Tendência preocupante

Tendência preocupante

Especialistas em saúde de Ribeirão Preto destacam os riscos da queda no uso de preservativo entre adolescentes; educação sexual adequada ainda é a solução mais viável

Jovens têm utilizado cada vez menos preservativos em suas relações sexuais. A constatação foi apontada pela Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que avaliou as tendências na saúde dos adolescentes do 9o ano do ensino fundamental entre os anos de 2009 a 2019. 

 

Segundo o estudo, houve uma diminuição no percentual de jovens que utilizaram preservativos na última relação sexual de 72,5% para 59%. Entre os meninos o percentual caiu de 72,5% para 59%, enquanto entra as meninas a queda foi de 69,1% para 53,5%. “Os riscos da relação sexual desprotegida são vários. Primeiro a gravidez indesejada, depois a transmissão de várias doenças sexualmente transmissíveis, não só AIDS, mas também o vírus do condiloma humano (HPV), hepatites sífilis, gonorréia dentre outras. Importante ressaltar o uso correto do preservativo desde o início da penetração e não somente no momento de ejaculação. Devemos lembrar também do preservativo feminino que ainda é pouco divulga- do e sua utilização é ainda menor”, avalia de João Carlos Bavaresco Cristovão, ginecologista do Hospital São Lucas.  

 

O estudo realizou uma análise inédita da evolução de um conjunto de indicadores sobre os fatores de risco e de proteção para a saúde dos estudantes do 9° ano do ensino fundamental nas capitais brasileiras, com base nos resultados das quatro edições da pesquisa (2009, 2012, 2015 e 2019). “Quando temos um maior número de adolescentes com infecção sexualmente transmissível, pode aumentar a procura no sistema de saúde, além de maior risco de infertilidade como sequela de infecção genital. Reforço também a importância da atuação da mulher em exigir do parceiro que use o preservativo mesmo que ela já esteja protegida da gestação por outros métodos”, ressalta Bavaresco. 

 

Segundo o urologista Felipe Barufaldi, que atua no Centro de Referência de Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) da Prefeitura, a falta de campanhas mais assertivas gera uma falsa sensação de segurança em relação às consequências do não uso dos preservativos. “Os jovens estão mais destemidos em relação às consequências da falta do uso do preservativo, por falta de informação. Antigamente, as campanhas eram mais enfáticas e incisivas, havia mais estímulo à educação sexual nas es- colas, o que não se vê mais hoje em dia. O surgimento de novas medidas preventivas contra o HIV como a PREP (profilaxia de pré-exposição ao vírus) e novos tratamentos com menores efeitos colaterais, talvez tenha gerado um sentimento de maior segurança nas pessoas e isso é bastante perigoso”.  

O urologista ressalta entre as consequências indesejadas da relação sexual desprotegida es- tão as ISTs como HIV, HPV, sífilis, hepatite, uretrite entre outros. “Além de ser um risco para gravidez indesejada, numa fase da vida que acaba tirando a oportunidade destes jovens terem um futuro com mais qualidade de vida. É muito comum atender jovens com mais de uma IST ao mesmo tempo”.  

 

Ainda de acordo com Barufaldi, uma das consequências da tendência observada na pesquisa do IBGE é o alto gasto com saúde pública para o tratamento destas doenças. “No Brasil, todas as medicações para tratamento das ISTs são custeadas com dinheiro público, incluindo as terapias de pré e pós-exposição ao HIV. Além disso, temos algumas doenças crônicas como o câncer de pênis e câncer de colo de útero, que são intimamente relacionadas à transmissão sexual do HPV, que é um vírus extremamente comum na população sexualmente ativa. O aumento dos casos de sífilis congênita, da mortalidade neonatal, as gestações indesejadas, podem ser considerados frutos da diminuição do uso de preservativos”, alerta o urologista. 

 

Educação e orientação 

 

Outro índice levantado pela pesquisa do IBGE foi o aumento do percentual de estudantes que já tiveram relações sexuais, que passou de 27,9%, em 2009, para 28,5% em 2019. Segundo a ginecologista, obstetra e pós-graduada em educação em sexualidade, Nárima Caldana, os jovens iniciam a vida sexual, em média, com idades entre 13 a 15 anos, e o ide- al seria de que nesta idade os estudantes já tivessem recebido orientações sobre os métodos contraceptivos e uso indispensável de preservativos em todos os contatos sexuais desde as primeiras experiências.  

 

“A educação em saúde, especialmente quando o assunto é sexualidade, continua sendo um grande desafio, tanto para as escolas e famílias, como para nós, profissionais da saúde. Trazer os jovens para perto e tentar entender o seu contexto, através do diálogo e confiança, constrói caminhos para que as dúvidas sejam encaminhadas e as orientações sejam transmitidas a eles, através de linguagem compreensível e aceita como cuidado, não como uma imposição”, diz a docente do curso de Medicina no Centro Universitário Barão de Mauá. 

 

Ainda de acordo com a especialista, a gestação precoce pode comprometer a conclusão dos estudos e a vida profissional das adolescentes. “Sabemos que uma adolescente gestante tem maiores índices de evasão escolar e, consequentemente, comprometimento da conclusão dos estudos e vida profissional. Ainda que haja uma rede de apoio, muitas etapas do desenvolvimento desta adolescente serão abreviadas, o que também irá refletir em seu bem estar biopsicossocial por toda a sua vida adulta”, destaca Caldana.


Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

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