Comparações

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Depois de uma temporada fora do país, voltei renovada. Foi muito bom visitar novamente o Serviço de Reprodução Assistida do Hospital Antoine Béclère, em Paris, onde fiz minha especialização. Depois de exatos 4 anos, fui recebida com muito calor, carinho e deferência.
Pude discutir casos com a equipe médica e com meu antigo “chefe”, Prof. Dr. Renato Fanchin. Trouxe os problemas de nosso centro e fui chamada a dar opinião sobre os casos franceses. Muito bom! Além disso, estamos organizando uma visita das embriologistas francesas ao nosso serviço na UNAERP. Será uma ótima oportunidade para nossos alunos, estagiários e embriologistas.
O serviço de Reprodução Humana do Hospital Antoine Béclère/Universidade de Paris está na vanguarda mundial dos tratamentos de fertilização não por acaso. O controle do ciclo é muito mais criterioso que o padrão, os protocolos clínicos e laboratoriais são muito bem estudados e não há preocupação com o custo dos tratamentos, uma vez que o Sistema de Saúde Público francês arca com todas as despesas, incluindo a medicação.  Quando uma paciente não responde bem, tem seu ciclo cancelado sem grandes prejuízos, voltando a ser estimulada no mês seguinte. Nós, por outro lado, tentamos “salvar” o ciclo, levando sempre em consideração os enormes gastos que o casal já teve. Isso faz com que, muitas vezes, a paciente chegue ao fim da estimulação com menores chances de sucesso quando comparada à paciente francesa. As realidades são mesmo distintas, fazer o quê?
Por mais que tentemos oferecer tratamentos de baixo custo, no Brasil há uma exclusão econômica importante e acabamos por ter apenas casais com razoáveis condições econômicas nas clínicas de Reprodução Assistida. Lembremo-nos que o salário médio do brasileiro é de cerca de 2 mil reais e os tratamentos de fertilização custam cerca de 6 a 10 vezes esse valor por tentativa. Na França, onde a desigualdade é muito, muito menor, o salário médio é de 3200 euros (cerca de 11 mil reais) e o tratamento é pago integralmente pelo governo. Bom, isso sem falar da escola pública de qualidade e tudo mais.
Pois bem, foi bom estar por lá para receber uma injeção de novidades. O retorno, no entanto, foi difícil: impossível não fazer comparações. A França não é perfeita e tem muitos problemas, talvez até mais graves que o Brasil principalmente no que se refere à imigração. Mas, chegar e ser inundada por notícias e mais notícias de corrupção, sabendo que temos tudo para crescer, produzir e distribuir melhor nossa renda, não é nada fácil. Quem sabe um dia, possamos, assim como na França, exigir nossos direitos, pensar como sociedade e construir um país no qual a saúde é o bem mais importante. Nesse dia – eu espero estar viva – terei o prazer de realizar tratamentos de Reprodução Assistida pagos integralmente pelo SUS. Sonho?

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