Recursos escassos

Recursos escassos

Segundo entidades dedicadas aos cuidados com idosos, as verbas públicas são insuficientes e exigem o cumprimento de uma longa burocracia

Está previsto em lei. De acordo com o Estatuto do Idoso é obrigação do Estado garantir à pessoa idosa a proteção à vida e à saúde, mediante efetivação de políticas sociais públicas que permitam um envelhecimento saudável e em condições de dignidade. No entanto, uma questão intriga mais do que a responsabilidade do Estado e da sociedade em relação à qualidade de vida da população idosa: o repasse de verbas públicas que permite às entidades filantrópicas da cidade oferecerem um serviço cada vez melhor.

O Lar dos Velhos da Igreja Presbiteriana, que atua no amparo à população idosa desde 1960, possui um custo mensal de cerca de R$ 53 mil e recebe recursos estaduais, municipais e federais que não chegam a R$ 7 mil. “Uma conta injusta porque temos necessidades, como reforma da estrutura, contratação e folha de pagamento, aquisição de colchões, entre outras”, afirma Sílvia Pelegrin, presidente da entidade.

Com uma área construída de mil m² no Ipiranga, zona norte da cidade, o Lar atende exclusivamente à população idosa do sexo feminino. São 38 idosas assistidas por uma equipe multidisciplinar de cerca de 30 profissionais, entre enfermeiros, assistentes sociais, fisioterapeutas, nutricionista e terapeuta ocupacional.

O repasse da verba pública é uma das dificuldades atuais do Lar. “O valor repassado pela Assistência Social às entidades não chegam aos 3% e ainda deve ser dividido entre todas as entidades. Por isso, precisamos recorrer a outros recursos, como venda de livros de receitas, bazares e doações de empresas e de pessoas físicas”, explica Conceição Figueira, vice-presidente da entidade. 

O artigo 15º do Estatuto do Idoso assegura a atenção integral à saúde do idoso, por intermédio do Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo o acesso universal e igualitário, em conjunto articulado e contínuo das ações e serviços, para prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúde, incluindo a atenção especial às doenças que afetam preferencialmente os idosos. Em nota, a Secretaria da Saúde de Ribeirão Preto informou que presta o atendimento via SUS aos pacientes internados nas entidades por meio de medicamento, atendimento médico, entre outros serviços.

Para receber verbas da área de saúde, as entidades precisam atender a critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde. A exigência por uma classificação prévia foi estabelecida na resolução 109 de 11/11/2009,  publicada no Diário Oficial da União no dia 25/11/2009, que trata da “Tipificação Nacional de Serviços Sócio-Assistenciais”, pelo Conselho Nacional de Assistência Social do Ministério do Desenvolvimento Social. A Secretaria de Saúde esclarece que mantém mais de 40 unidades de saúde em Ribeirão Preto, com equipe médica e de enfermagem para atender toda a população, inclusive idosos assistidos por entidades. A rede também fornece ampla variedade de medicamentos, que podem ser retirados nas farmácias das unidades mediante receita médica.

No entanto, não é simples conquistar a certificação. “Gostaríamos que houvesse uma sensibilização maior do governo e dos órgãos públicos para o aumento do valor da verba. Será necessária uma força tarefa de todas as entidades para encaminharmos os documentos necessários à promotoria para que, então, sejam reconhecidas como equipamento de saúde”, destaca Sílvia Pelegrin.

O entrave na distribuição de verba originada da Secretaria da Saúde de Ribeirão Preto está na identificação das entidades como equipamento de assistência social. “As exigências da nova lei de filantropia de número 12.101/2009 foram interpretadas de forma equivocada, pois prestamos um serviço que envolve a saúde dos idosos, mas nos enquadramos como um serviço social”, explica Conceição.

Segundo a secretária da Assistência Social de Ribeirão Preto, Maria Sodré, não há impedimento legal no recebimento de subvenção de diversos órgãos. “A entidade pode atuar em várias áreas, como saúde e assistência social. Todavia, devem constar no Estatuto Social as áreas de atuação, sendo uma principal e as demais, secundárias”, explica a secretária.

Para que haja o envio de verbas oriundas da saúde, a administração pública deve obrigatoriamente cumprir o previsto nas leis, decretos, resoluções e demais atos normativos vigentes. “Assim, para que qualquer repasse financeiro seja autorizado, é necessário checar a regularidade das entidades. Assim como a Administração Pública, elas devem cumprir a legislação vigente e os trâmites estabelecidos para que, então, o repasse seja liberado”, completa Maria Sodré.

Outra entidade que trabalha com o orçamento no limite é o Lar Vicentino. Sem verba estadual e federal, a entidade conta apenas com R$ 4.500 mensais para um custo de cerca de R$ 35 mil. Segundo Fernanda Trindade, assistente social do lar, a verba oriunda da saúde poderia custear as despesas com os profissionais e medicamentos. “Nossa maior dificuldade atualmente é a falta de recursos financeiros e humanos”, completa.

Fundado em 1986, o Lar Vicentino atende 26 idosos e abriga 75 crianças na Creche Imaculado Coração de Maria. Localizado na Rua João Clapp, nos Campos Elíseos, tem como finalidade praticar a caridade cristã no campo da assistência social e da promoção humana.

Para o promotor Sebastião Sérgio da Silveira, a maior limitação neste caso é a tipificação da atividade como serviço de assistência social, medida adotada pelo Governo Federal, além da disposição do Município em ajudar as instituições. “Lamentavelmente, as entidades assumem um papel que seria do setor público e arcam com o ônus com pouca ou nenhuma ajuda. A maioria das instituições está passando por dificuldades e só não fecharam as portas em razão da ajuda que recebem da comunidade”, observa. “Muitas entidades procuram a Assistência Social e são recusadas por entender que o serviço é de saúde. Na saúde, muitas vezes, há a recusa da entidade, sob alegação que o serviço é de outra área. Isso tem ocorrido com muita frequência. A solução do problema depende de vontade política dos nossos governantes”, conclui o promotor.

Texto: Cristiane Araujo. Fotos: Carolina Alves | Ibraim Leão

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