Transformação pelo conhecimento

Transformação pelo conhecimento

À frente do Instituto SEB, o professor José Luiz do Carmo comemora cinco anos da instituição, que tem como foco a educação e, como público-alvo, o terceiro setor

O professor José Luiz do Carmo é um apaixonado por pessoas, pelo conhecimento e pela arte de ensinar. Desde 2016, ele está à frente do Instituto SEB, projeto idealizado pela família Zaher voltado à transformação da sociedade por meio de uma educação inovadora de crianças e jovens. O Instituto foi inaugurado em 10 de dezembro de 2018 e comemora cinco anos de atuação colhendo frutos nos propósitos de olhar para os que não são vistos e contribuir para uma sociedade mais equalitária. Na entrevista a seguir, José Luiz fala sobre as conquistas, os obstáculos e o que pensa sobre o conhecimento como ferramenta transformadora de pessoas em cidadãos.
 

Ao comemorar os cinco anos do Instituto SEB, que balanço o senhor faz dessa caminhada?

 

Como toda entidade voltada ao terceiro setor, começamos com planos grandiosos, mas, aos poucos, a realidade se impôs. Ao longo desses cinco anos temos servido Ribeirão Preto e região, principalmente as comunidades mais carentes para quem o Instituto é voltado. Todos os nossos projetos trabalham com as pessoas em menor condição socioeconômica e cultural. São essas comunidades para as quais nos voltamos desde o início e posso dizer que estamos muito felizes com os resultados alcançados até aqui. Começamos com grandes sonhos e pequenos trabalhos, continuamos com grandes sonhos e os trabalhos estão evoluindo. 

 

O que norteia as atividades, projetos e trabalhos do Instituto?

 

A base da nossa existência é a sustentabilidade, um tema bastante amplo, mas que, por definição, permeia todos os trabalhos, programas, projetos e pessoas que atuam para entregar um mundo melhor para as novas gerações. Esse princípio está presente, por exemplo, nas mentorias onde ajudamos as organizações não governamentais (ONGs) a se formalizarem. Por trás dessas organizações há muita boa vontade de pessoas que querem ajudar, mas também há muita burocracia e falta de expertise e é aí que entramos. Hoje estamos trabalhando com 30 ONGs de Ribeirão Preto nesse sentido. 

 

Os jovens são os principais protagonistas dos projetos como o Nau Vestibular e o Nau Mercado de Trabalho. Como despertar habilidades, sonhos e ambição nesta geração?

 

O jovem que atendemos é um jovem de 16 a 24 anos com vontade de vencer. O Nau Vestibular segue a vocação do conglomerado SEB à educação e utilizamos essa expertise para tentar mudar uma situação muito cruel existente no Brasil. Aqueles com menores condições financeiras estudam em escolas públicas que possuem deficiências que já conhecemos. Os que têm mais condições econômicas estudam em escolas particulares. Quando chegam na universidade a situação se inverte: grandes faculdades do país são públicas, mas muito difíceis de entrar. Há um funil cruel onde os que frequentaram as escolas particulares, e estão mais preparados, ocupam estas vagas. Os que não tiveram o preparo adequado não têm esse acesso e carreiras magnificas se encerram antes mesmo de começarem. Investimos nessa formação pré-vestibular para que os jovens carentes possam ter a oportunidade de frequentar boas universidades. Hoje já temos alguns ex-alunos formados e muitos estão no processo. Para nós, cada aluno aprovado no vestibular é uma vitória. O Nau Mercado de Trabalho também desperta e desenvolve habilidades para que esse jovem tenha condições de ser inserido no mercado de trabalho. Afinal, essas pessoas estarão comandando os nossos destinos no futuro. Esse público é acolhido no que chamamos de habilidades socioemocionais: conhecer a si mesmo, respeitar o outro, trabalhar em conjunto, aprender oratória, conceitos de língua portuguesa e comunicação. É preciso munir estes jovens de habilidades de autoconhecimento, empreendedorismo e, principalmente, da vontade de querer galgar uma posição. Hoje a taxa de empregabilidade dos nossos alunos e ex-alunos está em torno de 70%. É uma experiencia transformadora ao longo de todo o processo, tanto para eles quanto para nós. 

 


Como a pandemia de Covid impactou os trabalhos do Instituto SEB?

A pandemia foi uma grande lição para todos os envolvidos, mas confesso que nos saímos muito bem. O trabalho do Instituto foi pensado para ser realizado presencialmente mas, de um instante para o outro, o espaço foi esvaziado. O SEB sempre esteve à frente em situações de inovação tecnológica com muitos projetos realizados à distância. Nos ajustamos rapidamente com a oferta dos conteúdos à distância por meio de plataformas e programas específicos. Ajudamos os que tinham dificuldade de conexão à internet e tenho orgulho de dizer que o Instituto SEB, embora esvaziado de pessoas, não parou um só dia. É na dificuldade que você conhece as pessoas, as alternativas e oportunidades. Finalmente, os trabalhos continuaram e resultaram em um rico acervo de material para cursos EAD.  

 

Dentro de um cenário de projetos já consolidados voltados aos jovens há desdobramentos que também são abraçados pelo Instituto. Poderia citar alguns?

 

Quando se trabalha no universo do terceiro setor a ambição de transformação é muito grande. Cada um dos nossos projetos acaba resultando em outros projetos paralelos e, desta maneira, atingindo um número cada vez maior de pessoas. O Instituto SEB olha para aqueles que ninguém olha e, por isso, direcionamos nossa atenção às pessoas desprovidas de liberdade. Pensa-se os problemas acabam quando elas vão para atrás das grades, mas, em algum momento, elas sairão de lá e precisam de ferramentas para enfrentar e se ajustar a essa nova realidade. Nesse sentido, montamos um curso EAD de jardinagem, em parceria com a Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), oferecido logo após a pandemia para 40 detentos que estavam prestes a ganhar a liberdade. Foi um embrião, cuja parceria permanece com novos cursos como o de calceteiro (responsável pelo calçamento de ruas e calçadas) e estamos gestando um projeto de fábrica de tijolos sustentáveis. O curso pré-vestibular online, criado na época da pandemia, é aplicado aos adolescentes da Fundação Casa de Atendimento Socioeducativo em Ribeirão Preto para prepará-los para o Enem. São alguns projetos que visavam inicialmente um grupo mais restrito e, de repente, foram ampliados por conta dessa demanda por conhecimento e formação.

 

Como o senhor vê o conhecimento e informação como ferramentas de transformação da sociedade?

 

Conhecimento é todo um conjunto de conteúdos, valores, emoções e competências, tanto socioemocionais quanto técnicas. Estamos vislumbrando um mundo onde as pessoas mal se conhecem, não enxergam umas às outras e é cada um por si. A sociedade está dividida em dois grandes grupos distintos. Há os que têm e os que nada têm. Uns vivem em comunidades e outros em condomínios, não há canais de comunicação. Uma das intenções desses trabalhos voltados ao público jovem é criar canais de comunicação para que as pessoas se reconheçam. Somos todos iguais. Nosso trabalho é ajudar estas pessoas a subirem degraus fundamentados no querer, e por meio das práticas do bem, com conhecimento e valores, que elas consigam ter uma vida digna. Do outro lado, estão os que têm muito e estão isolados. Ninguém faz nada sozinho, somos interdependentes. Isso tudo passa pela educação. Desde a forma de se comunicar, até os conhecimentos técnicos, emocionais, artísticos, sem eles não se pratica a cidadania. Quando você traz um jovem ao reconhecimento de suas potencialidades, dos seus direitos e deveres, ele se torna um cidadão e, a partir daí, o seu entorno também é transformado. É isso que o Instituto mais deseja, contribuir para uma transformação que, mesmo aparentemente pequena, a partir de indivíduos, pode se tornar infinita quando se olha para a coletividade. 


Foto: Luan Porto

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