ressaltando, ainda, que a viabilização do aeroporto internacional de cargas na cidade também poderá atrair novos investimentos e deixar as indústrias instaladas em toda a região mais competitivas. Para o diretor, as indústrias de software, de saúde e de bebidas e alimentos devem vencer os desafios com mais facilidade.

As expectativas em relação à indústria sucroalcooleira já não apontam para facilidades. De acordo com Antonio Eduardo Tonielo Filho, presidente do Centro Nacional das Indústrias do Setor Sucroenergético e Biocombustíveis (CEISE Br), não dá para esperar por mudanças para o setor em 2015, mas espera-se o início da inversão do cenário recessivo. “O Governo Federal tem se mostrado disposto a tomar algumas medidas para viabilizar a retomada da cadeia sucroenergética, como o aumento de etanol anidro na gasolina, de 25% para 27,5%, e a volta da aplicação da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) sobre a gasolina”, enumera o presidente.

Para o empresário, o setor sucroenergético precisa, no curto prazo, de medidas como incentivo à cogeração de energia elétrica através da biomassa da cana e fomento às montadoras de veículos, para que desenvolvam modelos flex mais eficientes para o uso do etanol. “Mesmo que essas medidas sejam aplicadas imediatamente, o setor levará algum tempo para se recuperar devido aos graves efeitos da crise sofridos até aqui. Ainda, se o etanol não for inserido na matriz energética brasileira, será difícil retomar a confiança para que novos e grandes investimentos aconteçam”, garante Tonielo Filho.

Considerando o agronegócio como um todo, a aposta de Marcos Matos, diretor executivo da Associação Brasileira do Agronegócio da Região Ribeirão Preto (ABAG/RP), é de crescimento em uma porcentagem próxima de 2,6%. “O setor agro é estratégico para a economia brasileira e, especialmente em 2015, pode ser o grande condicionante do seu desempenho”, acrescenta o diretor. Representando 23% do PIB nacional, segundo Marcos, este pode ser o único setor com crescimento expressivo este ano, diante das dificuldades enfrentadas pela indústria.  O diretor da ABAG/RP, no entanto, destaca que o Brasil precisa de um projeto de longo prazo, com políticas de Estado que simplifiquem o sistema tributário e promovam investimentos em infraestrutura, um dos maiores gargalos do chamado “custo Brasil”, bem como os procedimentos burocráticos.

“Somado a isso, o Brasil necessita implantar políticas econômicas alicerçadas na estabilidade e na transparência para a formação de um ambiente favorável aos negócios e que atraia novos investimentos, por meio do maior engajamento entre setor público e privado”, acrescenta Marcos.  

Sobre o agronegócio, Marcos Matos elogia a escolha da senadora Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). “Ela é uma conhecedora das especificidades do agronegócio e das ações que o setor reivindica junto ao Governo Federal, que englobam engajamento de outros ministérios”, opina o diretor. Segundo Marcos, o desafio da senadora será conseguir engajar vários setores em torno de políticas para o desenvolvimento do agronegócio. Somado a isso, espera-se uma reestruturação do próprio Ministério, que ainda possui excessos de normativas, falta de recursos e de pessoal.

O cenário para a educação
Uma das bandeiras da campanha de Dilma Rousseff para a reeleição, assim como da oposição, a Educação está entre as pastas que estiveram em evidência neste início de 2015. O Ministério foi o mais afetado pelo corte dos gastos não obrigatórios já anunciados, atingindo uma restrição de R$ 586,83 milhões mensais, o que significam mais de R$ 7 bilhões em um ano. “O que entristece é ver a Educação sendo usada como ferramenta eleitoral ou de marketing, como aconteceu, inclusive, no discurso de posse, e dias depois sofrer o maior corte entre os realizados este ano”, opina João Alberto de Andrade Velloso, presidente do Sindicato das Escolas Particulares de Ribeirão Preto, diretor do Colégio Anchieta e vice-reitor do Centro Universitário Barão de Mauá.

Apesar disso, a ascensão de Cid Gomes, ex-governador do Ceará e ex-prefeito de Sobral, ao Ministério da Educação deixou o dirigente esperançoso. “Em seus cargos anteriores, conseguiu alcançar bons resultados em avaliações como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), colocando seu município em primeiro lugar”, recorda Velloso, que atua na Educação há 43 anos. Os primeiros discursos do novo ministro agradaram por conta dos compromissos assumidos, como a garantia de atenção especial ao Ensino Médio.

“Esta etapa é a que apresenta a maior evasão escolar. Para mim, isso é culpa do currículo fechado, extremamente focado em exames para ingresso no curso superior, e menos na formação integral do aluno”, justifica o presidente do Sindicato. Para ele, resta saber se Cid Gomes conseguirá trabalhar com a independência necessária dentro do contexto do Governo Federal.

Texto: Luiza Meirelles







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