Prejuízo a longo prazo

Prejuízo a longo prazo

Professor José Aparecido Silva comenta dificuldades e consequências da pandemia de Covid-19 para alunos e profissionais da educação no país

Mais de um ano após a adoção das medidas de isolamento social em todo o país, motivadas pela pandemia da Covid-19 que chegou oficialmente ao Brasil em fevereiro de 2020, estudantes e profissionais das redes pública e privada continuam na incerteza quanto à retomada das aulas presenciais, frente à possibilidade constante da adoção de novas restrições. Em Ribeirão Preto, as escolas particulares iniciaram a reabertura na segunda-feira, dia 5 de abril, após publicação de decreto estadual que estabelece a educação como serviço essencial. Na rede pública, porém, a Justiça do Trabalho suspendeu a volta às aulas, a pedido do Sindicato de Servidores Municipais. Segundo a Secretaria da Educação, as atividades seguem de forma remota até maio, quando o secretário Felipe Elias Miguel acredita que parte dos professores e funcionários acima de 47 anos já estarão vacinados. O professor José Aparecido da Silva, mestre e doutor em Psicologia pela USP e colunista do Portal Revide, discorre sobre o momento conturbado para a educação nacional.

Na sua opinião, qual seria o momento certo e como deve ser a volta às aulas presenciais? Entendo que as escolas nunca deveriam ter fechado. As evidências consideradas pelos dirigentes para tomar a decisão de fechar as escolas foram baseadas em dados de outros vírus respiratórios, como os da gripe, onde as crianças tem papel fundamental na transmissão. As evidências acerca do coronavírus e seu processo de transmissão mostram que crianças e jovens têm baixo risco para consequências sérias e duradouras relacionadas à Covid-19. A testagem comunitária demonstrou um número significativo de crianças assintomáticas. Além disso, medidas adotadas por escolas de diferentes países e comunidades foram exitosas em mitigar a disseminação da Covid-19. O correto seria termos um conhecimento maior para decidir o retorno do modelo presencial, mas, apesar de 15 meses de pandemia, ainda estamos em processo contínuo de atualização, o que nos impossibilita de fazer afirmações definitivas sobre o assunto.

 

Entre as regras em Ribeirão Preto, estão protocolos como a limitação de até 35% nas salas e a divisão dos alunos em grupos. Você considera que essas são medidas efetivas?

São boas medidas. Em adição a elas, as escolas deveriam possuir uma força-tarefa que considera as medi - das comportamentais, que são as ferramentas mais preciosas para mitigação da transmissão do vírus: com uma comunicação de risco clara para alunos, pais e funcionários de toda comunidade; o ensino da necessidade de práticas higiênicas, como lavar as mãos e evitar tocá-las no próprio rosto; o uso contínuo de máscaras; o distanciamento físico e o lockdown na comunidade quando a letalidade do vírus alcançar índices muito elevados. Ademais, recomenda-se testagem, testagem e testagem. Não é exagero, mas uma necessidade de primeira ordem.

Como você avalia as experiências internacionais relativas à reabertura das escolas no período de pandemia até o momento?

Até onde tenho conhecimento, estudos realizados em países como Suécia, Noruega, França, China, Grécia e em vários estados norte-americanos mostraram que a infecção nas crianças abaixo de dez anos foi significativamente menor quando comparada com os adultos. Considerando esses dados, a Sociedade Francesa de Pediatria destacou que as consequências do fechamento das escolas são de múltiplas facetas: econômicas, educacionais e de saúde. Particularmente, destaco que, após um ano de fechamento das escolas, qualquer medição das habilidades cognitivas vai indicar um rebaixamento no desempenho acadêmico.

Considerando que já completamos mais de um ano com medidas de isolamento social, qual o prejuízo no aprendizado dos alunos na modalidade de aulas on-line, comparadas com as presenciais?

Será um prejuízo substancial. Nenhuma escola teve tempo para planejar uma continuidade segura das instruções educacionais, nem para criar um cenário confiável para decisões de “quando” e “como” reabrir. Considerando os 27 estados do Brasil, incluindo o Distrito Federal, os indicadores são muito desiguais, sejam eles econômicos ou escolásticos. Há escolas que não possuem qualquer infraestrutura básica, ou ferramentas tecnológicas para implementar o ensino virtual. Grande parte dos pais não estava preparada para ser “professor” dos próprios filhos de forma contínua. O prejuízo no desemprenho dos alunos será enorme, com implicações para o desenvolvimento econômico de toda a nação.

Qual o peso de possíveis problemas relacionados à saúde mental, especialmente dos estudantes, na decisão de se retomarem as aulas presenciais?

Saúde mental importa. A ausência da convivência com colegas, professores, o suporte social e afins fornecidos pelas escolas podem acometer as crianças de forma psicológica e neurológica. Alguns desses sintomas têm sido o estresse psicológico, a ansiedade e a depressão. Teremos, ao fim da pandemia, desordens pós-traumáticas. Estudos, especialmente na China, têm sugerido que mais de 30% dos estudantes já relataram ter sintomas depressivos provocados pelo fechamento das escolas, 20% relatam ter sintomas de ansiedade. Ambos relacionados à redução das atividades ao ar livre e à falta de interação social.

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