Uma visitante ilustre

Uma visitante ilustre

Símbolo da fraternidade entre os povos e da maior competição esportiva mundial, a Tocha Olímpica passa por Ribeirão Preto no dia 18 de julho

A ex-tenista Silvana Campos quer aproveitar cada centímetro dos 200 metros em que terá a Tocha Olímpica em mãos. Silvana, que representou o Brasil nos Jogos de Los Angeles, nos Estados Unidos, em 1984, não esconde o orgulho e a gratidão por estar entre as 110 pessoas escolhidas para participarem do revezamento da Tocha em Ribeirão Preto, na próxima segunda-feira, 18. “É uma festa única, não só para o atleta. É uma festa mundial, que reluz saúde, superação e luta para sempre conseguir algo melhor. A cidade tem que se envolver com isso porque, independente, de todos os problemas que temos, isso traz uma energia importante”, conclui a ex-tenista, que hoje em dia dá aulas de tênis para crianças. Silvana acredita que o município deve se envolver neste momento, porque é uma oportunidade única. “A minha família tem um estabelecimento e meu irmão colocou uma faixa na porta dizendo que todos eles estavam muito orgulhosos por eu ser uma das pessoas escolhidas. Isso chamou muito a atenção do pessoal que passava por lá, que se interessou pela história. Não só a minha família, mas a família ribeirãopretana está muito feliz com isso”, destaca. 

De Los Angeles, edição que teve o tênis como esporte de demonstração, as principais lembranças da atleta são o primeiro contato com a intranet e a recepção calorosa ao corredor Joaquim Cruz, único brasileiro que conquistou medalha de ouro naquele ano, na prova dos 800 metros. “Quando ele chegou à Vila esperávamos por ele batendo palmas. São lembranças fantásticas e maravilhosas, uma das sensações mais lindas. Participar dos Jogos significa estar em um local junto com os atletas do handebol, do judô e de todas as modalidades buscando o seu melhor. Conviver em uma Vila Olímpica é uma experiência inesquecível”, recorda.

Das mesmas palavras faz uso o vice-presidente do Comitê Organizador dos Jogos Rio 2016, Maurílio Biagi Filho, um dos escolhidos para carregar a Tocha. Para Biagi, a Tocha é um símbolo de esperança e de paz entre os povos. “Estive no acendimento da Tocha, no Monte Olimpo, na Grécia, uma cerimonia linda, com aquelas artistas vestidas de deusas gregas. Esse símbolo vem a Ribeirão Preto e vai ser um espetáculo bonito. Precisamos mostrar às pessoas, principalmente às crianças, o que está acontecendo. Em todas as cidades que receberam a tocha, o evento foi um sucesso e em Ribeirão Preto não pode ser diferente”, aponta Biagi.

Três semanas antes do início dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, que começa no dia 5 de agosto, em um trajeto de 21 quilômetros, com início na Avenida Dom Pedro I, em frente à Coca-Cola, até o Parque Luís Carlos Raya, a visitante especial passará pela cidade e exigirá algumas adaptações, como a instalação de banheiros para o público, grades de proteção e outras medidas especialmente relacionadas à segurança. Todas as providências necessárias custarão R$ 60 mil, de acordo com a Força-Tarefa Regional para o revezamento, que disse ter conseguido apoio de patrocinadores para arcar com as despesas.

Além disso, um grupo de empresários criou o Comitê Ribeirãopretano da Passagem da Tocha Olímpica (CRPTO), anunciado no começo de junho. Sua função é auxiliar o município na organização do revezamento. Maurilio Biagi Filho, porta-voz do grupo, brincou que um dos motivos para participar da organização das Olimpíadas, foi justamente, incluir Ribeirão Preto no roteiro nacional da tocha. “Em um universo de 300 cidades, é claro que Ribeirão Preto estaria inserido. Brincadeiras à parte, há um peso histórico na passagem desse símbolo pela cidade”, completa o empresário.

Eles estarão no revezamento

A história descrita ao vivo em cada edição das Olimpíadas, assim como inúmeras conversas com o pai cativaram a engenheira civil Luciana Iglesias a se apaixonar pelos jogos. Grandes nomes da história do esporte e momentos olímpicos marcantes estão entre as memórias da engenheira.

Entre essas lembranças está performance da ginasta romena Nadia Com?neci nos Jogos de Montreal, em 1976, considerada a mais perfeita da história — a ginasta foi a primeira a conquistar uma nota 10. Ela também destaca o atentado terrorista contra a delegação israelense em Munique, na Alemanha, em 1972, o choro do ursinho Misha, no encerramento dos jogos de Moscou, na União Soviética, em 1980, e as gerações de Ouro e de Prata do vôlei masculino brasileiro.

“Ver os atletas brasileiros brilharem em esportes fantásticos, apesar do pequeno apoio recebido, é emocionante. Imagino o esforço e a dedicação envolvidos para que seja possível chegar ao pódio. Amo ouvir o hino brasileiro durante as premiações douradas”, comenta Luciana. Para ela, que pratica caminhada e acompanha o marido na bicicleta, a integração de pessoas de todos os cantos do planeta — cada um trazendo uma história distinta — é o significado mais valioso a ser destacada nas Olimpíadas. 

No Rio de Janeiro, Luciana acumulará ainda mais lembranças, já que verá de perto alguns capítulos dos Jogos, como a final do basquete feminino, a cerimônia de encerramento e alguns momentos das competições de atletismo e de ciclismo. Antes disso, terá a chance de participar do revezamento da tocha em Ribeirão Preto. Para a engenheira, fazer parte desta história será um privilégio com o qual nunca havia sonhado. “Apesar da situação adversa no Brasil, as tradições das Olimpíadas simbolizam a busca pela paz, pela excelência e pela unidade”, define.

Outro escolhido para fazer parte desta história foi João Cury, um adepto das atividades físicas. O consultor de negócios faz parte de um grupo de corrida com o intuito de melhorar a qualidade de vida e compartilhar experiências com os companheiros. “Muitos falam que corrida é um esporte solitário, mas a realidade é inversa. Quando nos encontramos para correr, viramos uma família”, afirma Cury, garantindo que seu envolvimento com o esporte foi fundamental para que ele fizesse parte da lista dos portadores da tocha por Ribeirão Preto. “O esporte não forma somente campeões, forma cidadãos e transforma a vida das pessoas”, garante o consultor.

Integrar o revezamento transformou a vida de João. De acordo com ele, a possibilidade de viver esse momento surgiu com a abertura das inscrições para o público. Diante das mínimas chances, o consultor não imaginou que o sonho pudesse se tornar realidade, mas a esperança começou a surgir quando recebeu um e-mail com um formulário a ser preenchido. “As Olimpíadas também servem para celebrar a vida, uma vez que o esporte, juntamente com a educação, pode transformar o mundo”, salienta. “Através do meu exemplo, acredito que posso motivar outras pessoas a saírem da zona de conforto e se atreverem a mudar, seja por meio da corrida ou de outro esporte”, espera João.

Por motivos profissionais, Cury não conseguirá viajar ao Rio de Janeiro para acompanhar as Olimpíadas de perto, mas espera que, em 2016, consiga guardar novas recordações da competição, ampliando o rol de lembranças, como a vitória de Joaquim Cruz nos 800 metros e a angustiante chegada da maratonista suíça, Gabrielle Andersen, na mesma edição da competição, que, apesar de muito debilitada pelo calor californiano, fez questão de cruzar a linha de chegada. “Aquela imagem simboliza a superação e a determinação que vêm junto com o esporte. Com certeza, a imagem daquela atleta, muito mais do que os vencedores da prova, povoa a memória de muitas pessoas no mundo inteiro”, conclui. Gabrielle terminou a disputa na 37ª colocação, depois de 2h48min42s de prova. A vencedora foi a norte-americana Joan Benoit, que cumpriu o trajeto em 2h24min52s.

Outro que dedica vida às corridas e à qualidade de vida é o empresário Doriedson Pereira, o Dorinho, idealizador do projeto Voluntários do Sertão. Para ele, o esporte é fundamental para o ser humano, pois faz as pessoas se sentirem mais leves. “O mundo está acordando para isso e cada um tem que fazer o que gosta. As pessoas precisam se dedicar a algo, não podemos ficar parados. Você fica mais leve e mais disposto”, aponta Dorinho, que não esconde o orgulho de participar deste momento histórico para a cidade que o abraçou.

“Vou fazer o máximo e espero que as pessoas nas ruas façam a festa, embora o país esteja em uma situação complicada. Mesmo assim, temos que deixar os problemas um pouco de lado e olhar para frente. Se ficar pensando só em crise, nada vai se resolver e podemos perder uma oportunidade. As Olimpíadas representam uma chance de mostrar que o Brasil tem condições de olhar para frente”, define Dorinho que, em viagem aos Estados Unidos em 1996, acompanhou partidas do torneio Olímpico de futebol de Atlanta, no qual o Brasil ganhou o bronze, após muita expectativa, pois aquele time tinha Rivaldo e Ronaldo. “O Zagalo era aquela figura, brigando com todo mundo. Tive a oportunidade de conhecê-lo em uma partida da seleção em Miami. Infelizmente perdemos mais uma vez, porque às vezes você sai daqui com aquela expectativa de vencer, mas jogo é jogo. O importante é participar. Este ano, temos tudo para trazer muitas medalhas, mas o mais importante é que o esporte fique no Brasil, como não tivemos antes”, lembra o empresário.

Corrida diária

O designer de joias Antônio Carlos Berlofa nem se preocupa em carregar a Tocha, de 1,5 kg por 200 metros. Por dia, ele corre quase 20 quilômetros, como parte de seu treinamento diário, já que ele é maratonista amador, colecionando participações na Maratona de Nova Iorque, a mais tradicional, e de Berlim, considerada a mais agradável, além de inúmeras que já correu no Brasil. Como não poderia deixar de ser, a primeira imagem que vem à cabeça de Berlofa quando se fala em Olimpíadas é o ataque sofrido pelo corredor Vanderlei Cordeiro de Lima, que liderava a maratona dos Jogos de Atenas, em 2004, por um padre irlandês, que acabou o transformando um símbolo de dedicação e amor ao esporte.

“Achei o Vanderlei sensacional, porque, apesar dele ter sido agredido, continuou e levou uma medalha de bronze para casa. Eu acho que também faria isso, por causa da determinação”, analisa o designer, que se sente um representante dos corredores amadores de Ribeirão Preto no revezamento. “Vou representar o município e todos os corredores, homens e mulheres, que já são a metade das pessoas nas ruas praticando esse esporte”, comemora.

Assim como Berlofa, o vendedor de brinquedos José Renato Marques é outro corredor que participará do revezamento. A paixão de José Renato pelo esporte é antiga, vem desde os tempos do velho Estádio Luís Pereira, na Vila Tibério, no qual nutria o amor pelo Botafogo, sentimento que atravessou décadas e perdura ainda hoje. Tanto isso é verdade que, mesmo em viagem à Grécia, país que decidiu conhecer por conta das Olimpíadas, fez questão de permanecer acordado durante a madrugada para acompanhar, pela internet, o jogo do time do coração pelo Campeonato Brasileiro da Série C. “Estou colocando um pouco mais de emoção e aventura nessa epopeia das Olimpíadas no Brasil”, esclarece o vendedor. 

O amor pelo esporte cresceu além do futebol e do Pantera. “Na minha vida, o esporte sempre esteve presente”, diz Marques. Para ele, a honra e a responsabilidade de carregar a tocha em Ribeirão Preto aproximam este momento aos principais de sua vida. “A cada dia que se aproxima, aumenta a expectativa. Apenas nessas últimas semanas estou começando a acreditar mesmo que tudo isso é verdade. Já recebi um kit para recepção da Tocha, acompanhada de um cartão que diz: ‘José, lembre-se que no momento em que estiver conduzindo a Tocha Olímpica, você será a única pessoa no mundo, a estar com a Chama em suas mãos, é sua responsabilidade!’”, compartilha.

Um pouco de história

O primeiro revezamento da Tocha Olímpica na era moderna  foi nos Jogos de Berlim, em 1936, e está documentado no filme Olympia, da diretora Leni Riefenstahl, lançado em 1938 pelo regime nazista. Foi de Carl Diem, secretário do departamento de esportes alemão — que não apoiava o regime encabeçado por Adolf Hitler — a iniciativa de resgatar essa tradição. Olympia que pode ser encontrado no YouTube (https://goo.gl/vnG1vR).

Mesmo depois da guerra cinza provocada pelos nazistas, a chama e o revezamento da tocha permaneceram na tradição olímpica moderna. Em 1948, em Londres, na primeira Olímpiada após a Segunda Guerra Mundial, a chama andou de barco pela primeira vez, ao atravessar o Canal da Mancha, que separa a Grã-Bretanha da Europa. Quatro anos depois, foi a vez da Tocha entrar em um avião para ser transportada até Helsinque, capital da Finlândia, sede das olimpíadas de 1952. No rol de inovações, é possível destacar, ainda, o acendimento da chama por um raio laser em 1976, nos Jogos de Montreal, depois de ser transmitida por ondas eletromagnéticas direto do Monte Olimpo, na Grécia, para o Canadá.

A novidade seguinte ocorreu em 2000, quando os Jogos foram realizados em Sidney e, para garantir a passagem da chama por um dos principais cartões postais australianos, a Tocha foi submersa na Grande Barreira de Corais. Naquele ano, vivia em Sidney o analista de sistemas Juliano Augusto de Oliveira, que acompanhou o revezamento da Tocha pela principal cidade da Austrália em direção ao Estádio Olímpico, onde os jogos teriam início. 

Passados 16 anos, Juliano terá a oportunidade de fazer parte desta história, já que será um dos participantes do revezamento do próximo dia 18. “Carregar a chama olímpica no meu país, na cidade que me acolheu, provoca uma sensação indescritível. Não vejo a hora de chegar minha vez de conduzir a Tocha e registrar esse momento na lembrança para sempre”, comemora o analista.

Apaixonado por esportes — joga futebol e costuma andar de bicicleta — Juliano acompanha de perto diversas competições, seja pessoalmente ou pela televisão. Nos jogos do Rio, pretende estar atento às mais de 30 competições. “Este é o maior espetáculo da terra e fazer parte dele traz uma sensação única”, completa Juliano, que viveu a primeira experiência olímpica em Sidney, onde trabalhou na Casa Brasil, local de confraternização entre atletas, imprensa e torcedores brasileiros, montado pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB) na ocasião. 

Compartilhar: