União Econômica

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Acordo entre Mercosul e União Europeia coloca Brasil na cadeia global de valor, segundo avaliação do secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Marcos Troyjo

O secretário de Comércio Exterior do Ministério da Economia no governo Jair Bolsonaro (PSL), Marcos Troyjo, é o homem por trás do avanço das negociações para fechamento do acordo entre Mercosul e União Europeia, após duas décadas de lentas negociações. Para o secretário, a demora ocorreu, entre outros fatores externos, como a ascensão chinesa no mercado mundial, também pelo fato de os governos anteriores encararem o Mercosul apenas a partir de seu aspecto político e não econômico. “A visão que temos do Mercosul é sob uma vocação econômica primordial e que, portanto, só faz sentido participar destas arquiteturas de integração regional se elas puderem gerar benefícios concretos para os seus cidadãos”, explica. 


Para Marcos Troyjo, acordos globais podem funcionar como aceleradores de reformas internas no Brasil


Como o senhor condiciona o sucesso do acordo de livre-comércio entre Mercosul e União Europeia às reformas que o Brasil tem buscado implementar?

A experiência internacional mostra que os países que mais conseguiram crescimento nesses últimos 60 anos são aqueles que fizeram uma opção preferencial pelo comércio exterior como alavanca vigorosa de desenvolvimento. Muitos desses países privilegiaram o comércio exterior por meio de acordos comerciais. É o caso da Coreia do Sul, que fez muitos acordos internacionais, mas promoveu, também, reformas competitivas internas. Portanto, a Coreia do Sul decolou rumo aos países que hoje participam do grupo das nações mais ricas do mundo. No entanto, existem em outros casos, como o exemplo do México, que celebrou muitos acordos internacionais, mas não diversificou exportações e não quebrou o poder de monopólio de sindicatos. Portanto, os benefícios dos acordos comerciais foram menores do que o potencial. É muito importante que os acordos internacionais funcionem como uma espécie de grande acelerador de reformas internas.

Por que este acordo demorou tanto para ser fechado?

Essa foi uma negociação iniciada há 20 anos e, durante esse período, os europeus se desinteressaram, porque estavam mais focados na absorção de países que antigamente faziam parte da Cortina de Ferro. Fora isso, tivemos governos que privilegiaram muito mais os aspectos políticos do Mercosul e não econômicos. O que nós temos de diferente é essa visão do bloco sob uma vocação econômica primordial. Só faz sentido participar destas arquiteturas de integração regional se elas gerarem benefícios concretos para os seus cidadãos. Esse acordo do Mercosul com a União Europeia multiplica, por exemplo, em muitas vezes, a nossa exportação de carne bovina, de carne suína, de frango, de açúcar e de uvas. Também temos acesso a uma das mais avançadas tecnologias e, com isso, o acordo vai permitir ao Brasil corrigir uma anomalia antiga em nossa economia. Ficamos distantes das chamadas redes globais de valor, ou cadeias globais de valor. O acordo vai permitir que uma empresa que se instale no Brasil, por exemplo, não apenas acesse mercado interno, mas, também, utilize o Brasil como um elo na escala global de produção. Isso é o que precisamos. Interagir com uma economia que hoje representa um quarto da economia global, a União Europeia, vai corrigir uma anomalia, gerar mais empregos, mais tecnologia, mais exportações e importações. Isso vai auxiliar muito a natureza do investimento estrangeiro no país.

Os principais setores produtivos brasileiros já estão preparados para se beneficiarem deste acordo?

O Brasil tem setores em que é uma verdadeira superpotência: açúcar, frango e carne bovina. Muitos desses setores são ligados ao agronegócio, ou então à indústria de mineração. Em outras áreas, o Brasil ficou parado no tempo. O país já foi o maior parque industrial do hemisfério sul. No entanto, privilegiou a antiga filosofia da substituição de importações e ficou para trás. Esses setores precisarão se adaptar muito fortemente e essa é uma característica muito positiva. Trata-se de um acordo gradual, que prevê o grau de liberalização que as economias do Mercosul terão a partir do relacionamento com a União Europeia — o tempo necessário de suas reformas estruturantes, também.  O conjunto de ações modernizantes da economia brasileira ocorrerá ao longo de um tempo que é mais ou menos sincrônico à dinâmica de liberalização com a União Europeia. Por isso, o acordo prevê um tempo de adaptação e um ritmo gradual que vai favorecer muito a economia do Brasil.


"É muito importante que os acordos internacionais funcionem como uma espécie de grande acelerador de reformas internas"


O que pode mudar neste acordo com os resultados das urnas nas eleições argentinas de outubro?

A nossa compreensão é de que o acordo é bom para todos: é bom para o Brasil, é bom para a Argentina, para outros integrantes do Mercosul e para a União Europeia. Não há porque se fixar em qualquer análise negativa sob este ponto de vista conceitual. Além disso, o processo de aprovação do acordo depende individualmente de cada um dos parlamentos do Mercosul —  argentino, paraguaio, uruguaio, brasileiro — e europeu. Vamos supor que apenas os parlamentos europeu e brasileiro aprovem. Os argentinos ficam um pouco para trás, mas o acordo já entra em vigor para o Brasil e para a União Europeia. Não dependemos, necessariamente, da aprovação congressual na Argentina para que o acordo possa começar a valer.

O governo Bolsonaro busca uma aproximação em várias frentes com os Estados Unidos de Donald Trump. Quais os principais objetivos desta aproximação na área econômica?

Uma lição importante após a Segunda Guerra Mundial, até hoje, é que aqueles países que tiveram relações privilegiadas com os Estados Unidos, ou seja, a Alemanha, o Japão, Chile, Coreia do Sul, mesmo a China, tiveram benefícios. É uma característica desses países que um relacionamento especial com os Estados Unidos tenha sido um ingrediente importante de sucesso. Neste aspecto, o Brasil e os Estados Unidos estavam muito longe um do outro. Não faz sentido, é inexplicável que o nosso comércio bilateral seja tão distante do potencial, tão aquém da nossa capacidade. Precisamos correr em busca do tempo perdido. O presidente Jair Bolsonaro iniciou, com o apoio do governo norte-americano, a entrada do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Queremos fazer mais negócios com os Estados Unidos, trabalhar para algum tipo de acordo comercial e bilateral de investimentos. Queremos avançar muito, também, no comércio de bens digitais, ou seja, almejamos uma agenda moderna e que possa mais uma vez estabelecer uma ponte rápida para cobrir esse fosso de tempo em que os países ficaram tão longe um do outro.

Para secretário de Comércio Exterior, Mercosul precisa ser visto sob o aspecto econômico e não apenas políticoCom relação à China, qual é o entendimento da equipe econômica brasileira?

A China, em muitas métricas, já é a maior economia do mundo, pelo critério do Produto Interno Bruto, mensurado pelo poder de compra. Há uma complementaridade entre as economias do sudeste asiático e a China. Como nação exportadora, o Brasil também tem essa sintonia nas suas características. Queremos que esse relacionamento seja cada vez maior e melhor, em diferentes áreas, envolvendo, também, investimentos em infraestrutura. Vemos a China como um ator muito importante nas relações econômicas internacionais do Brasil.

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