
NADA SERÁ COMO ANTES
Novos hábitos, novos costumes e o ‘novo normal’: que mudanças a sociedade deve sustentar após a pandemia do novo coronavírus
Sair para as compras no supermercado com máscara. Passar álcool em gel antes de pegar o carrinho. Chegar em casa e tirar os sapatos. Abrir as sacolas e lavar todas as embalagens. Tirar a roupa e tomar banho. Pronto, o ritual recomendado durante a pandemia do novo coronavírus foi cumprido com sucesso. Mas será necessário manter esses hábitos quando a Covid-19 passar, estabelecendo um “novo normal”?
Segundo especialistas, o atual cenário pode promover transformações individuais ou coletivas, alterando rotinas e hábitos. Para o historiador Leandro Karnal, três acontecimentos aceleram a história: guerras, pandemias e revoluções, provocando mudanças irreversíveis. “Nós estamos vendo a história mudar tão rapidamente, que, há três meses, se tantas pessoas entrassem de máscara num prédio, seriam detidas por tentativa de assalto. Hoje, quem não está de máscara é visto como infrator", afirmou em entrevista à CNN Brasil.
Enquanto o historiador identifica a possibilidade de mudanças no comportamento humano durante e depois da pandemia, os primeiros reflexos de uma nova realidade já são percebidos em Ribeirão Preto. Com a abertura parcial de atividades comerciais na cidade, é possível notar que, apesar de ainda haver aglomeração em determinados locais, lojistas e consumidores estão se transformando.
Segundo Paulo César Garcia Lopes, presidente do Sindicato do Comércio Varejista de Ribeirão Preto (Sincovarp) e presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) Ribeirão Preto, a pandemia já está redefinindo hábitos. “Além de fazer com que todos fiquem mais atentos às questões de saúde e a protocolos sanitários, a pandemia está fazendo com que olhemos com mais cuidado para as outras pessoas e para quem faz parte dos grupos de risco, em especial idosos, gestantes e pessoas com doenças pré-existentes. Os acontecimentos estão cada vez mais colocando o ser humano no foco das decisões. A humanização do varejo já era uma tendência e se consolidou com essa nova realidade”, pontua.
Ainda de acordo com Paulo, o atual cenário fez com que o comércio precisasse se reinventar, buscando novos caminhos para atender à nova demanda da população. “Está surgindo um novo varejo, muito mais conectado às novas tecnologias. Além de precisar entender o novo comportamento do consumidor de forma a proporcionar experiências de compra que fidelizem os clientes, um dos maiores desafios do setor lojista é equilibrar o varejo físico com o varejo on-line, para que um complemente e alavanque o outro, reduzindo custos e aumentando resultados. Tudo isso levando em conta os protocolos sanitários definidos pelas autoridades em saúde, afinal, também se busca o equilíbrio entre atividade econômica e proteção à vida e prevenção à Covid-19”, destaca.
Essa interação entre os mundos real e virtual será determinante no mundo pós-pandemia. Segundo a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm), os consumidores compraram 30% a mais na internet em abril na comparação com março. A estimativa é que, durante o atual período de isolamento social, o e-commerce tenha arrebatado ao menos 4 milhões de novos clientes, que devem manter o hábito das compras on-line depois. “É muito verdade que nem todos os lojistas estavam preparados pra essa mudança tão grande e em tão pouco tempo. Mas, dessa crise, veio a oportunidade para que se modernizem e procurem melhorar. Há muitos lojistas à moda antiga que estão tendo de abrir a cabeça e ampliar o campo de visão. É uma grande oportunidade para se promover um grande salto de qualidade no varejo”, conclui Paulo.
E não só a relação entre consumidores e comerciantes deve mudar, mas, também, o modelo profissional de muitos setores. Segundo estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o trabalho de casa (chamado home office) poderá atingir 22,7% das ocupações do Brasil, correspondendo a mais de 20 milhões de pessoas.
Universos particulares
Segundo Rosangela Alves da Silva Guerrera, psicóloga e membro filiado da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Ribeirão Preto, fatos marcantes, negativos ou positivos, são experiências que colocam indivíduos diante do inusitado, do novo e, por isso, desconcertante. “Contudo, não necessariamente nos transformam”, pontua Rosangela. Segundo ela, mudanças bruscas e perda da rotina, além de mudanças ocorridas na vida de quem lida diretamente com a Covid-19, como profissionais de saúde, favorecem a negatividade, mas não há receita a seguir para enfrentar a crise causada pelo novo coronavírus. “Estamos em pleno processo de transição, vivenciando intensamente a pandemia, no meio de uma crise sem precedente, portanto, sem memória que possa nos amparar afetivamente. Para nosso desenvolvimento psicológico, é importante enfrentar e tolerar esse momento, buscar caminhos, aberturas, aprender com essas experiências tão traumáticas algo mais sobre nós mesmos”, reflete a psicóloga.
Ainda de acordo com a especialista, o impacto de um período de medos e incertezas, como uma pandemia, é recebido de forma particular. “As pessoas ficam sensibilizadas pelas notícias e se mantêm informadas, cuidam-se, levam a sério o distanciamento social, evitando contato físico, usando máscaras, seguindo todos protocolos de higiene sugeridos pelos órgãos de saúde e necessários para se protegerem e protegerem uns aos outros. Há um outro grupo de pessoas, contudo, que vivencia esse momento de modo bem diferente e que, apesar dos fatos, das estatísticas, das notícias do mundo todo sobre esse momento de calamidade, não acredita na letalidade do vírus. Nesse caso, há uma negação da realidade. A negação é um processo psíquico, um recurso da mente para lidar com o inesperado”, explica.
POSSÍVEL “NOVO NORMAL”
• Uso de máscara quando contaminado por algum vírus, para evitar a transmissão
• Uso frequente de álcool em gel
• Lavagem das mãos mais atenta
• Aumento do consumo por e-commerce
• Maior distanciamento em locais públicos
• Aumento do trabalho em home office
• Higienização de compras