Preconceito pode afastar pessoas com problemas emocionais da ajuda profissional

Preconceito pode afastar pessoas com problemas emocionais da ajuda profissional

Medo de discriminação ou incompreensão, condição chamada de psicofobia, pode levar pessoas com transtornos psicológicos e doenças mentais a não buscarem tratamento

O Brasil é considerado o país mais ansioso do mundo e o mais depressivo da América Latina. No planeta, o cenário da saúde mental também não é muito diferente, pois, em média, 700 milhões de pessoas sofrem com algum tipo de transtorno psicológico, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Assim, as questões emocionais têm ganhado espaço na sociedade, mas o estigma e o preconceito ainda persistem. 

Esse tipo de preconceito recebeu o nome de psicofobia. Segundo a professora Carmem Beatriz Neufeld, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP, trata-se da discriminação expressa por comentários como “depressão é falta de Deus”, “síndrome do pânico é frescura” e “você está exagerando”. A professora afirma que “muitas vezes as pessoas têm vergonha de dizer que vão a tratamento porque sabem ou acham que as outras pessoas não compreenderão o que estão passando”. 

Foi assim com o estudante de jornalismo Enrico Ziotti, que, aos 17 anos, teve a primeira crise de pânico dentro da sala de aula do cursinho pré-vestibular. Ziotti conta que, até então, não sabia o que estava acontecendo e pensou apenas estar cansado. As crises o fizeram dar um tempo nos estudos, mas, ao contrário do que acreditava, além de não passarem, fizeram com que abandonasse as aulas e se trancasse em casa.   

Os pais de Ziotti perceberam que o filho estava diferente, mas a primeira reação ao saberem os motivos por trás da mudança não ajudou o estudante a entender o que estava acontecendo. “Eu contei para eles o que estava sentindo e o meu pai falou que isso pode acontecer por conta de mudanças da vida. Falei que precisava voltar ao meu psicólogo e consultar um psiquiatra, mas ele respondeu que era só eu ficar calmo e toda noite, antes de dormir, rezar para Deus melhorar as coisas.” 

A falta de compreensão dos pais afastou o estudante da ajuda profissional. Sem o apoio, ele diz que se sentiu ainda mais perdido, pois as crises de pânico eram sensações “únicas e perturbadoras”. Toda aquela situação foi novidade para Ziotti, que, sem ajuda necessária, viu as crises se tornarem mais frequentes e piores. “Eu me senti de mãos vazias”, conta. 

Mas o diálogo fez a diferença nessa história e, para o estudante, foi crucial para conseguir superar seus conflitos. Ele diz que, depois de um tempo, o pai entendeu que ele precisava de ajuda e o levou a psicólogos e psiquiatras. Por isso, Ziotti diz acreditar no poder da conversa, já que através dela é possível ficar sabendo a quem recorrer. “Porque não é meu pai e minha mãe que vão saber o que fazer, mas eles precisam saber me orientar e me levar a alguma pessoa que possa me ajudar. O diálogo ajudou a abrir portas que eu nem sabia que existiam”, afirma. 

A professora Carmem concorda que “falar sobre transtornos e doenças mentais é o primeiro passo para compreender nossas dores e as dos outros”. O desafio de psicólogos e psiquiatras, diz, é “trazer informação para a população, para que saibam cada vez mais que dificuldades e mesmo transtornos mentais fazem parte da nossa vida e da nossa sociedade. São manifestações típicas do ser humano, que não falam sobre fraqueza ou força ou sobre o quanto essa pessoa é digna ou não da nossa confiança e do nosso suporte”.  

Para o combate ao preconceito, a Associação Brasileira de Psiquiatria promove, todo ano, no dia 12 de abril, o Dia Nacional do Enfrentamento à Psicofobia. Carmem conta que a iniciativa é uma “tentativa de ajudar as pessoas a terem uma visão mais normalizadora das sintomatologias psicológicas”, além de diminuir a discriminação. 

*Texto do Jornal da USP Ribeirão Preto por 


Foto: Ma?gorzata Tomczak por Pixabay

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