Hereditariedade, ambiente e inteligência: O quê os dados revelam?

Hereditariedade, ambiente e inteligência: O quê os dados revelam?

1) A influência genética sobre o QI aumenta da infância (20%) à adolescência (40%), e até a vida adulta (60%). De fato, estudos recentes com gêmeos de 80 anos de idade e até mais velhos têm registrado graus de herdabilidade de por volta de 60%.

         2) Os efeitos genéticos sobre o QI largamente contribuem para a continuidade de idade para idade. Entretanto, algumas evidências para mudanças genéticas têm sido encontradas durante a infância e durante os anos iniciais de escolaridade, o que significa que a herdabilidade não pode ser igualada com estabilidade, ou mesmo com o aparecimento precoce. As influências ambientais não compartilhadas contribuem tanto para a continuidade quanto para mudanças no meio da infância, mas durante a transição para a adolescência, os fatores genéticos não mais contribuem para mudanças, e sim para a continuidade.

       3) Altas habilidades cognitivas parecem estar, na distribuição normal, exatamente na extremidade superior dos idênticos fatores genéticos e ambientais responsáveis pelas diferenças individuais.

       4) Os genes específicos responsáveis pelas influências genéticas sobre o QI estão começando a serem identificados Por exemplo, estudiosos acreditam que o objetivo atual da genética do comportamento é identificar os genes específicos que contribuem para as diferenças individuais e determinar o que eles fazem no cérebro, haja vista que o cérebro (metade dos genes é expressa primariamente no cérebro) é o intermediário obrigatório entre o genótipo e o comportamento.

       5) A correlação substancial entre testes de QI e de realização escolar é em grande parte geneticamente mediada. As análises baseadas em genética multivariada têm revelado que a correlação entre ambos os testes é substancial e indicam que os efeitos genéticos sobre o desempenho escolar se sobrepõem quase completamente àqueles efeitos genéticos da inteligência. Também, dados obtidos com diferentes amostras de gêmeos, têm revelado que a inteligência geral e as habilidades cognitivas compartilham uma mesma base genética. De fato, estes estudos, envolvendo gêmeos, pai-filho e irmãos comuns, revelam coeficientes de herdabilidade para o desempenho escolar de aproximadamente 0,70, valor que não é muito diferente do grau de herdabilidade do QI para estas mesmas amostras. Em geral, os coeficientes de herdabilidade para um grande número de sujeitos escolares variam entre 0,40 a 0,80.  Em resumo, estes achados favorecem uma base biológica comum para uma idêntica rota que vai desde as tarefas cognitivas básicas à inteligência geral, e à realização acadêmica.

        Em particular, estudos demonstraram que 75% da correlação entre inteligência e desempenho educacional, numa amostra de gêmeos adultos mais velhos, devem-se ao compartilhamento genético entre estes dois construtos. Este resultado implica que se for encontrado um gene associado com inteligência, nós poderemos predizer que este mesmo gene também estará associado com os determinantes do desempenho escolar ou educacional. O inverso dessa sobreposição genética é igualmente interessante. Embora a genética explique a sobreposição entre inteligência e realização escolar, a correlação fenotípica entre essas medidas é ao redor de 0,50. Assim, discrepâncias entre inteligência e desempenho escolar, frequentemente, usadas para descrever fracos desempenhos, são substancialmente ambientais em origem.

           6) O ambiente familiar compartilhado contribui de forma importante para o QI até a adolescência, mas torna-se negligenciável ao longo da vida. Os fatores ambientais não compartilhados, os quais fazem com que as crianças crescendo na mesma família sejam diferentes uma da outra, constituem uma fonte de longo prazo dos efeitos ambientais. Talvez, um dos aspectos mais importantes dentre aqueles levantados pela pesquisa genética, refere-se ao fato de que a maneira com que o ambiente funciona durante o desenvolvimento intelectual é muito diferente da maneira que ele tem sido concebido funcionar. Em vez de tornar duas crianças crescendo num mesmo ambiente familiar, similares uma á outra, o que é usualmente presumido pelas teorias de socialização, a pesquisa genética tem revelado que as influências ambientais que afetam o desenvolvimento intelectual operam na direção de tornar as crianças na mesma família diferentes uma da outra. Os irmãos são similares naturalmente, mas muito mais por razões genéticas do que pelas ambientais.

            O ambiente é importante, mas as influências ambientais operam para fazer as crianças na mesma família diferentes, não similares. Essas influências ambientais não compartilhadas pelas crianças crescendo na mesma família constituem o ambiente não compartilhado. Entretanto, deste achado não implica que o ambiente familiar seja sem importância ou deva ser negligenciado. O que ele indica é que as influências ambientais no desenvolvimento intelectual têm seus efeitos mais na base indivíduo por indivíduo, do que na base família por família. A questão chave a ser respondida é porque crianças crescendo na mesma família são tão diferentes? O ambiente não compartilhado é crucial para a pesquisa em genética ambiental. Apenas quando uma variável ambiental demonstrar que ela pode ser vivenciada de modo diferente por irmãos crescendo na mesma família, ela, então, poderá ser considerada como uma variável preditora ambiental e fundamental dos resultados evolutivos.

  7) Os fatores genéticos afetam nossas experiências e, portanto, pesquisas futuras devem investigar a interação evolutiva entre natureza e criação. Mais especificamente, nossas teorias e pesquisas sobre o desenvolvimento intelectual e educação necessitam incorporar o fato de que, as crianças diferem em suas habilidades para aprender, em parte, por razões genéticas. As teorias de desenvolvimento intelectual são substancialmente normativas (isto é, elas focalizam aquilo que é típico em uma dada idade), e elas raramente questionam porque as crianças diferem tanto nas taxas e nos níveis de desenvolvimento intelectual, deixando de considerar o papel da genética.

         8) Genético não significa inato. Inato implica padrões de ação fixos, únicos, de espécies que são inacessíveis à experiência. Influência genética não implica que inteligência é predeterminada. A influência genética sobre o QI não denota um efeito fixo e determinístico de um simples gene, mas, ao contrário, indica predisposições probabilísticas de muitos genes em um sistema de múltiplos-genes. O fato de que inteligência é herdada não significa que a parte genética da inteligência não seja maleável. Muito frequentemente, inteligência é confundida com uma predisposição genética para aprender. Inteligência é um fenótipo com metade da variância dos escores do QI tendo origem não genética. Além disso, como um grau de herdabilidade de 50% é uma estimativa média na população, a importância dos fatores ambientais pode ser muito maior para a inteligência de um indivíduo particular.

          Nós herdamos disposições, não destinos. Os resultados de nossa jornada são consequências diretas de nossas escolhas durante a vida. As escolhas são guiadas pelas nossas predisposições e estas tendências encontram expressões dentro das oportunidades ambientais que nós ativamente criamos. A vida não é uma simples consequência de nosso patrimônio genético, pois determinismo genético é impossível para comportamentos humanos complexos, tal como o QI ou a inteligência geral. Em resumo, genes, não controla-nos, corpo e mente; ao contrário, genes, cria-nos, corpo e mente.

           9) Influência genética refere-se ao “que é” mais do que ao “que poderia ser”. Como as pesquisas sobre treinamentos especializados revelam, as crianças podem ser treinadas para serem melhores em muitas habilidades (“o que poderia ser”), porém, tais resultados não significam que fatores ambientais sejam responsáveis pelas origens das diferenças individuais naquelas habilidades, ou que fatores genéticos não sejam importantes (“o que é”).

           10) Influência genética refere-se ao “o que é” mais do que ao “que poderia ser”. O que fazemos com o conhecimento científico é um assunto de valores. Portanto, não decorre que, encontrando influências genéticas sobre o QI, isto necessariamente significa que devemos negar ajuda e encorajamento necessários para alcançar altos níveis de competência.

          11) Segundo a prestigiosa revista Science, a descoberta de genes associados às doenças mentais, tais como esquizofrenia, depressão e distúrbio bipolar, é o segundo, dentre dez, dos mais importantes avanços científicos ocorridos na década de 2000.

          12) Considerando a variação normal de qualquer comportamento humano complexo, como por exemplo, a inteligência, as seguintes três leis da genética do comportamento podem ser estabelecidas: Primeira lei: Todos os traços humanos são herdáveis. Segunda lei: O efeito de ser criado na mesma família é menor que o efeito dos genes. Terceira lei: Uma grande parte da variação nos traços comportamentais humanos complexos não é explicada por efeitos dos genes ou famílias (ambiente compartilhado). O ambiente não compartilhado é uma fonte importante de variação

         13) Claramente, estudos adicionais quantitativos não são mais necessários para documentar a importância da influência genética (isto é, herdabilidade) sobre a inteligência e, por consequência, os pesquisadores devem, em vez disso, tentar identificar os genes específicos da inteligência. A propósito, Plomin finalizou o seu livroGenetics and Experience (1994) com sete hipóteses, das quais a sétima é: “Genes específicos que afetam a experiência serão identificados” (p.163). Ele descreve as tentativas atuais, baseadas na robustez do Projeto Genoma Humano, que buscam identificar alguns dos presumíveis muitos genes responsáveis pela herdabilidade da inteligência e, também, a genômica funcional que tenta mapear as vias entre genes e inteligência.

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