Conjunção de fatores

Conjunção de fatores

Nas últimas semanas, tive duas experiências felizes no cinema que me fizeram sair das salas de projeção um tanto reflexiva. Claro que meus pensamentos sobre as histórias pautariam esta coluna, né? Afinal de contas, fico sempre muito feliz em poder compartilhar experiências e divagações neste espaço. Acredito, fundamentalmente, que uma ideia ou outra pode abrir um debate e, a partir dele, novos outros conceitos podem surgir. Pensar (ainda) não custa nada.

Assisti a “Bohemian Rhapsody” e a “O Grande Circo Místico” nos últimos dias. O primeiro, que biografa a trajetória de Freddie Mercury e da banda Queen, havia sido muito bem recomendado por amigos e por algumas críticas que li em revistas. Já o segundo, um filme nacional baseado em um poema de Jorge de Lima, chamou minha atenção assim que vi o trailer, porque sempre fui apaixonada pelo disco produzido por Chico Buarque e Edu Lobo a partir da poesia.

Embora sejam completamente diferentes, os dois filmes apresentam uma relação muito intrínseca entre a música e a produção cinematográfica. Ao assistir à trajetória do Queen, revivi lembranças e, em muitos momentos, senti como se estivesse em algum show da banda. Já na produção brasileira, as canções não são tão empolgantes quanto as do grupo inglês, mas tiveram um enorme poder de me fazer voltar no tempo e relembrar, basicamente, as emoções que o disco me despertou, há 35 anos.


"Marie e Helene se repartem todas,
se distribuem pelos homens cínicos,
mas ninguém vê as almas que elas conservam puras.
E quando atiram os membros para a visão dos homens,
atiram a alma para a visão de Deus."

O Grande Circo Místico, Jorge de Lima


É impressionante como a arte tem esse poder de nos transportar a momentos específicos, além de jogar todo o foco de luz em memórias afetivas que podem nos fazer bem. É fato, claro, que também podem nos fazer reviver lembranças não tão boas, ou até certa saudade e nostalgia de algo que era bom, mas terminou. Retomamos momentos e tempos passados a partir de uma produção artística. Como é bonita essa nossa capacidade humana de refletir e viajar nos pensamentos.

O mais incrível é como podemos nos afetar por algo criado por pessoas que nem temos ideia de quem são pessoalmente. É genial o quanto Freddie Mercury conquistou fãs e admiradores ao redor do mundo e, hoje, o filme, mais de 20 anos depois de sua morte, é capaz de emocionar. Adolescentes que não chegaram a ver o cantor vivo podem gostar tanto quanto os contemporâneos do artista. Gente que nem falava sua língua também se sente abraçada pelas canções. No filme, inclusive, ele mostra à namorada a filmagem de um show com toda a plateia, reproduzindo uma apresentação no Brasil, cantando sua música, em inglês. 

A arte é capaz de convergir nossos próprios pensamentos e sensações, mas também de confluir muita gente a partir de uma mesma criação. Os seres humanos produzem o conteúdo e se encontram em torno dele. Como é bom poder deixar a mente navegar nesse oceano de divagação. Já que a realidade anda tão difícil, que mal há em nos deixarmos levar por uma bela música, ou, melhor ainda, por uma produção artística conjunta?  

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