Mais Tempo Para Ser Mãe

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Por questões médicas ou profissionais, muitas mulheres buscam o congelamento de óvulos para preservar a fertilidade e viver a maternidade no momento considerado mais adequado

O congelamento de óvulos é uma prática que chama a atenção e ganha espaço entre as brasileiras. Com a visibilidade que as mulheres têm conquistado no mercado de trabalho e na vida, muitas postergam a maternidade. Algumas, também, procuram a ajuda de especialistas em reprodução humana por questões médicas.

Além de permitir a gravidez na mulher que, por algum motivo, tenha dificuldade de engravidar, o congelamento de óvulos oferece a oportunidade de a pessoa escolher quando viverá a gestação, mesmo se o relógio biológico já não estiver tão atualizado. “O desenvolvimento de técnicas que propiciam uma sobrevida muito boa dos óvulos associado à divulgação da importância de preservar a fertilidade contribuíram para o aumento na procura dessa técnica. A divulgação de que a mulher começa a diminuir a fecundidade aos 30, 35 anos, pois seus óvulos ‘envelhecem’ junto com ela, ajudou a criar a consciência de que guardar os óvulos é importante, pois eles mantêm a mesma idade que tinham quando foram congelados”, comenta Marcos Moura, ginecologista especialista em reprodução humana da Clínica Matrix.
“O desenvolvimento de técnicas associado à divulgação da importância de preservar a fertilidade contribuíram para o aumento pela procura do congelamento”, diz Marcos Moura
Em Ribeirão Preto, segundo especialistas de três clínicas conceituadas da cidade — Centro de Fertilidade de Ribeirão Preto (Ceferp), Clínica Matrix e Instituto de Reprodução Humana - Clínica Ana Bartmann —, houve, também, um aumento pela procura de congelamento de óvulos no município. Para esses especialistas, o adiamento da gestação e a procura por este procedimento surgem em razão da carreira profissional, das informações sobre o método, que atualmente estão mais fáceis de serem encontradas, da divulgação da importância de se preservar a fertilidade ou por problemas de saúde. 

De acordo com a doutora Camilla Vidal, especialista em reprodução humana do Centro de Fertilidade de Ribeirão Preto (Ceferp), atualmente o que vem crescendo é o congelamento de óvulos por motivo social. Ou seja, muitas mulheres estão em uma idade de estabilização da carreira ou não têm parceiros com quem desejam ter filhos no momento. Assim, planejam a gestação para o futuro e adiam a maternidade. “Nesse cenário, orientamos que seja feito o congelamento, de preferência, antes dos 35 anos, para que seja possível obter óvulos em maior quantidade e melhor qualidade, aumentando as chances de nascimento de um bebê por meio desses óvulos no futuro”, afirma a médica.  
De acordo com a especialista, atualmente, o crescimento do congelamento de óvulos se dá em razão de um questão social
Segundo a especialista Ceferp, o procedimento também é aconselhado em casos de problemas de saúde. “O congelamento de óvulos também pode ser indicado caso a paciente vá fazer algum tratamento que possa trazer uma lesão ao ovário, como uma radioterapia pélvica, ou então quimioterapia ou cirurgia ovariana, que também possa interferir na reserva ovariana”, explica a médica. 

No Brasil, segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a reprodução humana assistida cresceu 18,7% em 2018. Os números também mostram que o Estado de São Paulo foi o responsável por quase a metade dos procedimentos. Não há números oficiais de óvulos congelados no país, pois a Anvisa não contabiliza esses dados com objetivo de prolongar a “janela de oportunidade” das mulheres para a maternidade. O que é tabulado e monitorado pela agência é apenas a quantidade de embriões congelados. 

Além desses dados, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que um em cada dez casais em idade fértil tem algum tipo de dificuldade para engravidar. No Brasil, 8 milhões de casais se enquadram nessa estimativa. 

Procedimento
Para que seja feito o congelamento de óvulos, a paciente deverá passar por uma estimulação ovariana controlada. Segundo Camilla Vidal, o processo se inicia na menstruação, normalmente entre o primeiro e o terceiro dia do ciclo. “A paciente recebe hormônios, que costumam ser injetáveis, para estimular o crescimento dos folículos. Esse período dura em média de 10 a 12 dias, durante os quais serão realizados ultrassons transvaginais para monitorar o crescimento dos folículos. Quando eles atingem o tamanho adequado, é realizada a coleta dos óvulos”, explica a médica. 

A coleta é feita por meio de um ultrassom transvaginal: o especialista introduz uma agulha com um guia ultrassonográfico que entra no folículo, aspira o líquido e o óvulo. “Os óvulos maduros colhidos nesse procedimento são congelados e armazenados através da vitrificação por tempo indeterminado”, completa a especialista. 

De acordo com Marcos Moura, não há um limite de óvulos para serem congelados. “Deve-se congelar a maior quantidade possível de óvulos obtidos em cada punção ovariana”, afirma. Além disso, o especialista também explica que não há outra maneira de realizar o procedimento. A única coisa que varia são as medicações. “O que é variável são as medicações que podem ser usadas, as quais são selecionadas caso a caso. Dependendo de exames prévios é que se decide quais são melhores para cada paciente”, diz Marcos. 

Já a especialista Ana Karina Bartmann, diretora médica do Instituto de Reprodução Humana - Clínica Ana Bartmann, explica que se pode congelar óvulos maduros, imaturos ou mesmo o tecido ovariano. “O mais comum é fazermos o congelamento de óvulos maduros, em que se tem maior experiência clínica. Congelamos o maior número possível. Isso vai depender da resposta da paciente. Idealmente, são mais de 15 óvulos para se ter uma chance real de gravidez no futuro”, comenta a médica. 
A especialista Ana Karina Bartmann diz que o procedimento é indicado para pacientes que são submetidas a tratamentos prejudiciais aos ovários ou para as que desejam adiar a maternidade
De acordo com a médica, o procedimento é indicado para pacientes que são submetidas a situações prejudiciais aos ovários, como quimioterapia, doenças reumatológicas, transplante de medula, e, também, para mulheres com endometriose ou que desejem adiar a gravidez. “Devemos lembrar, no entanto, que o congelamento de óvulos não é uma garantia de gravidez. A paciente está ‘congelando’ um potencial reprodutivo sem qualquer garantia de sucesso”, explica. 

A especialista completa dizendo que não há um limite de tempo para que os óvulos fiquem congelados. “Não existe essa resposta. É provável que os óvulos possam permanecer congelados indefinidamente”, afirma. 

Os especialistas em reprodução assistida recomendam que a mulher que deseja realizar o procedimento congele seus óvulos até os 35 anos, pois, nessa idade, eles são mais novos e possuem mais qualidade. Apesar disso, a idade média das mulheres que têm procurado o serviço gira em torno de 37,7 anos.

Efeitos e riscos
Como qualquer outro procedimento médico, o congelamento de óvulos também pode trazer riscos para a paciente. Apesar disso, Camilla Vidal diz que o processo de estimulação ovariana costuma ser muito tranquilo e rápido. “Os principais efeitos colaterais podem ser semelhantes a uma TPM, como um pouco de dor nos seios, desconforto abdominal, sensação de peso e inchaço abdominal.” Normalmente, segundo a especialista, esses sintomas são leves e podem ser resolvidos com medicações via oral. “Existem riscos, mas são em casos de exceção, como a Síndrome de Hiperestímulo Ovariano, em que a paciente tem uma grande quantidade de hormônios circulantes, fazendo com que ela tenha sintomas mais exacerbados, como náusea, vômito, acúmulo de líquido abdominal, que podem trazer necessidade de punção ou internação. Esse é um procedimento seguro quando feito por um profissional capacitado e habilitado, bem supervisionado, com ajuste de medicação, baseado na resposta do ovário de cada paciente”, completa.

Descarte e doações 
De acordo com os especialistas, os óvulos congelados podem ser descartados a qualquer momento ou doados para pesquisa, mas, no Brasil, a condução de material genético para estudo é um pouco mais difícil. Além disso, é possível doar esses óvulos para outra paciente, casal ou família que não possa engravidar com os próprios óvulos. A doação é pautada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e deve ser anônima. Então, a doadora e a receptora não conhecem a identidade uma da outra. 

Experiências de Vida
A ortopedista Carla Teresa Barbosa de Oliveira, de 34 anos, soube do método por meio do ginecologista, que sugeriu que ela fizesse o procedimento durante uma consulta de rotina. “Comecei a ler sobre o assunto na internet e em livros. Decidi realizar o procedimento quando percebi que teria de adiar os planos de engravidar e a idade estava se aproximando do limite ideal, os 35 anos”, diz.
Para Carla, a melhor parte do processo de congelamento foi quando ficou sabendo que a técnica havia dado certo
Ela conta que durante a preparação para o procedimento usou algumas medicações injetáveis e orais, fez diversos exames de sangue e ultrassonografias, além de ter dado uma pausa nas atividades físicas por recomendação médica. Para Carla, a melhor parte do processo foi o final, pois é o momento em que as pessoas ficam sabendo se o congelamento deu certo. Já o momento que Carla classifica como difícil foi ter de adaptar os horários de trabalho aos dos exames, que são frequentes. “O uso de medicações em horários específicos necessita de atenção especial, também. Usei o despertador para me lembrar de aplicar medicações durante o dia e durante a madrugada”, conta.

Na hora de realizar o procedimento, de acordo com Carla, foi bem tranquilo. “Dormi em razão da anestesia. Não senti dor alguma, nem durante e nem depois. A rotina foi voltando ao normal gradativamente. O importante é seguir as orientações médicas”, finaliza.

Já a veterinária e especialista em ciência animal Janielen da Silva, de 30 anos, além da questão da idade, optou pelo congelamento de óvulos em razão de problemas médicos. “Há mais ou menos cinco anos, descobri que tinha um cisto no ovário esquerdo. Por ter sido descoberto de forma tardia, tive de fazer uma cirurgia de retirada. A partir disso, comecei a fazer exames periódicos que me indicaram o crescimento de outro cisto no ovário direito. Pelo risco de perda de ambos os ovários, resolvi pelo procedimento de congelamento de óvulos para aumentar as chances de ser mãe no futuro. Além do problema de saúde, a idade também teve grande influência na decisão”, relata Janielen.
Problemas nos ovários e a vida profissional fizeram com que Janielen buscasse pelo procedimento
Como médica veterinária, ela já conhecia a técnica e as vantagens relacionadas ao congelamento. Sendo assim, segundo Janielen, a escolha foi feita para aumentar as chances de gravidez no futuro. 

Para ela, a pior parte do procedimento foi a aplicação contínua e diária dos hormônios e a pouca resposta do ovário em relação à medicação. A melhor parte veio quando o corpo começou a responder às doses maiores de hormônios, dando a quantidade mínima de oócitos para a coleta. 

Apesar de alguns contratempos, Janielen recomenda o procedimento para mulheres que tenham problemas, ou até para as que desejam adiar a gestação. “Mesmo com a dificuldade durante a aplicação diária dos hormônios, essa é uma opção que vale a pena ser investida, principalmente para mulheres que tenham problemas ou riscos de doenças no aparelho reprodutivo, ou até mesmo que estejam em idades de risco para redução da viabilidade de fecundação dos óvulos. Além disso, a realização da técnica nos dá a chance de escolhermos o momento certo de termos nossos filhos, já que a vida profissional e a carreira têm tomado bastante tempo de nossas vidas”, finaliza a veterinária.

Texto: Gabriela Maulim

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