Problemas vividos

Problemas vividos


"Bem no fundo
no fundo, no fundo,
bem lá no fundo, a gente gostaria
de ver nossos problemas
resolvidos por decreto
a partir desta data,
aquela mágoa sem remédio
é considerada nula
e sobre ela — silêncio perpétuo
extinto por lei todo o remorso,
maldito seja quem olhar pra trás,
lá pra trás não há nada,
e nada mais
mas problemas não se resolvem,
problemas têm família grande,
e aos domingos saem todos a passear
o problema, sua senhora
e outros pequenos probleminhas” 

Paulo Leminski, do livro “Distraídos venceremos” (1987)


Quem nunca se viu chafurdado em problemas, achando que nenhum deles tem solução? Às vezes, ficamos aturdidos diante de obstáculos que parecem não ser transponíveis e, a cada momento difícil, é comum pensar que nunca vivenciamos algo tão doloroso ou sofrível. Dizem que as crises são contemporâneas e, portanto, tendemos a sentir que cada maré ruim é sempre a pior de todas. 

Por esses dias, em meio a problemas cotidianos, encontrei uma poesia de Paulo Leminski, que está publicada nesta página. O texto resume bem aquilo que desejaríamos no mundo contemporâneo: que os problemas fossem resolvidos facilmente, “por decreto”, sem que nos envolvessem por muito tempo.

Todos sabemos que isso não é possível. Podemos passar dias, semanas e até meses envolvidos em alguma questão mais complicada, que nos tire o sono. O que precisamos compreender é que não há mal nisso. Experimentar altos e baixos ao longo de nossa trajetória é o que nos faz humanos. Sofrer é normal, assim como ter alegrias, embora não seja tão agradável.

Há quem comece a fazer sessões de terapia, por exemplo, para tentar não se afetar tanto com os acontecimentos da vida, buscando se incomodar menos com o que acontece à volta. Aprender a dar tamanho às experiências da vida é saudável, mas evitar ser impactado pelas vivências não. Precisamos sentir, inclusive, os problemas, e vê-los como parte da nossa existência. 

Nesse mundo moderno, tendemos a buscar ainda mais a instantaneidade dos acontecimentos, querendo que tudo aconteça e “desaconteça” em poucos minutos. Resta a nós, em tempos de efemeridade, criar certa empatia pela própria vida, vivendo os momentos bons e ruins com intensidade, sem esmorecer diante daquilo que parece difícil, e que se coloca à frente. 

Pessoalmente, desde pequena, aprendi a lutar muito pelo que quero e a defender minhas ideias. Até hoje costumo fazer isso com tudo aquilo que acredito — a Revide, por exemplo, é um daqueles projetos que defendo com unhas e dentes, principalmente por confiar nos princípios que regem esse trabalho. 

Tenho convicção de que não podemos desistir diante de qualquer dificuldade e que altos e baixos fazem parte da vida, mesmo que às vezes bata desânimo ou desesperança. Podemos continuar a desejar mais simplicidade nas resoluções, como Leminski, mas jamais podemos deixar de vivenciar aquilo que nos é posto. 

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