USP Ribeirão orienta assistência ao luto por perda do bebê na gestação ou primeiros dias de vida
Voltado para mães, familiares e profissionais de saúde, o protocolo está sendo desenvolvido por pesquisadora da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, com base em similares canadense e britânico
Para orientar os serviços de saúde na assistência a mães que perderam seus bebês na gestação ou nos primeiros dias de vida, a psicóloga e pesquisadora Heloisa de Oliveira Salgado, pós-doutoranda do Centro de Medicina do Estilo de Vida e Promoção de Saúde (Cemev) do Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, trabalha no desenvolvimento de um protocolo com diretrizes para o atendimento durante o luto perinatal, com supervisão do professor João Paulo Souza.
Esse não é o primeiro trabalho da pesquisadora sobre o tema. Em 2018 ela publicou o livro Como lidar: luto perinatal, junto com a professora Carla Andreucci Polido, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). Na obra, as autoras adaptaram as diretrizes canadenses para a realidade brasileira.
Agora, no pós-doutorado, Heloisa amplia as informações do livro, utilizando também as diretrizes britânicas para validação de um protocolo específico para o Brasil. “Na proposta partimos do pressuposto de que essas famílias têm pouca ou quase nenhuma memória do bebe ou da gestação que foi perdida. Todo o trabalho é no sentido de a família construir e coletar memórias, pois essas memórias criadas e vividas são importantes e serão acessadas no processo do luto.”
A pesquisadora lembra que todo o processo de luto envolve uma boa assistência, a começar pelo comunicado do óbito, sem esquecer da possibilidade de se criar uma possível caixa de memórias com itens e lembranças do bebê. Além da necessidade de memórias físicas e sensoriais, Heloisa salienta que são importantes as memórias emocionais: “A mãe e familiares precisam se sentir acolhidos em todos os momentos desse processo, até mesmo nas questões do funeral”.
Mas, nesse processo, diz, é importante que a família participe das tomadas de decisões em conjunto com a equipe de assistência e que seja acompanhada também depois da alta, como, por exemplo, no processo de investigação das causas do ocorrido e até na decisão de uma nova gestação. “Medos e inseguranças farão parte de uma nova gestação, as questões que levaram à perda da gestação anterior vão surgir durante a nova gestação, no parto e até mesmo no pós-parto, e isso deve ser lavado em conta pelas instituições e pelos profissionais.
Na proposta de Heloísa, além da assistência e acompanhamento, aparece a figura do profissional do luto, um profissional de dentro da instituição, com conhecimento sobre a teoria do luto para fazer a interface com a família em momentos específicos, como, por exemplo, no momento em que as famílias não vão querer ver o bebê, o que segundo Heloísa é importante. “A grande maioria vai se arrepender de não ter visto. E esse profissional tem também formação e experiência para trabalhar junto à equipe de profissionais, que também precisam de suporte e apoio, pois estão na linha de frente do atendimento.” A psicóloga explica que o nascimento de um bebê em óbito é um momento diferente daquilo que se desejava, pois pais e mães desejam filhos vivos e saudáveis, por isso é tão necessário dar um fechamento para essa situação e “é na maternidade que isso acontece”.
Heloisa lembra, ainda, que durante a pandemia os profissionais da saúde têm alertado sobre a possibilidade de uma epidemia de luto complicado naqueles que perderam familiares para a covid-19 e não conseguiram se despedir, “o que não é diferente do que passam as mulheres que perdem uma gestação ou um bebê”.
O estudo O Projeto Brasileiro de Luto Perinatal. Desenvolvimento e avaliação de diretrizes de apoio para famílias que vivenciam natimortalidade e morte neonatal no sudeste do Brasil: um estudo quase experimental do tipo antes e depois já foi aceito para publicação e a versão em inglês acaba de ser publicada como preprint, ou seja, não passou por revisão dos pares na Plataforma Research Square. Em breve, a versão em português estará disponível junto à publicação original.
*Informações do Jornal da USP.
Foto: Rainer Maiores do Pixabay