Laboratório da USP Ribeirão Preto cria banco genético de brasileiros
Criada por cientistas do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias, a biblioteca pode servir para testar medicamentos e estudar doenças
Uma biblioteca inicial com 23 linhagens celulares foi criada por cientistas do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias (LaNCE) da USP, que faz parte do Centro de Terapia Celular (CTC) da USP de Ribeirão Preto, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid), financiados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) na universidade.
Os pesquisadores da USP produziram uma coleção de células-tronco a partir do sangue de brasileiros, representando a mistura genética de europeus, africanos e indígenas que compõe boa parte da população. Essas células têm potencial para se transformarem em células de diversos tecidos do corpo – como neurônios, células do fígado e do coração – e poderão ser usadas para verificar a segurança ou a eficácia de medicamentos, em alguns casos até substituindo os testes em animais. Outra possível aplicação é o estudo de doenças comuns, a exemplo da hipertensão.
O projeto teve a parceria do Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto (ELSA), coordenado pelo Ministério da Saúde, e pode ser expandido para representar a diversidade genética de 1.872 pessoas. O trabalho foi publicado na revista Scientific Reports, do grupo Nature, no dia 6 de outubro. Entre os pesquisadores que assinam o artigo está a professora Lygia da Veiga Pereira (foto), integrante do CTC e coordenadora do LaNCE.
Diversidade Genética
Estudos com moradores de áreas urbanas apontam que os indivíduos brasileiros têm uma herança genética misturada, com 60% de contribuição europeia, 25% de contribuição africana e 15% de contribuição indígena, em média. Os estudos iniciais do LaNCE, com células-tronco embrionárias doadas de clínicas de fertilização in-vitro, produziram cinco linhagens dessas células, mas com 92,7% a 98,6% de genoma europeu – ou seja, não representam a variedade da população brasileira.
Foi feita, então, uma parceria com os participantes do ELSA, um estudo do Ministério da Saúde que monitora a saúde de 15.105 brasileiros. De dois em dois anos, eles passam por exames clínicos e entrevistas, com objetivo de descobrir a incidência e os fatores de risco de doenças crônicas, como diabetes, e de doenças cardíacas na população. Dos cerca de 5 mil participantes atendidos no Hospital Universitário da USP, 1.872 aceitaram ter o sangue coletado e as células, congeladas. Dezoito amostras dessas células de sangue foram reprogramadas – foram transformadas em células-tronco pluripotentes – têm potencial para se transformar em qualquer tecido do corpo –, equivalentes a células-tronco embrionárias.
A análise genômica revelou que essas células têm uma contribuição europeia que varia de 14,2% a 95%; africana de 1,6% a 55%; e indígena de 7% a 56%. Essas amostras se mostraram mais características da população brasileira.
Pesquisa de doenças
Como cada linhagem de células está associada a um extenso banco de dados clínicos do ELSA, a biblioteca desenvolvida pela USP também é uma ferramenta para o estudo de doenças comuns. Por exemplo, entre as amostras já coletadas, cerca de 400 são de pessoas com hipertensão e 10% dessas pessoas não conseguem ser tratadas com os medicamentos atuais. Pesquisadores que queiram estudar os mecanismos da hipertensão ou da resistência aos medicamentos podem solicitar ao laboratório que forneça células-tronco desses indivíduos, especificamente.
Foto: Natasha Montier