Manoel passarinho

Manoel passarinho

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As perdas são inevitáveis, os ganhos são preciosos  e raros presentes.

Manoel de Barros, o poeta da linguagem de passarinho, das desimportâncias, do entendimento dos mínimos e das insignificâncias, nos deixou no dia 13 de novembro. Foi morar no céu onde se fala sua lingua sem quê nem por quê.

Perdemos o homem, físico, matéria que vira pó, seu legado é tesouro perpétuo, imorredouro.

Manoel traduziu lindamente o mundo. Fomos abençoados por sua existência.

Deixo aqui um poema , dos muitíssimos, do Manoel, agora anjo, menino passarinho.

                   com o coração amolecido de ternuras, mando silêncio de noite profunda, Eliane Ratier

O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim um atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato
de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.

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