Informação contra o preconceito

Informação contra o preconceito

Promover a conscientização, o respeito aos direitos civis fundamentais conquistados e a criação de políticas afirmativas focadas em combater discriminação fazem parte da luta da comunidade LGBTQIAPN+

Em 28 de junho, celebra-se o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAPN+. A escolha da data é uma referência histórica à Rebelião de Stonewall, que aconteceu nos Estados Unidos. Nos anos 60, era frequente a invasão de policiais em bares gays de Nova Iorque. Em resposta à onda de agressões e prisões que aconteciam nesses locais, ativistas se reuniram em frente ao bar Stonewall Inn, no dia 28 junho de 1969, e atiraram pedras contra os oficiais. Em 1970, os norte-americanos se reuniram novamente, no mesmo local, para a primeira Parada do Orgulho LGBT do mundo. No Brasil, a primeira marcha contou com cerca de 2 mil pessoas, na Avenida Paulista, em São Paulo, em 1997.

 


De lá para cá, houve avanços significativos, mas, a luta dessa comunidade por conscientização, pelos seus direitos e, principalmente, por respeito, continua. Na entrevista a seguir, Beatriz Paccini, sócia advogada de Brasil Salomão e Matthes Advocacia, discorre sobre o tema. Especialista em Direito Digital e Proteção de Dados Pessoais, além de ser mestranda na Faculdade de Direito de Ribeirão Preto – USP, Beatriz foi Vice-Presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Gênero da 12 Subseção (2020/2021) da 12ª Subseção da OAB SP.

 

Celebrou-se, recentemente, o Dia do Orgulho LGBTQIAPN+. Podemos dizer que existem motivos para comemorar?

 

Poderia destacar alguns avanços conquistados nos últimos anos? Sim, há motivos para comemorar. Nos últimos anos, tivemos avanços importantes, como a retirada da homossexualidade e da transexualidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID) pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A própria criação do Dia do Orgulho, celebrado mundialmente, é um sinal de conquista, trazendo como objetivos principais a conscientização da população e o combate à discriminação e ao preconceito frente à comunidade LGBTQIAPN+. Ainda, a cada ano que passa, mais essa data tem sido comemorada pelo Poder Público, setor privado e sociedade civil, o que muito contribui para novos avanços.

 

Como a evolução do Direito tem contribuído para essa causa?

 

A evolução do Direito tem contribuído, em especial, no combate à discriminação e à violência contra a comunidade LGBTQIAPN+. 

 

Quais são os principais direitos assegurados?

 

Como principais direitos assegurados, temos o reconhecimento do casamento homoafetivo, a criminalização da LGBTfobia pela equiparação ao crime de racismo, o fim da restrição da doação de sangue por homens gays, o reconhecimento da aplicabilidade da Lei Maria da Penha a mulheres transexuais e travestis, o direito à adoção por casais homoafetivos e a possibilidade de alteração de nome e gênero no registro civil diretamente nos cartórios. Contudo, a maioria desses direitos foram reconhecidos por meio de decisões judiciais, de modo que seria importante a ratificação dessas conquistas pelo Poder Legislativo, por meio de leis específicas.

 

Diante de uma violação desses direitos, quais são os passos que a vítima deve seguir para se resguardar?

 

Caso a pessoa seja vítima de crime de LGBTfobia, deve fazer o boletim de ocorrência em qualquer Delegacia, sendo que, se o caso não envolver estupro ou homicídio, a denúncia pode ser feita pela Delegacia Eletrônica. No Estado de São Paulo, existe, inclusive, a Delegacia da Diversidade funciona on-line. Ainda, a vítima pode fazer a denúncia por telefone, pelo Disque 100 ou pelo Disque Denúncia 181. Também é importante que ela procure um advogado ou um defensor público para lhe assessorar.

 

 

A pessoa que infringe essas diretrizes por ser penalizada? Qual seria a pena?

 

Vai depender do caso. Se a situação envolver crime de LGBTfobia, o infrator pode responder pelas penas previstas na Lei do Racismo (Lei 7.716/89), que prevê pena de reclusão e de multa, a ser calculada de acordo com a conduta do infrator.

 

Tendo em vista que a internet tem sido foco de homofobia, quais os cuidados que a vítima deve ter para assegurar seus direitos?

 

É importante lembrarmos que a internet não é uma terra sem lei. Assim, a prática de crimes e violação de direitos pelo ambiente virtual também sujeita o infrator a responder pela sua conduta, conforme ordenamento jurídico em vigor. Para que possa buscar seus direitos, é importante que a vítima faça um registro da página (print) e copie seu URL ou link. É também possível que a vítima se dirija a um cartório de notas e solicite uma ata notarial, que será elaborada pelo tabelião com a descrição fiel do fato e poderá servir como prova em eventual processo judicial. A vítima também poderá fazer o boletim de ocorrência, conforme já explicado.

 

A vítima de LGBTfobia também pode buscar indenização pela violação de seus direitos?

 

Pode sim. Independentemente de ser ou não considerada crime, é importante ressaltar que uma conduta discriminatória pode sujeitar o responsável a indenizar a vítima pelos danos materiais e morais que causar. Ainda, caso a pessoa tenha seus direitos negados, como, por exemplo, de alteração de nome e gênero no registro civil diretamente no cartório, sem um justo motivo, poderá exigir seu cumprimento pela via judicial.

 

 

Hoje, ainda falta a divulgação de informações sobre o tema?

 

Apesar de todos os avanços, ainda há muito a ser feito. Infelizmente, a divulgação de informações não alcança toda a sociedade brasileira, sendo que, em algumas regiões e espaços, é possível observar o apagamento dessa discussão. Assim, nem todos têm conhecimentos dos direitos já conquistados, tampouco procuram se conscientizar sobre o tema, o que contribui para a discriminação e a violência.

 

Como a sociedade pode avançar mais na luta contra a LGBTfobia?

 

Acredito que o acesso à informação e a discussão de pautas que busquem a conscientização e a sensibilização das pessoas sobre a luta da comunidade LGBTQIAPN+ muito contribuem para a diminuição da LGBTfobia. Isso pode acontecer em diferentes espaços, como no Poder Público, com a construção de políticas públicas e leis específicas à comunidade LGBTQIAPN+, nas empresas, com a criação de ambientes mais inclusivos e diversos, e nas escolas, com o debate sobre sexualidade e gênero. Ainda, a família exerce um papel fundamental, pois um núcleo familiar que acolhe e reconhece seus membros como eles são, sem discriminação ou preconceito, fortalece a luta contra a LGBTfobia. 


Foto: Luan Porto

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