Consumo excessivo pode provocar danos à saúde e ao desenvolvimento de crianças e adolescentes

Consumo excessivo pode provocar danos à saúde e ao desenvolvimento de crianças e adolescentes

Apesar de facilitar a aprendizagem, o excesso do uso das tela pode causar diversos problemas a crianças e adolescentes

O uso de tecnologias digitais tem crescido entre crianças e adolescentes, principalmente, dentro das escolas. Apesar desse acesso facilitar a aprendizagem em alguns aspectos, esses recursos trazem também consequências negativas a esses grupos, podendo ocasionar problemas de saúde e de ensino. Segundo a pesquisa TIC Educação, do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 46% dos professores de escolas públicas e privadas do Brasil que foram entrevistados disseram que precisaram auxiliar alunos em relação ao uso excessivo de jogos e outras tecnologias. Mais de um terço desses educadores relataram que estudantes já pediram ajuda, após terem fotos vazadas ou publicadas sem consentimento, sofrido assédio virtual ou bullying. 


Fábio Itasiki, professor de Técnicas de Redação e Consultor Educacional, ressalta que entre as tarefas da escola está apresenta possibilidades do viver e do conviver e que o Novo Ensino Médio, proposto pelo Ministério da Educação, pressupõe uma matéria denominada ‘Projeto de Vida’, que pretende apresentar algumas situações, desafios, reflexões aos jovens. “Seria um bom momento, se bem estruturado pela coordenação pedagógica e corpo docente, para discutir o cyberbullying, por exemplo, como também a influência do celular no agravamento dos quadros de ansiedade. O celular em cima ou embaixo das carteiras, por exemplo, é um ícone eletrônico que amplia a ansiedade do aluno por uma notícia, um novo vídeo, uma ligação da família, um comentário dos amigos. E essa espera desfoca o estudante, e aumenta os quadros de ansiedade, de expectativas vazias, muitas vezes desnecessárias”, comenta o educador.   


De acordo com Itasiki, a necessidade das aulas remotas durante a pandemia gerou uma “ciberdependência”. Não houve tempo hábil para as escolas organizarem seus processos de uso do digital e quando as aulas presenciais retornaram, os celulares, tablets e notebooks continuaram em nossas mãos, como canal de comunicação, mas não como ferramenta ativa no processo pedagógico. “É papel da escola organizar os momentos de utilização do celular na sala de aula, por meio de contratos pedagógicos com os alunos, em parceria com as famílias, com a finalidade de tornar o uso desses dispositivos parte integrante do processo de aprendizagem. Além disso, na concepção desse processo, os professores – agentes condutores das práticas educacionais –, deveriam se atualizar sobre as metodologias de ensino com uso de aplicativos e facilitar a navegação dos alunos por portais e sites na busca por informação e conhecimento”, afirma. 


Segundo o professor, o que não pode ocorrer é a limitação dicotômica do pode ou não pode, do deixar ou não deixar crianças e adolescentes fazerem o uso desses aparelhos no ambiente escolar. “O importante é responder à pergunta ‘quando pode?’, até mesmo porque a própria BNCC (Base Nacional Comum Curricular) apresenta eixos temáticos referentes à Cultura digital, Tecnologia digital e Pensamento computacional. Algumas cidades, como o Rio de Janeiro, por exemplo, estão proibindo o uso do celular em sala de aula, mas os alunos da rede pública utilizam uma plataforma de ensino, que pode ser acessada com a permissão dos professores. Então, nesse caso, não é o ‘não pode’, mas o quando”, explica.


Segundo Itasiki, cabe ao educador apresentar aos alunos que a hiperconectividade causa malefícios para a saúde física e mental do ser humano, que o uso excessivo do celular é um dos catalizadores da ansiedade que acomete os jovens e que a vida real precisa do mundo virtual, mas ela nunca deverá ser substituída sob a pena do esvaziamento da essência humana”, finaliza.   


Na rede municipal em Ribeirão Preto, segundo a Secretaria Municipal da Educação, “não existe uma proibição com relação ao uso dos celulares nas escolas da rede. Realizamos trabalhos de conscientização, por meio de cada unidade e direto dos professores com seus alunos”.


A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc-SP) apoia a integração das tecnologias e o uso de aplicativos em prol das práticas pedagógicas e dos processos de ensino e aprendizagem.  “Todas as Diretorias de Ensino da Secretaria da Educação do Estado de São Paulo desenvolvem ações nas unidades escolares para combater o bullying e o cyberbullying. O plano envolve orientações técnicas, projetos com estudantes, participação do Programa Psicólogos da Educação e professores dedicados exclusivamente a lidar com questões de convivência”, informa.

 

 Saúde dos olhos


O oftalmologista Alexandre Rao explica que o uso excessivo de telas de aparelhos digitais está relacionado a alterações da saúde como um todo na criança e no adolescente, já tendo sido associado ao sedentarismo, à obesidade e a alterações do desenvolvimento. Em relação à saúde ocular, de acordo com o especialista, o uso excessivo das telas pode levar ao surgimento precoce ou progressão da miopia já existente, ao olho seco e a fadiga ocular. Além disso, ele aponta que as telas produzem a luz azul nociva, que faz com que o organismo produza melatonina, o hormônio responsável pela qualidade do sono, porém, de forma negativa.


“As alterações oculares decorrentes do uso excessivo de telas podem ocorrer em todas as fases da infância e da adolescência, e estão relacionadas diretamente com o tempo de exposição ao aparelho eletrônico. Sabemos que o período mais importante para nosso desenvolvimento visual é a primeira infância e período pré-escolar, em que a criança está em processo contínuo de desenvolvimento visual. A exposição precoce e prolongada às telas pode alterar diretamente este período, além de causar potenciais danos aos olhos da criança. Além disso, diferentes estudos mostram que o uso excessivo dos smartphones é mais frequente entre adolescentes dos 10 aos 15 anos, período este que a miopia pode progredir rapidamente”, comenta Rao.


Segundo o oftalmologista, a Sociedade Brasileira de Pediatria e Sociedade Brasileira de Oftalmologia Pediátrica possuem diferentes recomendações sobre o uso das telas a depender da idade da pessoa. “Recomenda-se evitar a exposição de crianças menores de dois anos às telas, mesmo que passivamente. Deve-se também limitar o tempo de telas ao máximo de uma hora por dia, sempre com supervisão, para crianças com idades entre 2 e 5 anos e até duas horas por dia para crianças entre 6 e 10 anos. Para adolescentes entre 11 e 18 anos, recomenda-se limitar tempo de tela e videogames a duas ou três horas por dia. Para crianças e adolescentes com miopia, este tempo deve ser reduzido ou até mesmo suspenso”, orienta Rao. 


Além disso, a Academia Americana de Pediatria recomenda intervalos de descanso durante o uso prolongado de telas para evitar a fadiga ocular. “A cada 20 minutos é importante passar 20 segundos olhando um objeto a 6 metros de distância. Para todas as idades não é recomendado uso de telas durante as refeições. Uma a duas horas antes de dormir o indicado é se desconectar. E o tempo diário de tela para adultos deve ser de quatro horas ou menos, com pausas frequentes”, conclui o especialista.

 

Prejuízos à saude


A psicóloga especialista em Psicologia Hospitalar e Doutora em Saúde Mental Flávia Andressa Farnocchi Marucci Dalpicolo explica que o uso excessivo das telas, principalmente em crianças e adolescentes, pode causar prejuízos ao desenvolvimento. “O excesso do uso de aparelhos eletrônicos pode provocar problemas de visão, memória e transtornos psicológicos, principalmente sintomas de ansiedade e déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Os prejuízos relacionados a este uso excessivo podem já ser observados na infância e adolescência, como pior regulação emocional, problemas de atenção e aprendizagem, prejuízos na socialização, etc. Como tais aspectos compõem nossos repertórios comportamentais, estes prejuízos serão levados para a vida adulta”, conclui. 

 

Prejuízo no sono


O uso de telas próximo ao horário de dormir tem sido associado a pior qualidade de sono tanto em crianças como adultos. O excesso de luz que as telas emitem aos nossos olhos retarda a liberação de hormônios que estão relacionados a melhor qualidade de sono. Isso resulta em desorganização nos ciclos de sono e impacta nos processos de aprendizagem e foco da criança. Em adolescentes, este impacto pode ser ainda maior, em função da privação de sono para passar mais tempo no celular. 

Prejuízo na socialização


A interação social é de extrema importância para a criança se desenvolver, tanto em termos neurológicos, como no estabelecimento de repertórios comportamentais e o uso de tela tem restringido consideravelmente o convívio e a interação das crianças com os pais e cuidadores e com outras crianças. Utilizar o celular sempre que a criança está mais entediada ou como mecanismo para acalmá-la, reduz a comunicação entre pais e filhos e não ensina repertórios de regulação emocional e resolução de problemas. 

Prejuízo na regulação emocional 


O celular tornou-se uma ferramenta de fuga de sentimentos desconfortáveis, mas aprender a reconhecer e a lidar com tédio, frustração, tristeza, entre outras emoções, é fundamental para o desenvolvimento de uma criança. Tem implicações, inclusive, em níveis cerebrais. A estimulação frequente proporcionada pelas telas altera o sistema de recompensa do cérebro, tornando-o mais sensível a neurotransmissores relacionados a sensação de prazer e bem-estar.

 

Aliados do ensino

O professor Hubert Basques, diretor geral da Fundação Armando Alvares Penteado – FAAP em Ribeirão Preto, diz que na instituição os professores buscam manter os “gadgets” eletrônicos como ferramentas aliadas ao ensino e aprendizagem, tornando-os parte do processo. “Em nossa visão como educadores a proibição, inclusive das inteligências artificiais, não colabora com o processo nas salas de aulas. Para nós, eles são excelentes coadjuvantes para o desenvolvimento”, explica.  


Sobre o bullying virtual, o educador diz que tudo é resolvido com muita conversa, franca e direta e, também, com a “’vigilância’ nas diversas redes sociais buscando identificar possíveis práticas de cyberbullying e, quando identificado, os alunos e os pais são convidados para uma conversa sobre o tema. “Não podemos permitir que prospere”, finaliza.


Foto: Divulgação

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