
Higiene do sono
A adoção de algumas medidas simples pode ajudar quem vem enfrentando dificuldade para dormir
A pandemia de Covid-19 tem tirado o sono de muita gente. Literalmente. Os relatos de problemas para dormir, que já eram bem frequentes nos últimos tempos, vêm aumentando desde meados do ano passado. Segundo a neurologista Marília Pereira Graner (CRM: 164.058), a mudança de hábitos de vida gerada pela crise epidemiológica está diretamente relacionada com essa questão. “O distanciamento social e a adoção do sistema home office por grande parte das empresas elevaram o nosso tempo de exposição às telas (celular, computador e TV). Hoje, nosso trabalho, nosso lazer e nossas interações estão, basicamente, restritas aos aparelhos eletrônicos e eles são vilões do nosso sono, especialmente se os utilizamos antes de dormir. Além de reduzir a nossa produção de melatonina (hormônio relacionado ao sono), esse excesso aumenta os níveis de ansiedade e de apatia — falta de motivação para realizar atividades concretas da vida diária. Com isso, muitas pessoas também se renderam ao sedentarismo — ainda que haja excelentes opções de exercícios físicos para se realizar em casa — e, nesse contexto, a falta de atividade física regular é um elemento que contribui para a má qualidade do sono”, explica.
As consequências
As consequências da privação do sono não são poucas e podem ser observadas nos âmbitos físico, psicológico e social. Segundo a especialista, mesmo quando a privação de sono ocorre por um curto período — ainda que seja uma noite de sono mal dormida — já é suficiente para desencadear irritabilidade, impulsividade, dificuldade de concentração e problemas relacionados à memória. “Nesse contexto, a pessoa manifesta uma redução da capacidade de julgamento crítico, reações emocionais descontroladas e maior propensão a acidentes domésticos e de trânsito”, explica. Já os distúrbios de sono crônicos, que levam a uma privação contínua do sono, podem atuar como agravantes ou geradores de doenças graves como hipertensão, diabetes, depressão, obesidade e doenças neurodegenerativas, como a doença de Alzheimer.
Em busca de solução
Muitas das queixas relacionadas ao sono podem ser resolvidas com a adoção de medidas simples de higiene do sono. Dra. Marília compartilha algumas dicas que, colocadas em prática de forma regular, geram bons resultados:
• Mantenha o quarto escuro, calmo, confortável e bem ventilado, com uma temperatura agradável durante toda a madrugada • Nas três horas antes de dormir, não faça refeições pesadas • Crie uma rotina de dormir e de acordar, sempre nos mesmos horários • Evite bebidas estimulantes como café, chás e refrigerantes após as 18h
• Pratique atividade física regularmente — no mínimo cinco dias por semana, com duração de, pelo menos, 30 minutos por dia — e, se possível, exercite-se no período da manhã • Caso tenha que se levantar à noite, não se exponha a iluminação forte • Não fique na cama caso não esteja conseguindo dormir (ou voltar a dormir). Se isso acontecer, evite ficar conferindo as horas no relógio. Adote atividades que promovam relaxamento (conforme suas experiências anteriores) e, só então, volte para a cama
• Não se exponha aos eletrônicos (celular, computador, TV) pelo período de uma hora antes de dormir e, além disso, não utilize tais dispositivos no quarto. É importante que o seu cérebro perceba que o quarto é ambiente para dormir. Caso você use a função despertador no celular, opte por programa-lo com antecedência e mantenha-o em ‘modo avião’ durante o sono.
Se o problema persistir, o recomendado é buscar a orientação de um especialista. “É essencial que seja feita uma entrevista detalhada em consulta médica e que seja considerada a necessidade de exames complementares para investigação e tratamento. Não cometa o equívoco de se automedicar. O sono é um dos pilares de saúde mais importantes. Sempre que há uma alteração, precisamos tratar as causas do problema e não apenas os sintomas”, finaliza.
Ronco pode ser alerta
Um dos distúrbios de sono mais frequentes e, potencialmente, mais graves, é a Síndrome da Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS). Trata-se de uma condição caracterizada por períodos rápidos de “paradas respiratórias” durante a noite, normalmente acompanhadas por roncos. “Esses momentos de interrupções involuntárias da respiração levam à redução da oxigenação do sangue e aos ‘microdespertares’, que, habitualmente, não são percebidos pelos portadores da doença. Tais eventos promovem uma desregulação dos hormônios relacionados ao sono, incluindo o aumento de liberação de adrenalina e cortisol. Diante desse quadro, é comum observarmos o aumento da pressão arterial, o aumento da resistência à insulina, um maior risco de arritmias cardíacas e, consequentemente, uma maior chance de eventos como infarto e Acidente Vascular Cerebral, o AVC”, descreve Dra. Marília, lembrando que a SAOS tem uma relação íntima com a obesidade e é uma condição potencialmente tratável.