Saúde integral
A saúde mental de mulheres com câncer de mama requer atenção especial do sistema de saúde e de familiares
No mês de outubro, o mundo se veste de rosa para apoiar a luta contra o câncer de mama. O movimento internacional conhecido como "Outubro Rosa" tem como objetivo principal aumentar a conscientização sobre a doença, bem como promover a prevenção e o diagnóstico precoce, que são fundamentais para melhorar as taxas de sobrevivência. Este câncer é o mais comum entre as mulheres em todo o mundo. Todavia, outros problemas paralelos podem surgir como decorrência dessa doença, como os impactos à saúde mental. A psiquiatra Fernanda Nunes Machado, formada na Universidade de Uberaba e especializada em Psiquiatria pela Santa Casa de São Paulo, tem como missão acolher histórias com amorosidade, através de uma escuta atenta e empática, de maneira integrativa, fala sobre o cuidado que paciente e rede de apoio devem ter.
Quais são os principais impactos psicológicos que as mulheres diagnosticadas com câncer de mama costumam enfrentar?
O diagnóstico de câncer de mama pode desencadear uma desordem emocional. Dentro os sentimentos, podemos observar medo, desespero, raiva, angústia, tristeza, frustração, baixa autoestima, disfunções sexuais, inconformismo, irritabilidade, isolamento social, apatia e desânimo. Nesse momento, costumam vir à tona as incertezas e inseguras em relação ao futuro. O diagnóstico de câncer geralmente representa uma sobrecarga emocional, podendo desencadear reações de ajustamento ou mesmo ser o gatilho de quadros afetivos (principalmente a depressão), ansiedade ou até mesmo psicoses. Os transtornos psiquiátricos também representam uma interação complexa de fatores, entre eles, a estrutura de personalidade e a capacidade de enfrentamento de problemas. Fatores significativos encontrados foram antecedentes de transtorno depressivo, principalmente quem manifestou quadro na fase inicial do tratamento, o que pressupõe que essas pacientes devam ter seguimento psiquiátrico ao longo de todo o tratamento, em especial quando associado à falta de esperança e à ajuda. Além disso, o intervalo menor que 24 meses entre o ataque da doença e a recorrência do câncer pressupõe risco maior, embora os autores ressalvam o tamanho de sua amostra para essa conclusão.
Como a ansiedade e o estresse relacionados ao diagnóstico de câncer de mama afetam a saúde mental das pacientes?
Na prática clínica, observo o aumento da ansiedade, sintomas depressivos, disfunções neurocognitivas e sexuais em mulheres com câncer de mama até mesmo após a cura. Não importa o estágio da doença, todas as pacientes são acometidas por algum nível de sofrimento quando recebem o diagnóstico. Os receios em relação ao que a doença pode causar ao longo da sua evolução e tratamento, são constantes.
Como o medo da recorrência do câncer de mama afeta o bem-estar emocional das sobreviventes?
A vitória em relação à doença nem sempre é um ponto final. Efeitos físicos e emocionais que impactam a autoestima também precisam de cuidados para que as mulheres possam retomar a vida da melhor maneira possível. Além do enfrentamento da doença, uma cirurgia, sessões de radioterapia e/ou quimioterapia, a mulher tem que lidar com aspectos que impactam sua autoestima; queda dos cabelos, manchas e ressecamento na pele, ganho de peso, além da ausência da mama ou de parte dela nos casos em que não é possível a imediata reconstrução.
Existem estratégias psicoterapêuticas ou de apoio emocional que podem ajudar as pacientes a lidar com a ansiedade e a depressão associadas ao câncer de mama?
Mostrar-se disponível a escuta é uma ferramenta primordial. Familiares, amigos, profissionais de saúde e grupos de pacientes e ex-pacientes são aliados da mulher no enfrentamento da doença. O cuidado com a saúde emocional é parte fundamental do tratamento do câncer de mama, para além das terapias prescritas (exemplo: mastectomia, radioterapia e quimioterapia). Reforço a importância da psicoterapia regular, quando possível. Caso seja necessário, consultas com a psiquiatria.
Quais são os efeitos psicológicos de alterações na imagem corporal, como a mastectomia, nas pacientes com câncer de mama?
O processo de ser mastectomizada traz repercussões complexas para a mulher, principalmente preocupações relacionadas à “perda da feminilidade”. As principais preocupações que surgem com a possibilidade e ocorrência da cirurgia são: relação desafiadora com a autoimagem, dificuldade de reconhecer sua identidade pessoal, comprometimento da sexualidade, preocupação em relação à maternidade e desfiguramento.
O câncer de mama afeta o relacionamento e a dinâmica familiar das pacientes? Como a psiquiatra pode ajudar a lidar com essas questões?
Os familiares e indivíduos que têm relações interpessoais com quem vivencia o câncer de mama também lutam constantemente para manter o equilíbrio, por meio de papéis, padrões de comunicação, comportamento e expectativas que refletem suas estratégias de enfrentamento. Todos os envolvidos vivenciam ansiedades e incertezas. As ferramentas utilizadas podem ser eficientes no sentido de minimizar danos e perdas no processo do câncer de mama aumentando o bem estar emocional ou potencializando os efeitos negativos. O câncer de mama abala todos os envolvidos, sendo importante um suporte psicológico e social para enfrentar todas as mudanças que o câncer pode acarretar.
Qual é o papel do apoio social e da rede de apoio no enfrentamento do câncer de mama do ponto de vista psicológico?
A rede de apoio pode oferecer suporte através da escuta ativa e falas que tranquilizam as pacientes nesse período do tratamento: transmitindo confiança e incentivando as mulheres. No entanto, com tantas mudanças, é importante que os envolvidos também consigam lidar com a nova condição de vida que é imposta pela doença. Nesse sentido, observamos que todos precisam de amparo no momento do diagnóstico e do tratamento para o câncer de mama.
Que conselhos a psiquiatra daria às mulheres diagnosticadas com câncer de mama e às suas famílias para enfrentar os desafios psicológicos associados a essa doença?
A associação entre o tratamento de alta complexidade e o oferecimento de suporte emocional às pacientes e seus familiares constituem um elemento protetor da saúde física e mental dos envolvidos. Isso possibilita a adaptação mais rápida à nova condição das pacientes. É importante desmistificar os aspectos ainda obscuros da doença para a maioria da população. É importante a discussão de práticas integrativas em relação às orientações para prevenção e detecção precoce do câncer de mama. Incluindo cuidado continuado e mudanças no estilo de vida. Além disso, relevo a importância da manutenção da vigilância quanto aos aspectos psíquicos de mulheres acometidas com câncer de mama e à sua qualidade de vida, em especial à imagem corporal, saúde e desconfortos físicos, trabalho, maternidade e vida sexual.