“Até a nossa família achava que a gente estava na Costa do Marfim”, diz vocalista do Cachorro Grande

“Até a nossa família achava que a gente estava na Costa do Marfim”, diz vocalista do Cachorro Grande

A banda Cachorro Grande lançou na semana passada o disco Costa do Marfim, o sétimo do grupo. As músicas do novo álbum, que podem ser baixadas pela internet, no Sendspace ou pelo ITunes. O disco tem uma pegada mais eletrônica, e para falar sobre ele, o blog Garoto dos Clássicos, junto com o jornalista Bruno Silva, entrevistou o vocalista do grupo, Beto Bruno, que contou como foi feito o novo trabalho. Confira:

Por que o estilo do disco deixa de ser um rock sessentista, como os anteriores, e tem uma pegada mais eletrônica?

Beto Bruno - É um amor antigo pelo rock eletrônico, e a gente nunca teve propriedade para fazer. Porque está na moda e a gente flerta com este estilo desde o nosso terceiro disco. Sempre tem uma coisinha eletrônica, mas não tinha esta técnica de gravação. Não tinha essa propriedade de incorporar este estilo. Mas é uma tentativa de muito tempo. Quanto à mudança de estilo, isso é Cachorro Grande também. Vem tentando sempre mudar de estilo de um disco para o outro para não ficar repetitivo, e tentar ser um pouco mais contemporâneo e não deixar de fazer o que gosta.

2 - Quem Influenciou o disco Costa do Marfim?

Beto Bruno – O David Bowie quando gravou Hunky Dory, nos anos 1970 é a principal, acho que sai tudo dali, não só nós, mas todos da geração do rock inglês que flerta com eletrônico, como The Black Keys, The Chemical Brothers. Eu acho também o álbumSandinista, do The Clash, para mim não tem nada mais moderno do que aquilo ali. Todos nós da banda temos um amor antigo pelo eletrônico. E outro que gosta muito é o Edu K, produtor do disco. Incorporar ele como produtor, incorporar ele dentro da banda foi a grande sacada. Um cara que tem a mesma visão do que nós, e que tem mais propriedade para fazer o eletrônico do que nós.

3 - Por que o nome do disco é Costa do Marfim?

Beto Bruno – Foi uma brincadeira dos caras da banda. Foi o primeiro nome de disco que eu não ponho. O Edu e o Rodolfo Krieger (baixista da banda) chegaram no estúdio e estava um calor do caralho, a gente estava gravando em janeiro, e falaram “parece que a gente está gravando na Costa do Marfim”, aí alguém falou “ah! Legal! Vamos botar o nome do disco de Costa do marfim”. Durante a gravação cada um fala mais de 300 nomes, um mais ridículo do que o outro, ai foi que foi, falando em Costa do Marfim, de repente alguém falou em um bate-papo na internet “Porra, os caras estão gravando na Costa do Marfim”, e até hoje tem gente que acha que gravamos lá. Eu estou achando um sarro. Agora que estou falando com você sobre o disco, eu estou achando que é pra manter um pouco desta mística, pra ficar um pouco no ar “será que eles gravaram lá?”, saca? Até a minha mãe me ligou perguntando se a gente ia gravar na Costa do Marfim. Até a nossa família achava que a gente estava na Costa do Marfim. Então na hora de botar o nome não tinha outro. Foi inevitável.

4 - Onde foi a gravação, então?

Beto Bruno - A gravação foi no Estúdio Madeira, na Rua Augusta, do lado de casa, do Dudu Machado, baterista da Pitty. Onde a gente costuma ensaiar. Gravamos em casa, praticamente. Isso fez muita diferença. Trinta dias trabalhando. Vinte dias na gravação, dez de mixagem.

5 – Os gaúchos sempre são muito amorosos nas coisas do sul do país. Inclusive, os que vivem em São Paulo, comentam que muitos artistas que fazem sucesso lá, não são tão valorizados no resto do Brasil. Você tem esse sentimento também?

Beto Bruno – Não, porque particularmente com nós aconteceu o contrário, a gente mora em São Paulo há 12 anos, e foi depois que mudamos para cá que começaram a dar mais visibilidade para nós no Rio Grande do Sul, por que lá não deram valor para nós, foi justamente o contrário. A gente teve que vir para São Paulo para estourar lá, entendeu. Lá a gente era visto como qualquer bandinha que tocava por cerveja. A gente veio para cá e deram todo amor possível. São Paulo nos acolheu e nos fez ficar grandes no Rio Grande do Sul.

6 – Sempre tive a sensação de que o Sul do país sempre lança muitas bandas de rock. O Sul está para o rock como o Rio está para o funk e Pernambuco para o maracatu?

Beto Bruno – Não, não. São Paulo é a terra do rock and roll, desde os anos 50, senão eu não estaria aqui. A cena no Rio Grande do Sul está morta há mais de dez anos. Não sai uma banda interessante a mais de dez anos, essa é a grande verdade, e eu sinto muito em falar isso. Não existe cena cultural em Porto Alegre, não existe cena roqueira. As bandas ainda são as bandas dos anos 1990, que estão tocando por migalhas no interior, e não estão conseguindo sair de lá, essa é a grande verdade. É muito triste, mas não quer dizer que a gente seja melhor ou pior que nenhuma dessas bandas. O negócio foi que a gente foi mais eficiente. A gente veio para cá tocando para dez pessoas, voltamos para cá tocando para 20, um dia tinha mil e a gente ficou. As pessoas vêm pra cá, não sentem a mesma comodidade nos primeiros shows e volta. Foi o que aconteceu com todas.

7 – A insistência foi o diferencial de vocês?

Beto Bruno - É, a gente não é melhor que ninguém, foi justamente pela insistência, e por querer morar em São Paulo, ficar perto dessa cena cultural que é super-efervescente. Por exemplo, moro numa rua que fica do lado da Augusta, que segunda-feira se eu quiser ver uma banda nova tocando, eu vejo. Para quem quer trabalhar com rock, tem que morar em São Paulo mesmo.

8 – A banda sempre teve muito acesso para divulgar o trabalho na antiga MTV Brasil. E agora, depois da reformulação do canal, como ficou? Mudou muita coisa?

Beto Bruno – A gente continua na estrada, a gente depende menos da mídia do que nunca. Nesse tempo todo, a gente sempre ficou cultivando shows. Foi passando pelas cidades fazendo o melhor show possível, para gente poder voltar. E é isso que a gente faz, a gente faz o nosso caminho. Nosso clipe foi lançado dia 9 na MTV, a repercussão foi boa, eles sempre vão ser parceiros nossos, a gente sempre vai estar juntos. Aí que está, a gente tem que sempre ser relevantes para merecer esse espaço. Tem que continuar lançando coisa boa, tem que continuar lançando coisa diferente. Nossa técnica de estar até hoje junto é que cada vez que a gente passa aí na tua cidade a gente tenta fazer um show melhor que o outro. Não interessa se é um festival, se é um bar, numa casa noturna, a gente dá o máximo, como se fosse o último show da vida, para que no próximo ano nos chamarem de novo para gente continuar na estrada fazendo o que gosta, e ao mesmo tempo tentar lançar um disco melhor do que outro, e tentar fazer uma coisa diferente. E é isso aí que nos mantém na estrada. Tentar aumentar nosso público e não depender tanto de mídia.

9 – Esse já é o segundo disco do Cachorro Grande lançado simultaneamente pela internet. Como você vê a internet?

Beto Bruno – Eu particularmente sou um cara que nunca tive e-mail, não tenho nem um computador. Quando minha mulher sai de casa meio apressada, e só dela pedir para mim desligar o computador, eu não sei nem desligar. Mas o Rodolfo (Krieger) que cuida da parte de computação, eu falo com ele bastante. E como mudou de um tempo pra cá, a gente começou investir mais nesse lado, o lado de aproximar mais da galera da internet. Ali dá pra falar com todo mundo. Eu sou burro nessas coisas, mas tem ajudado muito.

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