Desmanchando o preconceito
“Foram muitos desafios, mas hoje convivo bem com o vitiligo. Me olho no espelho e me acho bonita”, afirma Ivania Lage

Desmanchando o preconceito

Vitiligo atinge cerca de 150 milhões de pessoas no mundo. Embora não seja contagiosa, o preconceito ainda é um dos maiores desafios

Matéria publicada na edição 1106 da revista Revide.

Mais que a preocupação com a saúde, pessoas que desenvolvem o vitiligo precisam lidar com o preconceito. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a condição afeta cerca de 150 milhões de pessoas em todo o mundo. Doença autoimune – quando os anticorpos do próprio organismo passam a destruir algumas células–, o vitiligo se caracteriza pela perda da coloração da pele, em que as lesões formam-se devido à diminuição ou ausência de melanócitos, as células responsáveis pela pigmentação.

De acordo com o dermatologista, Renato Soriani, a doença pode acomete principalmente a face, mãos, pés e, em alguns casos, pode ser generalizada. “O vitiligo afeta tanto homens quanto mulheres e pode aparecer em qualquer faixa de idade, inclusive em crianças. Os seus portadores possuem alterações genéticas que aumentam a chance de desenvolver a doença”, afirma o dermatologista. 

Fatores externos como estresse e infecções também podem levar ao aparecimento da doença. “O vitiligo é uma doença autoimune com influência bem estabelecida da saúde mental emocional dos seus portadores. Por isso sempre recomendamos um acompanhamento deste aspecto concomitante ao seguimento dermatológico”, orienta, Soriani. Para Ivania Lage Bidorim, de 50 anos, a doença se manifestou aos sete, quando teve problemas familiares.

“Ao longo da minha vida percebi que o fator emocional está diretamente ligado ao desencadeamento das lesões. Em momentos de maior fragilidade, como perda de familiares ou até uma doença pela qual passei, as manchas aumentaram consideravelmente”, explica Ivania que passou por tratamento médico por dez anos além de procedimentos alternativos.

De acordo com a Sociedade Brasileira de Dermatologia, as lesões provocadas pela doença impactam significativamente na autoestima. Por isso, na maioria casos, recomenda-se o acompanhamento psicológico, que pode ter efeitos bastante positivos nos resultados do tratamento. Outras recomendações para o tratamento são cremes, comprimidos, fototerapia ou cirurgia. “Infelizmente, as novidades nos últimos anos não foram tão promissoras, mas existem muitas opções sendo pesquisadas e a visão para o futuro pode ser mais otimista”, informa o dermatologista. 

“O desconhecimento leva ao preconceito e muitas vezes a um prejuízo ainda maior da qualidade de vida dessas pessoas”, explica o dermatologista, Renato Soriani

Desinformação x Preconceito

Nos últimos anos, a doença tem sido debatida por profissionais, principalmente com o objetivo de informar a população e minimizar o preconceito. Esse movimento busca a compreensão sobre o vitiligo, incluindo a representatividade por meio de marcas, como é o caso da modelo Winnie Harlow, que fez história ao se tornar a primeira modelo com vitiligo a desfilar para as mais importantes grifes.

Renato Soriani afirma que a doença não é contagiosa ou infecciosa, não representando qualquer tipo de risco para quem a possui ou para as pessoas que convivem com quem a desenvolve. “O vitiligo ainda é uma doença pouco conhecida do público em geral, porém temos um número maior de pessoas buscando por informação e tratamento no consultório. O desconhecimento leva ao preconceito e muitas vezes a um prejuízo maior da qualidade de vida destas pessoas”, explica Soriani. 

É o que explica Ivania, que deixou os estudos por sofrer bullying pelas manchas apresentadas no corpo. “Na infância deixei a escola, pois tinha vergonha e sofria com as risadas e sentimento de nojo que as pessoas tinham comigo. Quando adulta, as coisas pioraram. No trabalho convivi com muito preconceito e na vida amorosa, rejeição”, lembra. “Ainda existe o preconceito, o desconhecimento sobre a doença, mas acredito que isso esteja melhorando, pois as pessoas estão falando mais a respeito. Foi uma jornada difícil, de muito sofrimento, mas hoje me aceito, convivo bem com o vitiligo, me olho no espelho e me acho bonita. Torço para que as pessoas busquem mais conhecimento e percam o preconceito”, afirma. 

Sintomas

A maioria dos pacientes de vitiligo não manifesta qualquer sintoma além do surgimento de manchas brancas na pele. Quando o vitiligo é detectado, o dermatologista pode classificá-lo por dois tipos. Segmentar, que é aquele que se manifesta apenas em uma parte do corpo, normalmente quando o paciente ainda é jovem. E o não segmentar, que é o tipo mais comum. Esse aparece nos dois lados do corpo, por exemplo, duas mãos, dois pés, dois joelhos.

Em geral, as manchas surgem em extremidades como mãos, pés, nariz e boca. Há ciclos de perda de cor e épocas em que a doença se desenvolve. Depois, há períodos de estagnação. Estes ciclos ocorrem durante toda a vida; a duração dos ciclos e as áreas despigmentadas tendem a se tornar maiores com o tempo.


Fotos: Luan Porto/Revide

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