Coragem, desencanto e beleza

Coragem, desencanto e beleza

Coragem é a capacidade que temos para agir apesar do medo, do temor e da intimidação. Enfrentar obstáculos, mesmo que aparentem ser intransponíveis e pesados. Seguir em frente a despeito de qualquer dificuldade, por mais desanimadoras que sejam. Um cenário que vivenciamos com certa frequência na vida, mas que, nesses tempos mais bicudos, parece ser ainda mais intenso.

Nessa semana, me vi pensando em duas poesias que dizem muito sobre o momento em que vivemos. Gostaria de compartilhar, porque acredito que as duas dizem muito sobre um jeito de encarar a vida.

Segundo Guimarães Rosa, 

“ O correr da vida embrulha tudo.
A vida é assim: esquenta e esfria,
aperta e daí afrouxa,
sossega e depois desinquieta.
O que ela quer da gente é coragem”

Já o poeta Carlos Drummond de Andrade, no poema “Os ombros suportam o mundo”, em 1935, escreveu o que parece o contrário de se ter coragem. Dá a entender certa carência de esperança.

“Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus. 
Tempo de absoluta depuração. 
Tempo em que não se diz mais: meu amor. 
Porque o amor resultou inútil. 
E os olhos não choram. 
E as mãos tecem apenas o rude trabalho. 
E o coração está seco. 

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás. 
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes. 
És todo certeza, já não sabes sofrer. 
E nada esperas de teus amigos. 

Pouco importa venha a velhice, que é a velhice? 
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança. 
As guerras, as fomes, as discussões
dentro dos edifícios provam
apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertam ainda. 

Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer. 
Chegou um tempo em que não adianta morrer. 
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem. 
A vida apenas, sem mistificação”.

Esses dois poetas conseguem falar ao nosso coração e nos fazem pensar sobre trajetórias a percorrer. Ter coragem para tudo e agir diante daquilo que nos intimida pode ser o início de uma vida melhor, desbravando novos rumos e procurando saídas.

Mesmo na desesperança, acredito cada vez mais que é preciso ter essa coragem — e fé. Sabemos que o mundo está tristemente pesado, mas é cada vez mais necessário achar caminhos para encarar as muitas tristezas que surgem e procurar beleza no que há de, aparentemente, banal. 

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